PRÓLOGO

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— Qual é o seu maior medo? — Doutora Helena sempre fazia a mesma pergunta. Ajeitei-me no assento ao cruzar as pernas. — Meu maior medo é descobrir que a minha vida é uma mentira. Já disse que não sei explicar, é uma confusão total aqui dentro. Tenho tudo: dinheiro, sucesso, amigos, um noivo de dar inveja e é como se nada disso fosse meu. Até hoje não consigo amar Tales, a não ser como amigo; até esse relacionamento não é verdadeiro. Tudo é questão de conveniência, continuo com ele e agrado ao meu pai, mas me sinto culpada, ele demonstra gostar muito de mim. Essa vida parece não ser a minha... Não sei explicar.

Fechei as mãos como se fosse dar um soco em alguém, respirei fechando os olhos, não cedendo à vontade de surtar na sua frente. Esse assunto era delicado, já que era normal ter medo de quase tudo que fazia parte da minha vida, por esse motivo essas consultas não me faziam bem, não tinha as respostas para suas perguntas. E em todas as consultas eram as mesmas perguntas e anotações, estava tão exausta de tudo isso que resolvi responder a única que sabia.

— Estamos evoluindo. Ser sincera consigo mesma sobre sua relação com Tales é importante para te dar uma direção do que fazer a partir de agora. Antes, sabia exatamente o que estava vivendo, mas não tinha externado. As palavras possuem um grande poder, ou você continua vivendo o que disse hoje, ou muda suas declarações e consequentemente suas ações...

— Tudo bem, preciso ir. Obrigada. — respondi me levantando antes que ela começasse com mais perguntas.

Evoluindo? Não sei como chegou a essa conclusão.

— Isabella, existe uma grande chance de você sair dessa confusão, mas o medo é a prova de que você não quer descobrir a verdade que existe em cada um dos seus sonhos. O principal sinal são as suas fugas, isso quer dizer que de alguma forma acredita que os sonhos e pesadelos que se misturam sejam lembranças do passado. Fugir desse assunto não vai fazer com que eles desapareçam, pense nisso!

Prendendo a respiração, caminhei ignorando suas palavras.

Não, ela está completamente errada. Não, não são lembranças, são apenas sequelas do trauma do acidente. É, é apenas isso, uma sequela e nada mais.

Acordei há sete anos, depois de ter sofrido um acidente de carro em que tive um traumatismo craniano, sobrevivi com a ajuda da medicina.

Em casa existia um quarto, uma linha do tempo, desde o dia do meu nascimento até poucos dias antes do acidente e, no decorrer dos anos após o trágico dia, fiz questão de continuar com as recordações. Nas fotos era tão real, era onde conseguia sentir que minha vida era realmente minha. Fizeram esse quarto depois que acordei do acidente e não me lembrava do meu próprio nome, então o quarto foi a forma que meus pais encontraram para ajudar a atualizar minha vida.

Na época tinha 18 anos, meus pais, Joseph e Heloísa, fizeram o impossível para me ajudar, gastaram uma fortuna, passei por tratamentos com vários tipos de remédios — ainda passava — e por vários tipos de psicólogos, mas nunca confiei em nenhum deles.

Não confio nem em mim mesma, minha própria mente prega peças em mim.

Ao sair do hospital, rejeitei Joseph, não suportava olhar em seus olhos. Mamãe, sempre cheia de amor, teve paciência comigo, afetuosa. Durante os primeiros meses, foi horrível, aos poucos fui me acostumando a olhar as fotos em que estávamos juntos, procurei acre

ditar em cada história de infância e adolescência que contaram. Não disse a nenhum dos dois sobre os pesadelos, com o tempo aprendi a amá-los, mas não entendia o porquê de todas as noites, ao fechar os olhos, eram eles os vilões dos meus sonhos.

Ele Nunca EsqueceuWhere stories live. Discover now