CAPÍTULO 53-NEGLIGÊNCIA

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Álex tentava ignorar um sinal vermelho que parecia gritar em sua mente para que eles parassem tudo e fossem investigar a fundo o que tinha acontecido naquela noite na faculdade.

"Há prioridades que ultrapassam outras prioridades", mestre Tanko o alertara certa vez.

O fisioterapeuta teria dado atenção a esse alerta, se não estivesse tão obcecado por conquistar o seu discípulo e afastá-lo de vez de Donato.

Apaixonado do jeito que ele estava e não querendo perder um minuto com Tiago, o médico foi procrastinando, procrastinando até passarem-se as horas...dias...e logo já havia uma semana que acontecera o episódio que assustara tanto Tiago sem que Álex tomasse uma atitude mais rígida do que fazer-lhe massagens para que ele relaxasse e mesmo conversasse com ele apenas, fazendo perguntas para as quais Álex já sabia, previamente, que o rapaz não teria respostas. 

Mais tarde, o arrependimento viria cobrar o seu preço torturando a mente que pecara primariamente naquele detalhe tão absurdamente evidente: bastaria um toque...bastaria uma hipnose básica para fazer com que Tiago voltasse àquela noite...lembrasse daquelas palavras, revelasse aquele ponto básico daquele misterioso acontecimento, a fim de que iniciassem o processo de investigação mais profunda.

O namorado de Tiago  sabia que, se algum dos mestres pudesse falar com ele, a palavra que despontaria em todas as frases em relação a sua conduta seria negligência.

Investigar aquele mal estar significaria sentarem-se, meditarem, repassarem cada detalhe, ficarem horas e horas apenas conversando ou mesmo tratando de assuntos espirituais a fim de tentar entender o que estava acontecendo e, especialmente, o que estava por acontecer.

Álex, finalmente, deu-se por vencido e decidiu, mesmo contra a sua vontade, chamar Tiago para que descobrissem juntos, de uma vez por todas, aquela charada.

_Querido, sei que não quer lembrar-se daquele episódio naquela noite na faculdade, mas já se passou uma semana e acho melhor a gente ver logo o que era aquilo.

Tiago, que estava apoiado relaxadamente no peito do seu mestre naquela manhã, remexeu-se incomodado diante da simples menção daquele acontecimento desconfortável:

_Sinto arrepios só de pensar em reviver aquilo, Álex.

O fisioterapeuta avaliou, pela milésima vez, a possibilidade de adiantar para Tiago as suas fortes suspeitas de que algo muito ruim estava a caminho. Porém, Álex poderia representar bem o papel do mestre seguro de si, conhecedor e dominador de todos os mistérios e segredos do mundo espiritual  para Tiago, mas não mais para si mesmo. 

O antigo discípulo de mestre Tanko tinha que admitir que estava ficando cada vez mais relapso e irresponsável quando  o assunto era escolher entre o físico e o espiritual...Fazer amor ou passar longas horas pesquisando em livros antigos episódios semelhantes ao que tinha acontecido com o seu discípulo. No fundo de seu inconsciente, talvez, alguma resposta que ele não queria descobrir já o rondasse sem que, porém, aflorasse à superfície a fim de revelar-se diante da luz da sabedoria de um mestre precavido.

Ainda naquele dia a tortura do arrependimento sufocaria o mestre tão negligente com o seu discípulo amado. Pudesse Álex ter percebido isso e não teria afrouxado a sua tutela ao homem inocente do perigo que o rondava e  que estava sentindo-se tão seguro em seus braços naquele momento.

_Eu sei que foi assustador e desagradável, amor, mas precisamos trabalhar o seu dom, Tiago. Você precisa esclarecer melhor quando ele se manifesta. O que foi aquilo outro dia na faculdade? Foi uma crise de ansiedade...uma estafa ou algo maior? Não entendi, confesso. As nossas conversas não deram em nada e talvez eu tenha que recorrer a outros métodos._confessou.

Tiago suspirou resignado pensando que, se pudesse escolher, preferia continuar ali, tão relaxados e realizados após terem feito amor tão gostoso na noite anterior.

