Never Let Them Take The Lights Behind Your Eyes

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Gritava, pulava, jogava tudo de mim naquelas palavras cantadas. Eu era o estranho, a aberração, sempre fui e esta é a hora de me aproveitar disso. Ao cantas aquelas letras sangrentas é como se eu estivesse derramando meu próprio sangue. Todos pulavam comigo e mesmo se não pulassem eu não pararia, era uma energia intenda que percorria todo o meu corpo. Toda aquela raiva fazia-me bem, era isso! Raiva era a minha paz. Eu não desacelerava em momento algum, eu crescia, crescia, crescia!

E tudo parou. A música acabou e as luzes do bar voltaram ao normal. Foi como uma vela que se acendeu e suas chamas brilhavam cada vez mais e, com um simples sopro, apagada. Aquilo tudo não era melhor que uma droga, na verdade aquilo era como uma droga, uma felicidade temporária, a porra de um paraíso artificial.
Pararam de aplaudir, a multidão se dispersou e Misfits começou a tocar nas caixas de som. Eu estava soado, atônito, em um momento eu expressava tudo, eu era tudo, fazia com que todos ali presentes aproveitassem, agora eu era apenas Gerard Way, um alcoólatra depressivo com insônia. Mas pelo menos por um momento eu não fui... Mas uma porra de momento não é nada comparado com uma merda de vida inteira.

Em uma fração de segundo meu corpo estático tomou impulso em direção ao bar. Meus olhos estavam desfocados e ao fundo uma vaga voz de Mikey chamando por meu nome que eu não saberia dizer se ela era apenas uma lembrança de sua voz ou se ele realmente estava tentando vir atras de mim.

— Um copo da coisa mais forte e barata que tiver.

O estranho cara do balcão — cerca de 1,80 metros de altura, com o rosto repleto de piercings e uma tatuagem que ia da testa até a orelha esquerda — acenou com a cabeça e virou-se para logo voltar com uma garrafa transparente de rótulo amarelo. Ele despejou em um copo uma quantidade razoável e deixou a garrafa ali mesmo como se soubesse que eu não pararia no primeiro copo. Dito e feito. Peguei o copo que já estava cheio e o virei em um só gole, bati-o no balcão e apontei com a mão para que o enchesse novamente.

Eu já estava acostumado com a bebida, muito mais que a grande maioria das pessoas, mas estaria mentindo se dissesse que aquilo não desceu queimando. Esse era um dos motivos para me fazer escolher por uma vodka barata, elas quase sempre descem queimando, e é isso que me vicia nas bebidas. O fogo que descia rasgando minha garganta era a sensação que sempre procurava, eu não bebia para apreciar, para me divertir. Eu bebia para sentir a queima, para chegar no meu limite e apagar e finalmente parecer uma pessoa normal. Eu bebia para dormir.

Quando eu estava no primeiro ano do colegial a minha escola propôs uma palestra sobre bebidas, cigarro e outras drogas. Lembro-me muito bem de sentar em uma das fileiras da frente — a quarta, para ser mais exato —, na poltrona que dava para do corredor em que o palestrante passou para ir ao palco. Ele falava algo sobre o porquê das pessoas entrarem nesse mundo, o que me fez rir de seu ponto de vista na época, achava completamente ridículo seu discurso, que era apenas uma repetição de todos outros desse tema, que o álcool era a tal "porta de entrada" para as outras coisas.

Atualmente, continuo achando a maior besteira aquelas suas palavras. Não existe uma porta de entrada, como os mais conservadores afirmam existir, a realidade é tão mais simples que parece que ninguém quer abrir os olhos para entender. A verdade é que eu não comecei a usar drogas porque o álcool levou-me à elas, eu usei porque eu sabia os efeitos que elas trariam, e eu sabia que era aquilo que eu queria. As pessoas são assim, impulsivas, elas podem saber que tal coisa terá um efeito bom ou mau, mas se é esse efeito que elas querem sentir, elas vão usar, as pessoas simplesmente fazem o que elas querem. Mas parece que saber que você mesmo é o responsável pelo seu destino apavora o ser humano, temos que colocar a culpa em outra coisa para assim podermos ser controlados.

O segundo copo desceu como o primeiro, como se queimasse meu interior e depois queimasse as cinzas. Outra coisa que eu gostava na sensação de queima era o sentimento de incêndio em todo o meu interior. A ironia nisso era que a bebida, de um jeito literal ou figurado, realmente destruía o meu interior. Obviamente em minha cabeça com licença poética a queima era de minha alma, meus sentimentos e sentidos, tudo perdia-de em chamas e derretia-se em uma massa dentro de mim. Infelizmente aquilo apenas servia para fazer com que meu fígado quisesse cometer suicídio.

Insomnia//FrerardWhere stories live. Discover now