Olá Detenta!

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Pra ser honesta eu sabia que podia ser presa pelo que fiz, mas sempre imaginava essa possibilidade como algo remotamente distante. afinal eu era só uma assistente de alguém que conhecia alguém importante, nunca chegariam em mim, certo? Errado. Minha mãe dizia que a corda sempre arrebentava pro lado mais fraco e no caso eu era o lado mais fraco.

Ah mamãe! Só de pensar nela já me sentia ainda pior, minha mãe era "o cara", criou três filhos praticamente sozinha depois que nosso pai decidiu que não levava jeito pra ser homem responsável, ele nos abandonou quando Luana passou de bebê chorão pra bebê realmente doente. A Dona Mônica teve que se virar nos 30 e nos 60 pra cuidar da filha recém nascida com pneumonia enquanto eu e o Rafael mal entendíamos das coisas, mas ela conseguiu, trabalhou em dois, até três empregos por anos pra dar a mim e meus irmãos uma vida ao menos aceitável. Nosso pai ainda aparecia de vez em quando, trazia presentes e falava sobre todos os lugares que conhecia em cima da sua moto maneira, Luana o venerava como um herói por isso, mas eu e nosso irmão mais velho nos lembrávamos do quanto ele foi covarde em abandonar a família. Rafael era o mais velho de nós três com quatro anos a mais que eu, começou a trabalhar assim que entrou pro colegial e mesmo depois de se casar não nos abandonou, esse era o pacto dos irmãos Caetano (sobrenome da nossa mãe), jamais abandonar a família como nosso pai, independente de como as coisas estavam. Foi meu irmão que pagou minha faculdade em administração, minha bolsa não era integral e ele fez tudo que podia pra me ajudar, quando me formei procurei um emprego jurando fazer o mesmo pra Luana que queria cursar medicina.

Foi por isso que aceitei esse emprego, por isso ajudei o canalha do meu chefe a fazer lavagem de dinheiro, eu sabia que estava fazendo algo errado, mas ele pagava tão bem que não consegui dizer não, não consegui ser a pessoa que minha mãe tinha me criado pra ser e como castigo vi seu olhar de decepção quando o Juiz me sentenciou a três anos de reclusão em um presidio federal por ser cumplice em corrupção. O idiota do Senhor Black (meu ex-chefe) foi preso como mandante mesmo sendo só mais um laranja dos seus "amigos" políticos, mas ele tinha costa quente então provavelmente estava melhor que eu.

- Pra fora Detenta. – Uma carcereira me tirou dos pensamentos.

Desci do furgão de transporte antes que ela precisasse repetir, não sabia o quanto os filmes eram reais, mas sabia que aqui era os Estados Unidos e não o Canadá onde os presidiários eram tratados como gente.

A guarda levou eu e mais três mulheres pela prisão sem mais nenhuma palavra, senti os olhos das outras detentas sobre nós conforme passávamos pelo pátio, mas não levantei a cabeça em momento algum, meu plano consistia em sair dali o mais ilesa possível depois daqueles três anos e pra isso eu precisava evitar confusão.

- Vocês ficarão nesse quarto até decidirem pra qual bloco cada uma vai. - A mulher a nossa frente falou parando em frente a uma grande porta maciça que mais parecia uma porta de cofre do que a cela que imaginei. – Não to nem ai pra qual cama vocês vão ficar, só não quero saber de brigas entendido? Em cima de cada cama está um kit pra sua higiene e uso pessoal, não mecham nele até que eu mande, vamos conferir isso juntas. Podem entrar.

Eu era a primeira da fila porem deixei que todas as outras escolhessem suas camas primeiro, apenas me sentei na parte de baixo de um dos beliches quando ele ficou livre.

- Certo. Agora vamos ver se deram sorte em pegar os kits completos. – A guarda Hoop (finalmente consegui ler o nome no uniforme) riu sarcástica. Ela abriu a boca pra ler uma folha, mas foi interrompida por uma mulher na porta que tossiu pra chamar atenção. – E ai Falcão? Andando de novo por onde não devia?

