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Aonde quer que você vá,

o que quer que você faça,

que a sorte dos irlandeses

esteja com você.

(Provérbio irlandês)

"Esse barulho está me irritando profundamente." Me virei na cama, puxando as cobertas para mais perto do meu corpo e afundei o rosto no travesseiro, enquanto escutava o despertador tocar insistentemente nos meus ouvidos. "Para, já chega." Queria dormir mais um pouco. Certo, precisava levantar para trabalhar, mas principalmente, precisava fazer aquele barulho parar. Estava fazendo meus miolos latejarem, como se gritassem e contorcessem, implorando para pôr um fim naquela tortura. Com um tremendo esforço, arrastei o corpo pela cama, levando as mãos pesadamente sobre o celular e apertando com força, repetidamente, o botão, até ter certeza absoluta que havia parado. Joguei o pobre aparelho, que não tinha culpa de nada, com brutalidade na mesinha ao lado e me aconcheguei em meio às cobertas e travesseiros novamente. Se ficasse ali pegaria no sono de novo e ia me atrasar, resolvi contar até três e levantar. Com um impulso, ao final da minha contagem mental, parei sentada na cama, observando ao redor. Meus olhos focalizaram a cadeira perto da janela, onde eu jogava minhas roupas no final do dia. Precisava comprar um cabideiro. Mas no geral, até que o quarto estava arrumado, não precisava ocupar meu tempo me preocupando com isso. Com sofrimento, que se fosse observada de fora parecia anunciar minha morte por enforcamento iminente, coloquei as pernas no chão e levantei, caminhando até o banheiro. Tropecei nas duas almofadas que normalmente ficavam na minha cama. Pelo menos a cama eu precisaria arrumar. Mas não agora. Entrei no banheiro, lavei o rosto e observei-o, amassado, no espelho, com a menta vazia, pensando apenas que eu precisava urgentemente de uma grande caneca de café, sem imaginar que aquele era o primeiro dia de uma grande mudança na minha vida. O começo de uma jornada em busca de algo que eu não sabia que estava procurando, até encontrar. E descobrir, com pesar, que minha vida sempre estivera incompleta, sem ele. Mas talvez não sejamos nós realmente que mandemos em nossa vida, quem sabe não seja o destino? Tudo acontece quando tem que acontecer, certo? Certo. "Café, café, preciso de café." Saí do banheiro, arrastando os pés em direção à cozinha. Tentei não tropeçar de novo. Veja bem, eu não estava filosofando em pensamento, naquele momento eu não pensava em nenhuma dessas coisas que acabei de comentar, afinal, eu não sabia que iam acontecer, lembram? Então.

Abri o armário da cozinha pegando a minha caneca do Pateta. Apertei o botão da cafeteira que já estava preparada desde a noite anterior, como eu fazia todos os dias. Após terminar meu desjejum, voltei ao banheiro para um banho despertador, escovei os dentes, pensando que precisava ir ao mercado comprar pasta de dentes. Me arrumei, com calma, porque sempre acordava com tempo sobrando para poder me arrumar sem pressa. "Todo dia ela faz tudo sempre igual..." Cantarolei Chico Buarque, enquanto pegava a bolsa, as chaves, meu iPod que estava sempre no modo aleatório e saí, fechando a porta de casa, me preparando para mais um dia no escritório.

Atravessei a rua, caminhando em direção ao ponto de ônibus, sentindo um pouco de frio naquela manhã de inverno e tentando não parecer uma maluca completa enquanto murmurava a música que estava ouvindo, dançando com a cabeça ao mesmo tempo. Apertei um pouco o meu cardigã ao redor do corpo, sabendo que logo o frio passaria, afinal, inverno e Rio de Janeiro nunca foram palavras que andassem muito juntas nas frases ditas por aí. Mas eu sempre me esquecia que agora morava perto da praia e o vento soprava sempre um pouco gelado àquela hora da manhã. Eu costumava morar com meus pais na Freguesia, mas por trabalhar na Barra da Tijuca, resolvi alugar um apartamento no Recreio assim, como quem vai para Ilha de Guaratiba pois custava menos que a área da minha empresa e o trânsito estava cada vez mais caótico com o crescimento desenfreado de Jacarepaguá, precisava ficar o mais perto possível para evitar o desgaste de ficar duas horas no ônibus todos os dias.

Sorte Irlandesa [LEIA OS 3 PRIMEIROS CAPÍTULOS AGORA]Where stories live. Discover now