Capítulo 5

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Pelo que posso perceber, o Instituto Colegiado e Vocacional Sir Winston Churchill é
como qualquer colégio em que já estive nos Estados Unidos. Passei todo o primeiro
período planejando meu cronograma escolar com a orientadora pedagógica, sra. Ben,
uma mulher jovem e gentil com jeito de passarinho, que está destinada a usar blusas
largas de gola alta e a ter muitos gatos.
Agora, no corredor, todos os olhos estão sobre mim. Sou novo e diferente, mas não
é só isso. Os olhos de todos estão sobre todo mundo, porque é o primeiro dia de aulas e
as pessoas estão loucas para saber como seus colegas voltaram do verão. Deve haver
pelo menos cinquenta repaginadas e mudanças totais de visual sendo testadas no prédio.
A nerd pálida descoloriu o cabelo e está usando uma coleira de cachorro. O garoto
magricela da equipe de atletismo passou os meses de julho e agosto inteiros fazendo
musculação e comprando camisetas justas.
Mesmo assim, os olhares das pessoas tendem a se demorar mais em mim, porque,
embora eu seja novo, não ajo como se fosse. Mal olho para os números das salas
enquanto passo por elas. Vou acabar encontrando as minhas matérias, não vou? Não há
motivo para pânico. Além disso, já tenho experiência nisso. Estive em doze colégios nos
últimos três anos. E estou à procura de algo específico.
Preciso me conectar nos canais sociais. Preciso conseguir que as pessoas falem
comigo, para que eu possa lhes fazer as perguntas para as quais quero respostas. Então,
quando sou transferido de escola, sempre vou atrás da abelha-rainha, a garota popular.
Toda escola tem uma. A menina que conhece tudo e todos. Eu também poderia
tentar colar no capitão do time esportivo, mas nunca fui bom nisso. Meu pai e eu nunca
fomos fãs de assistir ou praticar esportes. Posso lutar com mortos o dia inteiro, mas sou
capaz de cair desmaiado em um jogo de futebol. Com meninas, por outro lado, sempre me dei melhor. Não sei exatamente por quê. Talvez seja essa minha aura de outsider e
um jeito sério bem colocado. Talvez seja algo que eu acho que vejo às vezes no espelho,
algo que me lembra meu pai. Ou talvez eu só seja bonito mesmo. Então esquadrinho os
corredores, até que finalmente a vejo, sorridente e cercada de pessoas.
Não há como errar: a rainha da escola é sempre bonita, mas esta é especialmente
linda. Tem um metro de cabelos loiros em camadas e lábios da cor de pêssegos maduros.
Assim que ela me vê, sua boca se entreabre. Um sorriso surge, fácil, em seu rosto. Esta é
a menina que consegue tudo o que quer na Winston Churchill. Ela é a queridinha do
professor, a rainha do baile e o centro das festas. Tudo o que eu quero saber ela poderia
me contar. E é isso que espero que faça.
Quando passo, eu a ignoro de propósito. Em questão de segundos, ela sai de seu
grupo de amigos e surge a meu lado.
—Oi. Nunca vi você por aqui.
—Eu acabei de me mudar para a cidade.
Ela sorri outra vez. Tem dentes perfeitos e olhos quentes da cor de chocolate. É
daquelas que desmontam de cara qualquer resistência.
—Então você vai precisar de ajuda para se enturmar. Eu sou Carmel Jones.
—Theseus Cassio Lowood. Que tipo de pais chama a filha de Carmel?
Ela ri.
—Que tipo de pais chama o filho de Theseus Cassio?
—Hippies —respondo.
—Exatamente.
Nós rimos juntos, e meu riso não é completamente falso. Carmel Jones manda nesta
escola. Posso dizer por sua postura, como se nunca tivesse precisado se rebaixar na vida.
Posso dizer pelo modo como as pessoas passam, rápidas como passarinhos com receio
de um gato à espreita. Mesmo assim, ela não parece metida ou arrogante, como muitas
meninas desse tipo. Mostro a ela o meu horário escolar, e ela comenta que temos a
mesma aula de biologia no quarto período e, melhor ainda, o mesmo horário de almoço.
Depois de me deixar na porta de minha classe do segundo período, ela se vira para mim
no corredor e dá uma piscadinha.
Rainhas da escola são apenas parte do trabalho. Às vezes, é difícil não se esquecer disso.

