*ASLEEP*

490 68 51
                                    


As minhas mãos suavam como dois porcos no churrasco e as minhas pernas encontravam-se mais bambas que dois caules frágeis num meio de uma tempestade. Há minha volta existiam três rapazes e cinco raparigas, e, pelo que tinha percebido, esta seria a minha turma durante dois anos letivos. O meu entusiasmo era nulo, ao contrário de uma loira desconhecida sentada ao meu lado, que se vangloriava acerca dos cadernos novos que tinha comprado e da caneta ultra fina de cor azul que o pai lhe oferecera. Eu só me queria ir embora dali. A única coisa que o meu pai me oferecera no espaço de dois anos fora um postal vazio, e nem mesmo isso chegava a ser uma prenda.

Senti alguém puxar uma das minhas tranças e guinchei de dor. Não estava habituada a que se metessem comigo. Só tinha cinco anos e até então o único amigo que tivera fora um peluche chamado Sebastian, portanto havia algo de duvidoso na minha relação com os seres-humanos.

"PARA COM ISSO!", choraminguei, levantando-me do pufe. A nossa professora olhou para mim de uma forma estranha, e eu senti uma lágrima descer-me pela bochecha. Era quente e fazia cócegas, mas já não era a primeira vez que a sentia. Uma vez, quando a mãe me obrigou a calçar umas botas horríveis e desconfortáveis, eu também chorei. Agora parecia diferente, parecia mais doloroso.

"Cate, ninguém te fez mal.", a mulher de cabelos castanhos afirmou, utilizando um tom quase cantado. Ela parecia não gostar de mim, e eu senti as lágrimas aumentarem.

"Eu chamo-me Cloe.", limpei o rosto. Quando olhei para o lado, uma das raparigas sorriu para mim, e, por momentos, eu achei que poderia sobreviver àquela situação. O rapaz que me puxou o cabelo também sorriu, e eu cheguei a uma nova conclusão: eles não se importam comigo. "Eu quero ir para casa...", solucei, retirando os meus óculos da cara para poder então esfregar os olhos e limpar as lágrimas que agora se tornavam mais e maiores.

"SUSIE!?", a professora gritou. A porta colorida da nossa sala abriu-se e uma mulher de cabelos brancos entrou. Ela fazia lembrar a avó, e eu gostei logo dela. "Podes levar a Cloe para a sala especial?", ouvi a professora sussurrar. "Isto hoje está impossível."

"Claro.", a mais velha sorriu. "Anda, Cloe." Quando esticou a mão, ponderei se a devia agarrar. Não gostava que me tocassem; normalmente, quando os meninos o faziam, era para me magoar ou para gozarem comigo. Eles adoravam puxar-me os vestidos e roubar-me os óculos, e eu nunca percebi realmente o porquê disso. Além do mais, chamavam-me nomes terríveis e gozavam com o meu aparelho. Eu não tinha culpa de ter dentes tortos, mas, como eu já tinha percebido, eles não queriam saber.

Fui levada pelo corredor. Conseguia ouvir risos e choros. As lágrimas dos meus olhos, porém, já tinham parado de cair, e eu consegui respirar fundo e acalmar-me, sendo conduzida à Sala Especial. Nunca tinha realmente entendido o que tinha essa sala de especial até entrar nela, no entanto, quando o fiz, foi impossível sair de lá. Havia desenhos espalhados pelas paredes, como em todas as outras salas, e alguns brinquedos espalhados pelo chão. Três rapazes brincavam com uns carros, e duas raparigas imitavam a rotina das donas de casa. A senhora que me levou só largou a minha mão quando eu terminei de observar o que os meninos faziam, e quando olhei de novo para ela, vi-a sorrir.

"Aqui ninguém te vai chatear. Prometo."

"Mas eu não quero brincar com ninguém...", sussurrei, sabendo que se o fizesse tornaria a ser maltratada. Nesse segundo, a porta voltou a abrir-se. Um rapazinho rechonchudo, de olhos verdes, caminhou até nós e sentou-se sozinho na mesa presente no canto da divisão. Ele parecia chateado, mas não disse nada.

"Vá, vai brincar.", a senhora ordenou, fazendo um gesto com a mão. Engoli em seco e afastei-me lentamente, aproximando-me das duas raparigas. Elas olharam-me com estranheza e afirmaram não haver espaço ali para mim. Eu já sabia, nem sequer devia ter perguntado.

"Isto é teu?", o rapazinho triste aproximou-se de nós. Ele tocou no ombro da morena que fingia cortar uma cenoura e esticou a maçã de plástico.

"EW! QUE NOJO!", a rapariguita gritou, afastando-se do rapaz. Ela parecia aterrorizada, chegando até mesmo a verter algumas lágrimas. "ELE TOCOU-ME. ELE TOCOU-ME."

"ELE TOCOU-LHE!", por fim já repetiam todos em coro. Aquilo parecia ridículo, mas eu não disse nada. Não sabia se era suposto juntar-me a eles e gozar com o rapaz triste, ou se devia apenas fingir que não existia.

O rapaz triste baixou o rosto e virou costas aos meninos que brincavam, indo sentar-se novamente na sua mesa isolada. Ele pousou a cabeça sobre a palma da sua mão e suspirou profundamente, parecendo realmente afetado com o que acontecera. Vi um fiozinho cristalino descer-lhe pela bochecha e imediatamente senti pena dele. Eu sabia o que custava sentirmo-nos rejeitados, e o mínimo que eu podia fazer era juntar-me a ele a fazer-lhe companhia.

"Não chores.", sentei-me na cadeira à sua frente. Ele prendeu o seu olhar em mim, parecendo perplexo. "O meu nome é Cloe."

"Também vens fazer pouco de mim?", perguntou, mirando-me com uns grandes olhos verdes.

"Não.", abanei a cabeça, "Eu não sou má pessoa."

"Há algo de errado contigo?"

"Talvez haja, mas acho que só o descobrirei daqui a muito, muito tempo.", encolhi os ombros.

"Tu és estranha.", comentou, limpando o nariz com a manga da camisola. "Sou o Michael."

"Michael...", repeti, guardando o seu nome dentro da minha mente. "Obrigada por existires."



»»»»»»»»»

Eu sei que não era suposto publicar algo tão cedo mas não consegui resistir. O próximo capítulo poderá ser publicado daqui a pouco tempo, mas eu tinha avisado que os primeiros seriam rápidos, portanto não se esqueçam que isto só vai andar para a frente no verão. 

Há uma coisa que eu vos quero explicar acerca deste livro. SC II será um pouco diferente de SC I, porque haverão extras. Estes  extras vêem, ou na forma de sonhos (Cloe), ou na forma de diário (Michael). Portanto, quando virem *ASLEEP* já sabem que são os sonhos da Cloe, sonhos esses em que ela recorda o passado e a sua infância com o Michael; quando aparecer (BLACKOUT) serão os diários do Michael, e estes já a relatar os acontecimentos após o capítulo 50 de SC I. Alguma dúvida?

Despeço-me por aqui :)) 

Ella xo

Social Casualty II ಌ m.cHikayelerin yaşadığı yer. Şimdi keşfedin