12.1 | ou ❝esconde-esconde❞

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capítulo dedicado a Thamires Bruzzato <3

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O beijo era real. Real demais.

Natan Avelar era a primeira pessoa que eu beijava depois de Nicholas.

E o nosso beijo me tirou do chão. Ele me pegou no colo, como se todo o álcool tivesse evaporado de seu corpo, e me carregou por uma escada até o terraço da festa em que estávamos. Natan não tirou os olhos dos meus, nem um minuto.

Ele explorou minha boca com calma, entrelaçando os dedos nos meus cabelos. Seu polegar tocou a minha bochecha, e eu me entreguei. Beijei-o até me esquecer que ele era o primeiro, depois do meu primeiro amor.

Quando interrompemos o beijo, nenhum dos dois tinha nada a dizer. Só ficamos nos olhando, em silêncio. Acho que é porque ele estava bêbado, e não conseguia pensar em nada para dizer. A cidade se movimentava abaixo de nós, o som da festa fazia o chão tremer.

Vitória é uma cidade muito bonita à noite.

Vitória até que podia ser um lugar muito legal. E eu até poderia dizer que eu e Natan tivemos um momento legal. Porque continuamos nos beijando até começar a clarear, sem trocar uma palavra sequer. Eu poderia até dizer que me diverti ali, largada como uma alma-perdida naquele terraço.

Eu poderia até dizer que me senti livre pela primeira vez em meses, como Nicholas havia descrito em sua carta.

Natan não sabia nada sobre mim, e nem queria saber. E tudo que eu poderia saber sobre ele estava bem ali, na minha frente.

Porém, apesar de termos adormecido por ali mesmo, eu acordei no dia seguinte, recostada no tonel e enrolada no paletó dele, e completamente sozinha no telhado da casa de festas.

Nem mesmo olimpianos furiosos jamais ficarão tão fulos da vida como eu fiquei naquela manhã fatídica. Desci do telhado e atravessei toda a casa de festas, que parecia outro lugar na luz do dia, lidando com olhares realmente incômodos dos funcionários da limpeza.

Eu, descabelada e com a maquiagem toda borrada, enrolada em um paletó masculino, entrei no primeiro táxi que vi.

Era de se esperar. Ele é irmão gêmeo do Lucas.

Bem que Lorena tinha avisado. Eu não queria me envolver com alguém como Natan Avelar.

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Mesmo que eu tenha passado os dois dias seguintes xingando Natan mentalmente, ainda assim tinha vontade de beijá-lo. Eu era tão, tão estúpida por ter caído no charme daquele garoto. Mas, no terceiro dia depois da festa, voltei à programação normal de ódio contra não apenas um, mas dois Avelar.

Eu tinha outras coisas para me preocupar. Por exemplo, minha mãe voltaria da semana de moda naquela semana, e eu tinha umas cinco faltas não justificadas na escola. Tinha setenta e duas mensagens não lidas de Lucas no meu celular.

E Nicholas tinha decidido me esquecer para sempre.

Então, eu finalmente resolvi dar as caras na Leonardo Da Vinci.

A primeira aula de segunda-feira era do Professor Alan. Entrei com a cabeça baixa e fui para o meu tradicional lugar no final da sala. O professor olhou para mim com ressentimento.

De repente, uma batida na porta e uma voz conhecida interromperam seu discurso.

— Foi mal, Professor, mas eu preciso falar com a Val... Valéria.

Lucas estava parado ao batente da porta, parecendo desfeito. Os cochichos e fofocas começaram no instante em que as pessoas se deram conta de que ele estava lá para me ver, mas que eu não tinha a intenção de olhar na cara dele.

Desejei a capa de invisibilidade do Harry Potter. Ou padrinhos mágicos. Troquei um olhar severo com Alan, que se virou para Lucas e disse sem um pingo de compaixão:

— "Foi mal", Sr. Avelar, mas você vai ter que esperar pelo intervalo.

Lucas franziu a sobrancelha, como se ninguém nunca o tivesse proibido de fazer algo na vida.

— É urgente. — explicou ele.

— O senhor infelizmente vai ter que esperar pelo final da aula, como todos os alunos dessa escola. — repetiu Alan, todo calmo.

Era reconfortante ter alguém me defendendo daquele sociopata que finge que é pobre e esconde sua namorada e irmão gêmeo das pessoas.

Não de todas as pessoas. Só da minha pessoa mesmo.

— Eu insisto, professor. — Lucas deu um passo à frente, e Alan caminhou a largos passos até a porta, ficando próximo ao rosto dele. Minha garganta estava completamente fechada.

— Está atrás de uma detenção, Sr. Avelar?

— Eu só preciso falar com a Val, cara. — insistiu Lucas, batendo os braços nas laterais do corpo, fazendo com que a câmera em seu pescoço pendesse de um lado para outro.

Isso não acabaria bem.

— O senhor tem três segundos para deixar a minha sala, Sr. Avelar. — crocitou ele, segurando a porta — Não estou de bom humor.

— Val, por favor. — Lucas empurrou o professor entrou na sala de aula ao som de vários oh's. Foi caminhando até a minha carteira, até que Alan o agarrou pelo colarinho da camiseta do uniforme.

— Sabe, Sr. Avelar, eu tive uma ideia. — disse Alan. Eu fechei os olhos e permaneci apenas escutando, mortificada. — Já que está aparentemente tão interessado na Srta. Corrêa, o senhor ficaria encantado em me apresentar um seminário sobre a cidade de onde ela veio. Viveiro, São Paulo. No mínimo vinte minutos de apresentação. Para o final do semestre. Ah, e boa sorte para achar informações no Google.

Lucas protestou enquanto era arrastado pelo braço. Metade da sala estava de boca aberta, e a outra metade cochichava ferozmente.

Eu estava em Vitória.

Todo mundo sabe da vida de todo mundo por lá.

Não havia a menor chance de aquela cena não ser reportada para Lorena, ou Natan.

— Está feliz agora? — finalizou o professor — Porque pode ficar ainda melhor. — e jogou Lucas no corredor, fechou a porta e em seguida retomou a aula monótona de alguns minutos atrás.

O sinal tocou e os alunos praticamente se espremeram pra passar todos ao mesmo tempo pela porta, e eu podia acompanhar as fofocas, ou fragmentos delas. "Lucas Avelar", "drama", "detenção".

Esperei até que todos saíssem. Alan estava sentado em sua mesa, olhando fixamente na minha direção. Eu fingi que não tinha visto e caminhei até a porta, mas quando estava prestes a atravessar o batente, me virei para ele.

Alan havia me prometido que jamais diria a ninguém de Viveiro onde eu estava "me escondendo". Só depois percebi quão estúpida eu fui por dizer:

— Não conte a Nicholas sobre isso.

Onde Há FumaçaOnde histórias criam vida. Descubra agora