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Acordei meio sobressaltada com o barulho de uma sirene na rua e praguejei um pouco pois estava tendo um sonho muito legal. Só não conseguia lembrar sobre o que era. Peguei o celular para ver se meus amigos tinham respondido meus torpedos e sorri. Ao mesmo tempo em que ficaram loucos de alegria, ficaram muito tristes. Mas afinal, eram apenas seis meses, não? Eu ainda nem tinha ido embora, como poderia saber se ficaria lá ou não? Era melhor deixar as coisas acontecerem naturalmente, como disse Lara. Alex disse que passaria mais tarde no apertinho para conversar e matar as saudades que ele já estava sentindo. Eu não trabalharia no dia seguinte e ele ia tentar pegar uma folga pela manhã, para que pudéssemos aproveitar mais.

Meu último dia no escritório antes da viagem foi quase como o último dia de aulas no final do ano. Um clima meio de despedida, meio de tristeza, um pouco de alegria, nostalgia, só faltou a turma toda assinando minha blusa com canetinhas coloridas. Aquele papo meio morno sobre o que eu iria encontrar, sobre a Itália, algumas dicas de quem já tinha ido e muitas piadas e risadas, principalmente sobre comida. Quando saí do escritório para ir para casa, estava me sentindo meio leve e borbulhando de expectativas. Ana disse que havia marcado com Lara, Letícia e Alex de irmos no Benkei do Barra Shopping no dia seguinte, que era a véspera da minha viagem, para nos despedirmos.

Peguei o ônibus de volta para casa e cheguei pouco antes de Alex aparecer com uma sacola de supermercado e duas caixas de pizza. Ele havia trazido uma garrafa de vinho tinto e mais alguns chocolates. Ele disse que eu deveria apreciar aquelas iguarias pela última vez, visto que eu estava indo para a terra das pizzas, vinhos e da Nutella e provavelmente voltaria com um paladar muito refinado para conseguir engolir os nossos representantes tupiniquins. Ficamos conversando e relembrando casos, simplesmente passando juntos o máximo de tempo que pudéssemos. Apreciando os silêncios cheios de cumplicidade. Alex prometeu que tentaria me visitar, mesmo que Carla, sua namorada não pudesse tirar férias naquele ano para viajar. Tentaria ir, nem que fosse para ficar um final de semana. Eu disse que não havia necessidade, as passagens eram caras e eu voltava logo. Mas nunca ficamos tanto tempo distantes. E embora eu não falasse, nem ele, ia ser muito difícil ficar longe assim.

***

Tudo havia acontecido muito rápido. Em uma correria sem fim para arrumar minhas malas, os documentos, todos os detalhes relevantes, me despedir dos meus pais, avós, tios, primos e dos meus amigos, já era hora de partir. Quando Marcos soubesse que eu estava viajando para ficar seis meses longe e não havia sequer mandado uma mensagem para avisá-lo, ficaria furioso. Mas estávamos dando um tempo e no que dependesse de mim, seria definitivo. Como Ana havia dito, eu precisava olhar para frente. Era um relacionamento sem futuro.

Finalmente eu poderia respirar fundo e relaxar de verdade, ocupando minha mente somente com o que eu iria encontrar na minha vida dali para frente. Meus quatro "grudinhos" apareceram no aeroporto de surpresa com faixas e cartões, desejando muita felicidade em minha nova etapa e exigindo que eu arrumasse uma casa com quartos para todos, mas que se fosse outro apertinho, tudo bem, eles já estavam acostumados a dormir amontoados na minha sala. Também me fizeram jurar que jogaria todo meu chame carioca e arrumaria um belo italiano, tipo o Thiago Lacerda, mas com um sotaque melhor.

Sorri lembrando das coisas malucas que meus amigos e eu, claro, falamos o tempo todo e da bagunça que eles fizeram no aeroporto. Sentiria muito a falta deles e isso me deixava triste. Já estávamos voando há algumas horas. E enquanto pensava neles e divagava sobre meu futuro, tentei ajeitar a poltrona, aquilo era muito apertado, nossa!! Classe econômica, claro. Minhas qualidades como funcionária exemplar não eram suficientes para garantir uma primeira classe, nem uma executiva, no mínimo. Suspirei. Pelo menos eu tinha essa televisãozinha legal e.... tinha. Até o passageiro da frente deitar a poltrona dele e a minha televisão abaixar junto. Quem foi que projetou esse avião? Como ele coloca a televisão nas costas da poltrona da frente? Será que não pensou que as pessoas deitam as poltronas e dessa maneira impossibilitam quem está atrás de ver a porcaria da TV? Bufei, tentando achar uma posição agora que tinha ainda menos espaço. Não queria ver TV mesmo, azar. Vou ficar aqui observando aquela tela lá na frente que mostra o trajeto percorrido pelo avião no mapa mundi, com a distância que falta e a temperatura lá fora. Impressionante, muito interessante mesmo. QUE SACO!!! Por que raios eu não posso simplesmente achar uma posição e dormir? Tirando o fato de que não tinha nada para fazer, não tinha espaço, não tinha sono e estava com fome, não conseguia ver nenhum motivo para não dormir! Tudo bem, já estamos quase chegando, faltam apenas sete horas. Passa rápido.

Sorte Irlandesa [LEIA OS 3 PRIMEIROS CAPÍTULOS AGORA]Onde histórias criam vida. Descubra agora