_Se você não se importar, então, que tal fazermos isso mais tarde? Depois do almoço, pode ser?_Tiago o olhou com carinho._Preciso ir na papelaria agora de manhã e não gostaria de adiar. 

_É claro, amor. A gente faz a nossa investigação mais tarde, não tem problema.

Diante daquele pedido tão aflito do discípulo, mais uma vez Álex procrastinou o procedimento imaginando que não faria diferença se investigassem depois, afinal, seriam apenas mais algumas horas até descobrirem o que aquele episódio queria dizer.

_ Não há de ser nada tão urgente que não possa esperar mais um pouco, ok?!_completou o mestre a título de acalmar o discípulo.

_Não sei se estou tão certo disso...ainda posso me lembrar do odor putrefato tão forte e daquela voz maldita._Tiago franziu o cenho arrepiando-se._Talvez a gente deva fazer isso mesmo...nos empenharmos ao máximo a fim de  descobrir o que aconteceu naquela noite. De hoje não passa! Só de pensar, já morro de medo de voltar a acontecer, acredita?

_Acalme-se, meu anjo._Álex abraçou o discípulo com carinho._Se tivesse que acontecer novamente ou se fosse algo tão urgente, já teria acontecido. Premonições podem levar anos para se confirmarem, acredite. Já disse...está tudo bem. Se fosse algo tão sério assim, eu também teria sentido algo, não acha?

Tiago riu mansamente.

_É claro, afinal, você é o mestre.

Álex crispou a boca contrariado.

_Pare de falar este termo porque eu me sinto um idoso, sabia?

Tiago beijou os lábios do mestre sorrindo da repulsa dele pelo termo e levantou-se, saindo da cama. A papelaria onde precisava ir era próxima ao apartamento uns quatro quarteirões.

Antes de sair, o discípulo avisou:

_Se eu me atrasar um pouco, você abre a clínica pra mim, por favor?

_Não se preocupe, amor. Tenho que buscar algumas ervas numa loja que vende apenas produtos orgânicos e vou de moto. Será bem rapidinho e a gente poderá se encontrar depois, na porta da clínica. Se você demorar, tudo bem, eu mesmo abro as portas, não se preocupe.

Álex beijou os lábios do namorado com carinho. Franziu o cenho preocupado:

_Você está quente, febril. Está sentindo algo estranho?

_Um leve mal-estar, agora que falou. Acho que é algum resfriado. Tomo um chá mais tarde e fica tudo bem, não se preocupe.

_Isso me lembra que estamos sem ervas para resfriado. Vou comprar mais. Escute, talvez seja melhor você não sair agora. Não prefere fazer um pouco de repouso? Pelo menos até tomar o chá?_sugeriu preocupado.

_Eu voltar a me deitar sozinho naquela cama enorme?_Tiago disse insinuante._ De jeito nenhum, doutor. Isso sim irá me fazer ficar triste, acredite. Já disse...não é nada demais e eu já vou melhorar, acredite. Se duvidar, deve ser nervoso por saber que vamos remexer naquele episódio monstruoso. Fico arrepiado só de lembrar, veja só._mostrou os pelos do braço já eriçados.

Tiago deu um outro beijo nos lábios de Álex que ainda o olhava preocupado.

_A gente se vê daqui a pouco, está bem?

_Se quiser, te dou uma carona..._o fisioterapeuta tentou.

_De moto? De jeito nenhum! Sabe que tenho pavor de moto! São apenas alguns quarteirões e voltarei rápido, que exagero. Caminhar irá me fazer bem, acredite.

_Espere..._ele segurou a mão de Tiago evitando que ele se afastasse._Então eu vou de carro e te levo...

Tiago revirou os olhos:

_Não! Que exagero! Eu vou rapidinho, já disse.

O mestre ficou olhando o seu discípulo afastar-se. Tentou relaxar. Achava que estava tornando-se um homem pegajoso com todos aqueles cuidados, afinal. Não queria que Tiago se sentisse sufocado com tanta proteção e tentou relaxar.

O SINAL DE CAIM-Armando Scoth Lee-romance gayDonde viven las historias. Descúbrelo ahora