1

680 34 0
                                    

637 anos se passaram desde aquela noite sórdida. Eu me lembrava na promessa que Perséfone me fizera naquela noite. Mas eu tinha me tornado um deles e parte de minha alma acreditava que eu nunca mais veria-a. Era uma noite de dezembro. A neve nova-iorquina cobria as calçadas e avenidas. Sibelli tocava lindamente fúnebres melodias no piano. Foi quando a campainha tocou. Ninguém tocava a nossa campainha. Levantei me num impulso e abri a porta com uma curiosidade quase humana.
   Lá estava ela. Exatamente como eu me lembrava. Os longos cabelos loiros tocavam-lhe os joelhos e os enormes olhos azuis me olhavam. Usava um vestido que se fosse uma outra era eu diria ser terrivelmente vulgar. Vermelho. Essa era a cor dela. Anéis de ouro enfeitavam-lhe os dedos. Ela ainda parecia uma menininha:
   -Amadeo...- ela me chamou sorrindo- posso entrar?-  dei-lhe espaço e ela entrou. Estava estupefato com sua presença.- Marius.- ela fez uma breve reverência ao entrar
   Marius também pareceu surpreso em vê-la. Apenas uma coisa nela havia mudado. Seus grandes olhos azuis não eram mais inocente e isso era tudo:
   -Perséfone...- tentei falar se é que fui capaz. Ela virou-se para mim e fez um movimento com as mãos no ar fazendo com que as portas francesas se fechassem atrás de mim.
   - Benji, é um prazer finalmente conhecê-lo.- O Pequeno levantou-se. Indo até ela.
   -Eu a convidei.- ele disse baixinho como se soubesse a bagunça de meus pensamentos. Mas não sabia de fato.
   - Amadeo. Armand, não é? Você mudou. Se tornou um deles. Matou aquela criança.
    - Não eu não a matei!- protestei, sabia que ela se referia a Claudia.
    - permitiu que a matassem Amadeo. Mas não foi para isso que eu vim. Seu pequeno pupilo parece interessado na minha imortalidade não assassina.
   Graciosa de fato. Mas ela me lembrava tão desesperadamente Marius. Benji estendeu a mão e foi com ela para um cômodo mais reservado. Sibelli não pareceu se importar muito. Fui atrás, queria ouvi-la. Queria entende-la. Minha Perséfone. Minha. Ela e Benji conversaram por horas. Apenas conversaram. Ele anotava tudo o que ela dizia. Ela descreveu em detalhes seu passado e o dia de sua captura pelos filhos da noite. Descreveu a agonia de ver suas vestes consumidas pelo fogo. Disse que ela havia sido "beijada pelos deuses" o que quer que isso signifique. Contou sobre suas longas conversas com o irmão de Louis. Contou que viu-o se atirar da escada e que tentou salva-lo. Contou que seguiu Louis e Claudia à Paris. Que assistiu a menina morrer e que tentou trazê-la de volta, mas não era capaz disso. Disse a ele que quando me viu junto à aquele vampiros fanáticos quis gritar comigo. Que quis morrer. Contou ter assistido todos os shows dr Lestat e como ela amava a música de Sibelli.
    Estava para amanhecer quando eu os interrompi. Pedi que ela conversasse comigo. Fomos até os jardins. Senti lágrimas involuntárias escapando de meus olhos. Ela me abraçou. Me abraçou como fez no dia em que a tirei das ruas. Secou meu rosto. Beijou minha face. Ela era quase tão doce quanto Marius:
    -Não precisa chorar Armand. Acabou já, tudo aquilo acabou.- ela me consolava como se fosse capaz de organizar meus pensamentos.- veja, está faminto. Seu rosto está mais branco que a morte. Aqui.
   Ela tirou seu cabelo longo do pescoço, prendendo-o acima da cabeça. O cheiro de seu sangue ainda era doce. Eu não o suportava. Trouxe seu pescoço à minha boca, cravando minhas presas ali. Senti ela arrepiar. Era tão estranho. Tão bom. Ouvi seu coração acelerando tentando bombear sangue para todo o corpo. Nunca havia sido tão prazeroso me alimentar da vida. Parei quando ela tocou com dedinhos frios o meu rosto. Soltei-a e ela escorregou por entre os meus braços. Ajoelhando-se no chão. Era tão humana. Tão mortal mesmo que não pudesse morrer. Mesmo que não envelhecesse. Sentei-me junto à ela, colocando-a em meu colo e cobrindo seu corpo que tentava recuperar calor mesmo sabendo que não ajudaria. Ela adormeceu em meus braços como se eu fosse o próprio Morfeu. Levei-a para casa. Eu não conhecia sua natureza e achei melhor não deixá-la a luz do dia. Permiti que dormisse em meu caixão, seu corpo era pequeno e magro e quase não ocupava espaço lá dentro. Adormeci junto à ela.

Perséfone de HadesTahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon