Capítulo XXIV | I Can't Pretend

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Asturio - 3029 | Terra 38 - 1986

— Você não acha estranho que sabemos falar todas as línguas estrangeiras mas mesmo assim, odiarmos os estrangeiros? — perguntou Beatrice enquanto caminhava se esquivando de um galho baixo de um árvore.

Camellia torceu o nariz incomodada. Não gostava quando a irmã fazia perguntas difíceis que não sabia responder. Camellia tinha apenas nove anos, era a filha mais nova da família e, mesmo estando acostumada com as curiosidades constantes de Beatrice, não evitava fazer careta quando a irmã vinha com suas indagações que os mais velhos reprovavam.

— Nós deveríamos voltar para o castelo — foi tudo o que Camellia conseguiu responder caminhando em passos pesados pela grama alta. Afastou com a mão um mosquito que zumbia a sua volta — Se papai descobrir ficará muito zangado.

— Vou perguntar a Ama, ela deve saber de alguma coisa — Beatrice não deu ouvidos para a irmã mais nova e continuava com inúmeras perguntas em sua cabeça — Ela sempre sabe de alguma coisa.

Camellia insistiu em voltar para o castelo.

— Ele perceberá a nossa ausência e mandará Capitão Baltasar atrás de nós junto com os seus guerreiros — mudou sua voz para um tom manhoso — Beatrice, por favor!

A irmã mais velha parou no meio do caminho, Camellia logo achou que ela teria mudado de ideia. Porém, Beatrice nunca mudava de ideia.

Os olhos verdes de Beatrice fitaram Camellia ferozmente fazendo ela se encolher um pouco amedrontada. Naquela época, Camellia não sabia se tinha mais medo do pai ou da irmã. Anos mais tarde, teve certeza de que Beatrice era mais aterrorizante.

— Nosso pai não irá descobrir se você não contar — ela disse calmamente. Não havia doçura na sua voz e muito menos amargura, o que deixava tudo ainda pior. Apenas encarava Camellia com um olhar mortífero. Beatrice era a única dos três filhos do Rei que herdou os olhos verdes da falecida mãe — Se quiser voltar, volte. Mas não ouse se perder no caminho. De qualquer modo, continuará sendo uma covarde.

Camellia se ofendeu com as palavras de Beatrice e segurou o choro o máximo que conseguiu. Seu pai sempre dizia que era feio chorar e não queria fazê-lo na frente da irmã.

Beatrice era a filha do meio, ficando apenas atrás de Esdras, e isso a deixava determinada para mostrar que era melhor do que o irmão mais velho, o sucessor do trono.

Camellia continuou andando com a irmã. Não se atreveria a voltar sozinha para o castelo, especialmente quando estava prestes a escurecer. 

As duas meninas se encontravam muito longe da cidade do Reino, pegaram o caminho oeste da floresta onde levava até a Torre dos Imperdoáveis. Camellia gemeu e sentiu calafrios jurando ter ouvido um grito quando passaram por perto da torre. Não era um lugar muito agradável olhando pelo lado de fora e a menina não tinha a mínima curiosidade para saber como era por dentro, ao contrário de Beatrice.

A Torre dos Imperdoáveis era a segunda pior coisa que poderia se acontecer com um asturiano, a primeira era ser considerado um desonrando. As pessoas mandadas para a Torre dos Imperdoáveis eram em sua maioria ladrões, estupradores e opositores contra o Rei. Às vezes órfãos e pessoas muito doentes eram mandadas para a torre também. 

Ser mandado para a Torre dos Imperdoáveis significava nunca mais ver a luz do dia e ver seus familiares. A Ama uma vez disse a Beatrice que as crianças órfãs eram obrigadas a fazer trabalho escravo e as outras pessoas, especialmente as mais doentes, eram examinadas para experimentos.

My Other Face || SupercorpWhere stories live. Discover now