Capítulo 1

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Era outubro de 2007 e os dias que ele mais aguardara durante toda a infância haviam acabado de começar. A semana da criança significava duas coisas na escola em que estudava: para o ensino fundamental, cinco dias letivos integrais e uma manhã de sábado em competição interclasse; para o ensino médio, a semana do saco cheio, na qual não havia aula.

Caíque adoraria ter uma semana sem aulas, mas não era por isso que ele vinha esperando. Fazia muito tempo que contava nos dedos o momento em que chegaria ao sexto ano e as competições começariam. Seria uma semana toda com os amigos, pendurado ao telefone durante a noite, após chegar exausto em casa, para resolver as missões dadas para o dia seguinte.

Ver os irmãos tão unidos com os colegas sempre o havia feito desejar participar também. Não que ele fosse a criança de onze anos que mais adorava a escola a ponto de querer acordar cedo pela manhã e sair de lá só no fim da tarde, mas a escola não era mais a mesma escola naquela semana. Os uniformes de cor azul-marinho e branca ficavam coloridos de acordo com a vontade de cada classe, que então se transformava em uma equipe. Cada uma tinha seu nome, sua própria camiseta personalizada e dois professores representantes eleitos pelos alunos.

Era meio-dia de uma segunda-feira, e ele finalmente estava de camiseta roxa na cantina durante a hora em que os jogos eram interrompidos para o almoço. A equipe do sexto ano A, também conhecida como Roxos de Raiva, estava reunida em volta de uma grande mesa. Precisavam decidir qual seria o par de alunos que representaria a sala na prova de dança do dia seguinte. Eles teriam bastante ensaio a fazer para aprender uma coreografia dos anos setenta.

Havia uma infinidade de outras provas ocorrendo ao mesmo tempo, e assim a sala precisava se dividir constantemente. Naquela manhã, eles haviam pulado corda em grupo, testado seus conhecimentos em músicas famosas, os meninos haviam jogado a primeira partida de vôlei e as meninas, de futebol. Haviam levado belas rasteiras do sétimo ano A, mas tinham certeza de que podiam vencer pelo menos os sextos anos B e C nos esportes.

Caíque não queria nada com cordas, músicas famosas, vôlei ou futebol. Enquanto as meninas brigavam entre elas para decidir quem poderia dançar melhor, ele tinha as mãos contraídas debaixo da mesa na esperança de que algum dos meninos olhasse para ele e o indicasse como o competidor daquela prova. Nunca tinha dançado, ainda mais músicas antigas, que mal conhecia, mas a tia Joana havia chegado com um DVD na classe antes de saírem para o almoço, e ele imaginava como seria incrível usar uma jaqueta preta de couro.

Moveu o quadril na cadeira, imaginando-se no dia seguinte em cima do palco do auditório, com um topete alto, estalando os dedos e chacoalhando as pernas daquele jeito engraçado que o moço bonitão do filme havia feito. Parou ao perceber que estava chamando atenção, parecendo que tinha formigas dividindo o assento com ele. Os meninos continuavam em silêncio.

— Pronto, a Melissa. A Melissa vai dançar amanhã. — O grito fino de Renata indicava o quanto ela estava feliz por uma das melhores amigas ter sido escolhida em vez de Nicole. Nicole era a líder do segundo grupo de meninas da classe, o grupo em menor quantidade. Isso não ajudava muito na questão da democracia em decisões como aquela.

Caíque normalmente diria que aquilo era injusto, que os meninos deveriam votar também. Nicole estava visivelmente decepcionada, assim como todas as meninas do grupo dela, mas o nome de Melissa o fez pensar em algo um pouco mais importante do que a decepção de Nicole: ele mesmo, era claro. Melissa era sua melhor amiga na sala. Não que fossem ótimos amigos, mas era a menina com quem mais conversava, e isso abriu uma porta com a qual ele não contava:

— Então eu posso dançar também. A gente mora perto, dá pra ensaiar de noite.

Os colegas jogaram as mãos para cima e se uniram em um som que se assemelhava a um rosnado, na comemoração que haviam inventado para o time. As meninas abraçaram Melissa, e Caíque sentiu seu cabelo ser bagunçado por vários dos amigos. Com isso, a professora lhes entregou a ficha de inscrição para que escrevessem seus nomes e corressem para a diretoria, onde deveriam entregá-la até o fim do almoço.

Ele quer dançarWhere stories live. Discover now