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Na hora do almoço, Carmel faz sinal para mim, mas não vou até ela de imediato. Não
estou aqui para namorar ninguém e não quero lhe dar a ideia errada. Mas o fato é que ela
é muito gata, e eu tenho de lembrar a mim mesmo que toda essa popularidade e
autoconfiança provavelmente a tornaram uma chata. E ela é muito diurna para mim.
Verdade seja dita, todos são. O que se poderia esperar? Eu me mudo demais e passo
muitas horas da noite matando coisas. Quem vai poder conviver comisso?
Passo os olhos pelo restante do refeitório, registrando todos os diferentes grupos e
imaginando qual deles teria mais chance de me levar até Anna. Os góticos devem
conhecer a história melhor, mas também são os mais difíceis de despistar depois. Se eles
pusessem na cabeça que eu estava falando sério sobre matar seu fantasma, eu acabaria
com uma gangue de clones de Buffy, a Caça-Vampiros, armados de delineador preto e
crucifixos, em fila atrás de mim.
—Theseus!
Que merda, esqueci de dizer a Carmel para me chamar de Cas. A última coisa de que
preciso é que essa história de "Theseus" se espalhe e pegue. Vou até a mesa dela e
percebo olhos arregalados pelo caminho. Pelo menos umas dez outras garotas devem ter
ficado instantaneamente a fim de mim ao perceberem o interesse de Carmel. Ou pelo
menos é isso que o sociólogo em meu cérebro diz.
—Oi, Carmel.
—Oi. Oque está achando da SWC?
Faço uma anotação mental para nunca me referir à escola como "SWC".
— Foi tranquilo, depois das suas orientações de manhã. Ah, as pessoas costumam
me chamar deCas.
—Cas?
—Isso aí. Bom, o que vocês almoçam por aqui?
— A gente geralmente vai ao Pizza Hut ali. — Ela aponta vagamente com a cabeça, e
eu me viro e olho vagamente na direção indicada. —Então, Cas, por que você se mudou
para Thunder Bay?
— Pelas belas paisagens — respondo, sorrindo. — Mas, sério, você não acreditaria
se eu te contasse.
—Tente—diz ela.
Mais uma vez me ocorre que Carmel Jones sabe exatamente como conseguir o que
quer. Mas ela também me deu a oportunidade de ser completamente franco. Minha boca
chega a se mover para formular as palavras —Anna, estou aqui por causa de Anna —, quando o maldito Exército Troiano aparece atrás de nós em uma linha de montagem de
camisetas da equipe de luta da Winston Churchill.
— Carmel — um deles diz. Mesmo sem olhar, sei que ele é, ou era até muito
recentemente, o namorado dela. Pelo jeito demorado como pronuncia seu nome. E, a
julgar pelo modo como Carmel reage, com um levantar do queixo e um arquear da
sobrancelha, imagino que seja mais do tipo ex. —Você vai hoje à noite? —ele pergunta,
me ignorando por completo. Eu o observo com um interesse divertido. Parece que há
grandalhões possessivos em oferta hoje.
—Oque tem hoje à noite? —indago.
—A festa do Limite do Mundo anual. —Carmel olha para o teto com ar de enfado.
—Fazemos isso na noite do primeiro dia de aula desde sempre.
Desde sempre, ou pelo menos desde que Regras da atração foi lançado.
— Parece legal — digo. Não dá mais para ignorar o neandertal atrás de mim, então
estendo a mão eme apresento.
Só o mais cretino dos cretinos se recusaria a apertar minha mão. E acabei de
conhecer o mais cretino dos cretinos. Ele só move a cabeça em minha direção e diz "E
aí", sem se apresentar de volta. Mas Carmel se encarrega disso.
— Este é Mike Andover. — Aponta os outros num gesto. — E Chase Putnam,
Simon Parry e Will Rosenberg.
Todos eles acenam com a cabeça para mim como totais imbecis, exceto Will
Rosenberg, que aperta minha mão. Ele é o único que não parece um babaca completo.
Seu blusão com a letra da escola está aberto, e ele encurva os ombros para a frente como
se tivesse um pouco de vergonha dele. Ou, pelo menos, vergonha de sua companhia atual.
—Você vai ou não?
—Não sei —Carmel responde. Ela parece irritada. —Vou ver.
— Vamos estar nas cachoeiras lá pelas dez horas — diz ele. — Avise se precisar de carona.
Quando ele se afasta, Carmel suspira.
—Do que eles estão falando? Cachoeiras? —pergunto, fingindo interesse.
— A festa é perto da cachoeira Kakabeka. Cada ano é em um lugar diferente, para
despistar a polícia. No ano passado foi perto da cachoeira Trowbridge, mas todo mundo
surtou quando...—Ela para.
—Quando o quê?
—Nada. Só umas histórias de fantasmas.
Será que estou com tanta sorte assim? Costumo demorar uma semana até conseguir
uma transição conveniente para a conversa sobre assombrações. Não é exatamente o
tema mais fácil de abordar.
— Eu adoro histórias de fantasmas. Na verdade, estou louco por uma boa história
de fantasmas. — Eu me movo, sento diante dela e me inclino para a frente, apoiando os
braços sobre a mesa. —E preciso de alguém para me mostrar a vida noturna de Thunder Bay.
Ela me olha diretamente nos olhos.
—Podemos ir como meu carro. Onde você mora?

Anna Vestida de SangueМесто, где живут истории. Откройте их для себя