Vinte e Oito

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Olivia

"Se não tem coragem de morder, não rosne."

O banheiro está vazio. Eu vou até a pia e lavo minhas mãos. Essa noite está sendo incrível, e ela mal começou. Eu tenho o Noah só para mim, juntando ao fato de que ele me deixa de ótimo humor na TPM e que eu estou extremamente feliz por ter passado nas provas.

Um estrondo baixo me assusta. Eu me surpreendo quando vejo Lia caminhar até o espelho e arrumar o cabelo.

— Boa noite, Hampton. — Eu não respondo. — Veio sozinha? Não acha um pouco patético?

O que diabos ela estava fazendo aqui?

— A única coisa patética aqui é essa sua cara de pau. — Mordo a língua, me impedindo de começar uma discussão com Lia. Sendo assim, eu só me viro e caminho para a saída.

— Veio com ele, não foi? — Lia grita. Eu paro. Eu não sei porque parei quando deveria estar correndo. — Que droga, Olivia. Eu sabia que isso iria acontecer. Você caiu direitinho no papo do Noah James.

Eu me viro em sua direção, cega por querer arrancar aquela palha vermelha que ela chamava de cabelo, mas prezo pela educação. Eu me acalmo por fora — a única parte que eu consigo controlar — , mas deixo os punhos cerrados a fim de aliviar a pressão.

— Nós não somos inimigas, Liv. — A ruiva caminha lentamente na minha direção. — Não estamos em um livro de romance clichê. Você precisa me ouvir, e se afastar.

— Por que? — Indago, rapidamente com a voz firme, fazendo-a se assustar com minha afronta. — Pra você ter ele? Isso é ridículo, Lia, se dê o respeito.

— Tola. — Lia arrebita o nariz. — Você é ingênua. Não vê nada além do que te mostram. — Se exalta, quase gritando. — Eu já fui como você. Uma idiota apaixonada e cega. Você é a única que não percebe o que está acontecendo.

Uma semente da dúvida é plantada, eu sinto isso, e estou tão focada em sentir as primeiras perguntas brotarem, que fico calada e a deixo pensar que concordo com seus pensamentos.

— O Noah não é perfeito. É um canalha mentiroso. Ele mente para você todos os dias, todas as noites em que não pode brincar de casinha contigo. — Ela parece rir, mas logo está com uma expressão de falsa tristeza no rosto. — Pergunte à ele, Olívia. Pergunte o que ele faz toda sexta à noite, ou nos fins de semana. Por que Noah James está em toda festa, sendo que odeia elas? — Ela se aproxima ainda mais, invadindo meu espaço e tirando o meu ar. — Você leva um mentiroso para sua cama, apresenta ele à sua família, e ainda diz que estou errada quando te chamo de ingênua e idiota? — Ri, forte e intimidadora.

— De que merda você está falando? Você não conhece o Noah! — Eu não vou confiar nas palavras dela, não enquanto essa história mal contada não seja dita verdadeira.

— Ah, Liv. — Mais falso sentimento. Expressões cheias e olhos vazios são a especialidade de Lia Donovan. — Eu sou a única que o conhece. Verdadeiramente e por inteiro. Cada pedacinho dele está sob meu olhar vinte e quatro horas por dia.

O calor sobe meu pescoço, insistindo em fechar minha garganta.

— Não confie em quem te esconde coisas tão terríveis, fofa. — Seu rosto está tão próximo ao meu, que consigo sentir o cheiro doce do seu perfume.

Lia sai sem dizer mais nenhuma palavra, me deixando plantada no meio do banheiro com lágrimas no rosto e um aperto no coração. Ela sabe que dúvidas são minhas fraquezas, ela sabe.

Durante todo esse tempo, eu venho aguentando e engolindo as provocações de Lia. Estou sendo madura, como manda o decoro. Eu simplesmente respiro fundo e digo que sou adulta demais para entrar em uma briga com ela. Mas a cada vez que eu me esforço para ignorar, aquele sentimento quente de raiva cresce, me queimando por dentro.