- Vim dar uma olhada nas novatas Hoop, nada de mais. – A mulher na porta falou, pelas roupas deduzi ser outra detenta, mas não ousei olhar pro seu rosto, se tinha intimidade com a guarda não devia ser coisa boa. – Algumas nem tão novatas assim né Déb?

- E ai Falcão? – A mulher (incrivelmente tatuada) atrás de mim respondeu. Aparentemente eu dividiria a beliche com uma reincidente ou transferida.

- Quer mais alguma coisa Falcão? Ou só fazer amizade mesmo? – A guarda Hoop perguntou.

- Podemos trocar uma ideia?

- Só porquê estou de bom humor hoje detenta.

- Como quiser chamar querida. – A mulher sem rosto respondeu saindo pro corredor.

- Detenta Costa? – A guarde me chamou após olhar a folha que trazia e senti meu sangue gelar. Dei um passo à frente. – Sério que esse é seu nome? Mas que merda de nome é esse garota?

- Me chamo Ana Clara Senhora, Costa é o sobrenome do meu pai.

- Meio obvio não? De onde vem isso?

- O sobrenome é brasileiro Senhora.

- Faz sentido. – Ela deu de ombros como se realmente fizesse. – Sabe ler detenta Costa? Mas que droga de nome, não consigo não rir.

- Pode usar o Caetano Senhora, é o sobrenome da minha mãe.

- Ótimo Caetano, então, sabe ler?

- Sim Senhora.

- Pega. – Me entregou a folha com a lista do tal kit. – Você lê pra todo mundo enquanto vejo oque essa aqui quer. Déb, você confere o seu e da Caetano ao mesmo tempo, entendido? – E sem falar mais nada ela saiu atrás da mulher ainda sem rosto.

- Você não precisa fazer isso. - Falei pra mulher atrás de mim, mas ela se limitou a sorrir de um jeito intimidador.

- Relaxa, eu faço isso e você fica me devendo uma. – Ela piscou.

Droga, menos de 10 minutos na cadeia e já estava devendo favores a alguém realmente assustador.

- Travesseiro, lençol, cobertor, escova de dente, creme dental, shampoo, condicionador... – Continuei lendo aquela lista mesmo depois de ver a tal de Déb colocar o meu creme de cabelos em suas coisas, quem se importa em ter cabelos hidratados na prisão não é mesmo? Quando terminei de ler tudo coloquei a lista sobre um balcão ao pé da cama e voltei a me sentar em silencio. Uma das outras detentas se aproximou da Déb e só consegui ouvir a conversa por estar realmente perto.

- Ei você? Déb certo?

- Debora pra você novata. E a não ser que já queira conhecer a enfermaria sugiro que de o fora.

- Calma ai grandona, venho em paz e trago presentes. – A mulher entrega oque achei ser o shampoo pra Debora. Ótimo agora ela tem dois shampoos e dois condicionadores. – Claro que espero algo em troca.

- Então não é presente.

- Vamos lá. Só quero saber quem é a cacheada pra ter tanta intimidade com a guardéte ali.

- A Falcão? – A tatuada riu de escarnio. – Vamos fazer assim, eu aceito se presente e te dou um conselho em troca. Não se meta com a Falcão a não ser que queira ser caçada viva nesse lugar falou?

- Isso não é resposta. – A outra reclamou.

- Olha aqui garota, eu falo oque quiser pra quem quiser e aquela mulher ali simplesmente manda na sua vidinha medíocre a partir de agora sacou? Então se falcão te mandar sair, você sai, se Falcão te mandar ir pra outro presidio pegar um presunto dede duro, você vai, se Falcão te mandar matar, você mata. Tá me entendendo?

- Claro como um cristal. – A outra mulher saiu e baixei a cabeça fingindo não ouvir a informação pela qual não paguei.

Alguns minutos depois a guarda Hoop voltou sozinha e continuou com o procedimento pra novas detentas.

Minha SalvaçãoUnde poveștirile trăiesc. Descoperă acum