Um

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Espero que gostem...

beijuuss

- Não senhor Inácio, este é o valor do lote.

Olhei mais uma vez para aquele senhor com feições em seu rosto que marcava o passar do tempo sem piedade. Seus olhos eram negros e escondiam um cara acostumado a mandar em todos da região à base de chicotes e garrunchas.

Mas não ia abaixar minha cabeça, a família de meu pai negociava gado com a família daquele senhor há muitos anos e tínhamos um contrato histórico. Na verdade, queria quebrar essa tradição boba, mas como tenho que manter a palavra da família Vilares na região, tinha que sujeitar o bom lote de 50 cabeças à este velho nojento primeiro.

Meus pais morreram em um acidente de carro há 4 anos. Fugi e me refugiei na casa de minha prima na capital por três meses até decidir o que fazer. Muitos, inclusive o Sr. Inácio, apostaram que eu venderia a propriedade de gado de corte e várias plantações para manter minha vida como a menina rica de cidade grande.

Ledo engano, o Moisés, amigo de infância e gerente da fazenda foi me buscar, para eu tomar rédea de tudo. Ele me lembrou da história das nossas famílias, Vilares e Burjão, e do orgulho que meus pais tinham da fazenda e de mim, futura arquiteta. Assim troquei a faculdade por outra de Agronomia e estou tocando a fazenda com a força e orientação dos grandes funcionários.

O Moisés é um deles, o conheço desde sempre. Ele nasceu aqui. Seus pais trabalharam com meus pais, assim como seus avôs trabalharam com os meus. Tem a minha idade e uma paixão enorme pelas propriedades.

- Olha Sue, sejamos sinceros – o Sr. Inácio me olhava de cima para baixo de seu puro sangue – ainda vou ter que deixar eles 2 meses em pasto para recuperar pelo menos 20% do que lhe pagar.

- Eles estão pronto... Sr. Inácio e é Senhorita Suzane para você!

- Você foi muito mal-criada pelos seus pais... Ah, se você fosse minha.

- Graças a Deus que não sou... Agora vamos ao que interessa, só procurei o senhor primeiro por manter a palavra da família. O compromisso da família Vilares com a Rochedo. No entanto, percebo que queres a quebre... assim...

Peguei a rédea do Benin, meu cavalo mestiço, malhado e o montava.

- Se casasses comigo, não precisava se sujeitar a este sol, a poeira... Ficarias em casa se banhando e se perfumando, à minha espera.

- Como sua mulher faz? – o sacana sorriu.

- Me separo dela... ela é anda não fazendo seu serviço de mulher como deveria, por está muito doente.

- Eh? – olhei de canto de olho – Você me causa nojo.

Direcionei o cavalo ao Moisés que estava com os outros vaqueiros.

- Liga para o Pedro, manda ele trazer o veterinário, vamos negociar com ele. A partir de hoje estou quebrando o acordo entre as famílias.

Moisés riu satisfeito e moveu a cabeça em um sinal de aprovação, ao mesmo tempo os vaqueiros seguiram para arrebanhar os bois e trocarem de pasto.

- Espera Suzane... Vamos...

- Nova direção Sr. Inácio. Novas regras. Novos acordos. E tome mais cuidado ao se referir à uma mulher tão boa e dedicada quanto à sua esposa – me aproximei montada no Benin – os tempos são outros e uma separação orientada por um excelente advogado, lhe custaria sua melhor fazenda. Eu faria questão de ser testemunha à favor de Dona Inês. Agora, tenha um excelente dia.

Sai em disparada com o Benin em direção à sede. Estava cansada, desde à 4 da manhã montada, resolvendo coisa, ferrando bichos, acertando arado, resolvendo pendências com o pessoal, sob um sol que não teve pena da safra de milho. Tivemos que racionalizar a água e distribuir entre a minha propriedade e de mais 5 familiares de pequeno porte. Assim não perderíamos tanto na entre-safra. Peguei financiamento no banco e o dinheiro do seguro de vida de meus pais e construí mais um açude próximo às plantações. A água não seria só minha, mas também de quem precisasse, desde que conservasse a mata natural siliar próxima e ajudasse na manutenção dos córregos.

Antes de chegar em casa, o Moisés me alcançou com seu manga-larga, o Pena.

- Estava contando os dias para você dispensar aquele velho.

- Eu também Moisés, ele a cada dia baixava o nosso preço.

- Dia quente – ele olhava o horizonte – vai trovejar.

- É o que parece. Está tudo em ordem para a feira amanhã?

- Está sim... – olhei o semblante de homem da terra com marca do sol.

O Moisés é um típico vaqueiro da região, o que chamam de cabloco. Os cachos de seus cabelos sempre bem cortados grudavam na testa de uma cabeça protegida com o chapéu de couro. A camisa de manga longa de um algodão mais grosso escondia os músculos definidos de quem trabalha desde sempre pegando pesado. Trazia um colete de couro de bode, trazia coisas necessárias, como canivete, facão, grampos e alicate. Pronto para qualquer coisa.

A calça jeans meio justas não escondia a musculatura de suas pernas quando pressionava o tronco do cavalo para obedecer seu comando.

O Moisés é um cara muito bonito e cobiçado pela região. Não pelo seu dinheiro ou propriedade. A sua família junto com a nossa conseguiu manter boas condições de vida para ambas. Ele era gerente das duas propriedades. Não trabalhava para mim, era como se fosse meu sócio e braço direito. O gado à venda não era só meu. Era nosso. Mas desde sempre, quem tomava as rédeas da negociação era a família Vilares, sempre em comum acordo com a Burjão.

E por quê cobiçado? É um cara honesto, fiel e solteiro. Tranqüilo, odiava confusão.

Mas lembre-se da máxima: 1 boi para não entrar na briga, mas uma boiada para sair.

Ele é forte e em poucas brigas que se meteu pelo menos deixou dois ena emergência do hospital. 

Fez o curso técnico de agronomia. Chegou à fazer 2 anos de medicina veterinária, mas desistiu, pois sentia saudades de casa e odiava aqueles "engomadinhos", que achavam que sabia tudo de animais de fazenda.

Qualquer fazendeiro gostaria de tê-lo como gerente ou capataz. Mas ele era exclusivo.

- Por quê não tira o resto dia?

- Para quê?

- Sei, lá, tomar banho de rio com a menina que anda te trazendo bolos todos os sábados.

Ele riu de canto.

- Com ciúmes Senhorita Suzane?

- Não mesmo, Zés, acho que você deveria dar uma chance para a pobrezinha.

- Iludir, você quer dizer?

- Iludir?

- Sim, eu não gosto dela, qualquer coisa que eu fizesse com ela não seria de bom coração.

- Ah, entendi....

- Então gostas de alguém?

- Sim...

- Então chama ela para passear, diz a ela que gosta de sua companhia, quem sabe?

- Eu até faria isso, mas ela vai estar ocupada esta tarde.

- Vai estar?

Quem é ela? Fiquei curiosíssima, e já ia perguntar quando ele parou o cavalo e fez um sinal para frente da casa sede.

E não acreditava no que estava vendo.

Um cara que conheci nos meus meses na casa da Carla, o primo do seu esposo. Um italiano abusadinho, que eu pensava que tinha me esquecido.

Ele estava apoiado em sua moto vermelha de óculos escuros e tinha um sorriso safado no rosto.

- O que este gringo veio fazer aqui hoje, sem avisar? - resmunguei com raiva


DoisWhere stories live. Discover now