Capítulo 17

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Joana

Saí do quarto de Pedro, num rompante, me igualando a um vento que passa e pouco se percebe sua presença, afinal estar perto dele, causou-me uma reação inesperada de total e completo êxtase, o que ao meu ver, foi um tanto quanto exagerado. Éramos somente conhecidos, entre nós já existia muito tempo, muitos acontecimentos... Seguimos cada um o seu próprio caminho, sem nos recordar de que um dia fomos tão próximos.
Estava perdida em minhas lembranças de uma infância feliz, quando alguém bloqueou minha passagem e o "encontrão" foi inevitável, de forma que ambas cambaleamos, mas somente eu caí no chão.
- Olha por onde anda garota! - Parada na minha frente e com uma feição nada amigável, estava uma mulher de longos cabelos pretos e maquiagem muito bem feita, que de certa forma, realçava seu rosto e sua beleza.
- Desculpe! - Rapidamente me coloquei de pé, sacudindo a poeira inexistente da roupa e tentei contorná-la para então retomar meu trabalho com os demais pacientes, porém a mesma se deslocou e novamente se pôs em meu caminho.
- O que estava fazendo no quarto do meu marido? - Ela me olhava por cima, com um ar de superior, tentando me intimidar, algo que para sua infelicidade não funcionava comigo.
- Seu marido? - Repeti incrédula, cruzando os braços sob o peito. Sabia que estava revidando a ela e não deveria, mas quando dava conta, já havia respondido e agora não tinha como voltar atrás - Engraçado, onde estão suas alianças? Se são casados deviam usar uma e nem você e nem ele possuem uma! - Joana como você está ousada hoje! Meu subconsciente disse divertido e eu ruborizei levemente, sem deixar que a morena carrancuda notasse.
- Renovamos as alianças e estamos esperando que as novas cheguem! Não que isso seja da sua conta - Ela respondeu ríspida observando as longas unhas pintadas de um tom vermelho e depois me lançou um olhar mortal - Agora, me responda o que estava fazendo no quarto do meu marido?
- Eu visito e oro por cada paciente deste hospital! Não que isso seja da sua conta - Usei sua própria frase contra ela e a vi, por um prévio segundo, ela perder a pose e ficar sem resposta. Estava começando a me sentir vitoriosa e me preparava para deixá-la sozinha com sua ignorância, quando ela se recompôs e furiosa deu alguns passos em minha direção, quase deixando nossos narizes encostados. Ela bufava de raiva e tive de me segurar para não rir.
- Escuta aqui sua... Sua... Esquisitona de meia tigela, vou lhe avisar somente uma vez - Ela dizia sem tirar os olhos fumegantes dos meus que permaneciam neutros - Fique bem longe do Pedro! Me entendeu? Ou eu não responderei por mim! - E após me ameaçar, ou achar que aquilo foi uma ameaça, saiu batendo os pés na direção do quarto em que Pedro estava.
Respirei fundo e olhei para o alto.
- Meu Pai, dai-me forças para resistir a essas ciladas do inimigo e me enche com teu amor! - Clamei ajuda a Deus e segui para a sala das crianças. Ao menos ali, eu esquecia completamente de tudo, e sem contar com todo amor e carinho que eu era recebida. Ver o sorriso no rosto daquelas crianças, me enchia de alegria.
- Olha quem voltou!? - Anunciei assim que abri a porta e fui rodeada no mesmo instante por todos, que me abraçavam e pulavam de alegria com a chegada da Tia Nana, que era como me chamavam.

Henrique

A dor pela ausência de Melinda, era constante e dilacerante. Me consumia por inteiro. Não havia mais nenhum resquício do homem que um dia eu fui, tudo que existia agora era um maltrapilho, a carcaça de um homem. O que prova que, sem as mulheres nada somos.
Haviam se passado dias e eu me tranquei no quarto, onde continha a maioria das lembranças dela e onde eu podia sofrer em paz. De vez em quando, ouvia alguém bater na porta e balbuciar algumas palavras, mas estava tão entorpecido em minha dor, que já não conseguia mais distinguir e reconhecer as mesmas.
Eu sofria, não somente pela falta que minha esposa fazia, porém também pela monstruosidade que cometi ao meu filho, meu menino. Como eu pude ser tão violento? Como cheguei a esse ponto?
Mais uma vez, peguei o perfume de Melinda e borrifei sobre o travesseiro, o abraçando e rapidamente caí num sono profundo.

Um Anoitecer (Livro lll - TRILOGIA FASES DO DIA)Onde histórias criam vida. Descubra agora