Capítulo 5

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- Que estranho... - Ela ainda segurava minha mão e parecia estar procurando em mim alguma explicação para um pesadelo tão sem sentido.

- Eu sei que é estranho. Eu nunca estive em um incêndio. Se me queimei alguma vez na vida foi cozinhando. Esse pesadelo não tem nexo com a realidade. Eu pelo menos acho que não.

- Dizem que você só sonha com aquilo que já presenciou. - Levantei o rosto, olhei no fundo dos olhos dela e um frio percorreu minha espinha arrepiando até os pelos do meu rosto.

- Alison, eu nunca estive em um incêndio. Eu me lembraria se tivesse.

- Talvez você não se lembre, mas sua mente lembra.

Tentei achar nela alguma pista para entender o que ela estava dizendo, mas nem mesmo ela parecia saber o que estava falando.

- Minha mente se lembra do que Alison. Não tem como eu me lembrar de algo que nunca aconteceu.

- Eu só estou dizendo... - Ela balançou a cabeça tentando afastar algum pensamento. - Talvez seja só um pesadelo idiota mesmo.

Soltei a mão dela com cuidado e fui andando ao que parecia ser um arquivador de documentos feito de metal. Ele estava velho e meio enferrujado, então tomei cuidado ao sentar.

Acidentalmente uma das gavetas abriu com o peso que meu corpo vez e vários jornais caíram no chão.

- Perdão, eu não sabia que isso ia acontecer... - Abaixei depressa e recolhi os jornais. A data de um deles me impressionou. Oito de novembro de 1990. 

- Não tem problema... - Aly também se abaixou e recolheu alguns jornais que estavam mais distantes de mim. 

- Você tem muitos jornais. Velhos por sinal. - Me levantei e arrumei a gaveta que tinha derrubado. 

- Ela gostava de ler. Os jornais chegavam toda terça. Adorava fazer o caça-palavras. - Ela sorriu, e pela primeira vez seus olhos não denunciavam nenhuma tristeza. - Não quis jogar fora... De vez em quando, quando não tenho o que fazer, pego alguns e fico lendo. Tenho quase certeza de que já li todos, mas como são muitos só me lembro de alguns. 

Dei uma última olhada no jornal que estava em minhas mãos e o coloquei de volta na gaveta. Quando me virei para procurar Alison ela havia sumido. 

- Aly? - Minha voz ecoou pelo atêlie totalmente quieto. 

- Estou aqui! - A voz dela vinha do lado de fora do chalé. - Desça as escadas e atravesse a porta de vidro!

Obedeci e comecei a descer a escada. Segui até a porta e assim que a abri percebi um ruído diferente. Água. 

- Te achei! - Abracei Alison por traz e a balacei de um lado para o outro em meus braços. Ela teria pulado de susto se eu não a tivesse segurado. Ia ser engraçado.

- Quer me matar de susto?! - Não consegui segurar o riso. - Tá rindo do que?

- Nada... - Uma risada escapou dos meus lábios, então a abracei com mais força. - Que barulho de água é esse?

- Quer descobrir? - Aly sabia como me deixar curioso. Ela inclinou a cabeça para traz e por ser pequenina perto de mim consegui olhá-la apenas inclinando a cabeça para frente. Ela é linda. Cada traço do rosto dela é perfeito. Parece uma boneca desenhada sob medida. Doce por fora, forte por dentro. 

- Nós vamos ou... - Me acordei do nosso devaneio compartilhado. 

- Ah claro. Desculpa. - Ela corou. 

Ela seguiu pela varanda que dava a volta pelo chalé e o som da água estava aumentando conforme andávamos. 

- O que tem aqui? - Tentei esticar o pescoço para enxergar mais a frente, mas não fazia muita diferença. 

- Você já vai descobrir seu impaciente. - Ela riu e virou a direita seguindo a varanda que parecia não ter fim. 

Então quando viramos meu cérebro não conseguiu acreditar no que estava vendo. Não era nada sobrenatural ou extraordinário, mas de alguma forma era incrivelmente lindo. O ruído que eu estava escutando era feito por uma pequena correnteza que dava para uma lagoa. A água era limpa e brilhava com alguns feixes de luz do sol que as nuvens cinzas deixavam escapar. 

- É muito fundo? - Perguntei olhando para dentro da lagoa.

- Não muito. Essa parte é bem segura, só fica mais perigoso perto das pedras. - Ela apontou para a borda perto da correnteza.

Olhei para ela e sorri com segundas intenções. 

- Não. Eu conheço esse sorriso. É o mesmo sorriso que você fazia quando tentava pegar os biscoitos que a sua mãe colocava em cima da geladeira para você não comer antes do almoço. - Cai na gargalhada. 

Tirei meus tênis, meu casaco e entreguei a Alison, depois tirei a blusa e coloquei na cerca que separava a varanda da água. Mirei onde deveria mergulhar e pulei da cerca até a lagoa. 

A água estava fria, mas fez bem ao meu corpo. Fiquei o tempo que pude debaixo d'água, mas meus pulmões começaram a clamar por ar. Subi até a superfici e procurei Aly na varanda. 

- Venha! A água está ótima! 

- Mas está frio... 

- Por favor... Você vai gostar. 

Ela suspirou, colocou o casaco que estava em suas mãos na cerca e começou a tirar os sapatos. 

VendettaWhere stories live. Discover now