Lavo meu rosto, e me olho no espelho. Eu não posso deixá-la me fazer acreditar no que sai da sua boca venenosa.

Feliz com meus pensamentos, saio do banheiro.

Já na porta, quando penso em voltar para a sala de cinema, meu celular toca.

— Oi, papai. — Atendo rápido.

Olívia, onde você está? — O barulho alto das sirenes preenchem o vazio que sua voz deixa.

— No cinema. Tem algum problema?

Só poderia ter, já que ele me ligara no meio de um trabalho.

— Na verdade, sim. O que você sabe sobre Katrina Campbell? — Sua voz está rígida, soando como o Detetive Hampton, e não como meu pai.

— Campbell? — Vasculhei na minha mente. — Não reconheço, desculpe. O que aconteceu?

— É da sua faculdade, da turma de Administração. Acabou de ser encontrada morta na banheira do próprio dormitório, eletrocutada porque caiu na água com o secador ligado e com uma possível overdose. Tem droga por todo o lugar, é deplorável. — Ele afasta o celular e grita algumas ordens. — Pergunta ao Noah sobre ela, talvez estudem juntos. Tome cuidado filha, e vá para minha casa hoje, acho que não vou voltar cedo e não quero deixar os garotos sozinhos. Eu te amo.

— Está bem. Eu te amo — sussurrei antes de desligar a chamada.

Uma morte. Isso é terrível. Ela poderia ser uma viciada, mas até a morte é radical demais como punição.

Eu ainda estou tentando processar as palavras de Lia e do meu pai quando um Noah preocupado rompe pelo corredor. Ele anda rápido até mim, e segura meu rosto com as duas mãos.

— Você está bem? — Franze o cenho, me olhando no fundo dos olhos. — Eu vi a Lia saindo, ela me disse que te encontrou no banheiro.

— Estou ótima.

— Então porque está com essa cara? — Sussurra.

Eu afasto suas mãos do meu rosto. Noah parece confuso, mas não move um fio de cabelo.

— Só estou chateada. — Dou de ombros. Conhecendo-o bem, continuo antes que ele me ataque com perguntas. — Meu pai ligou, uma tal de Katrina Campbell morreu de overdose.

— Campbell? — Ele arregala os olhos, dando dois passos para trás. Eu já sei que ele a conhece, qualquer um saberia pela expressão horrorizada no seu rosto.

— Estudava com você? — Pergunto enquanto ele tira o celular no bolso.

— Vamos, vou te deixar em casa. — Segura meu pulso, me levando para fora do cinema enquanto escreve algo no celular.

— Você não vem para a minha casa? Achei que hoje...

— Não. Preciso resolver algumas coisas. — Ele me solta para abrir o carro e me jogar no banco passageiro o mais rápido que consegue. Eu sou pega de surpresa com a sua frieza, e decido que não gosto disso.

— Me deixe a casa do meu pai hoje, por favor. — Fecho o cinto de segurança quando Noah acelera o carro. — Onde você vai?

— Resolver... — O interrompo.

— "Algumas coisas", é, eu já entendi essa parte. — Revirei os olhos.

— A gente conversa direito depois, Olívia. Eu não posso agora, entenda. — Noah parece nervoso, transtornado.

Eu não entendo o que está acontecendo, mas não vou insistir. Ele vai me falar assim que estiver pronto, eu sei.

Na viagem para casa, eu penso no meu encontro com Lia. As coisas que ela me disse são processadas no meu cérebro, e por mais que eu ache que é uma mentira, sinto a vontade de ter mais informações.

A semente da discórdia foi lançada. Meu coração quer estar ao lado do meu namorado, mas o cérebro insiste em ser racional e doentio, ele precisa que todos os fatos sejam estudados. E no fim da noite, deitada em uma cama fria, sofrendo de insônia e contando quantos carros passam na rua, eu decido que irei investigar. Por mim mesma, sozinha, eu vou descobrir se Lia Donovan falara a verdade.

Desastre Sensual (REPOSTANDO)Onde histórias criam vida. Descubra agora