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Anna Vitória

Depois do dia longo de trabalho, desço no ponto mais próximo da minha casa e quando já estou a caminho de casa, lembro que tenho que buscar Cauanã ainda no curso de teatro. Não confio em deixar ela vir sozinha não, Rocinha tem muito homem que não respeita as leis da favela e fazem maldade mesmo com meninas da idade dela, porque sabe que a criança vai ficar traumatizada e não contar nada.

Eu nem gosto muito de subir lá, moro aqui praticamente a 3 anos e subi pouquíssimas vezes. Também mal tinha tempo pra comer, quem dirá subir favela pra bater perna. As vezes que eu subi foi porquê Sabrina insistiu muito e também a maioria foi aniversário dela, ou de alguém próximo a mim da família dela, mas mesmo assim nem gosto, sabe? Tenho um medo danado de sair tiroteio do nada ou algum bandido cismar comigo.

Se eu vejo um menino de fuzil já fico logo nervosa, morro de medo de subir a Rocinha e me confundirem com X9 ou algo do tipo, tenho uma adolescente pra tomar conta e não posso morrer, tenho muito amor a minha vida. Não gosto nem que Cauanã suba lá, mas não temos muita escolha já que a escola dela fica lá e o curso de teatro também, graças a Deus os bandidos daqui pelo que Sabrina diz são muito tranquilos e o dono sempre faz o que o sistema não faz pela comunidade.

Distribui cestas todo mês para os moradores, sempre fazem festas para as crianças, construíram uma ong com vários projetos legais para as crianças, vive tendo festivais aqui dentro que eles fazem questão de bancar tudo. Nunca fui, mas sempre deixo Cauanã ir com Sabrina e o marido dela, que é uma pessoa maravilhosa. Conheci ele tem uns 2 anos quando ela me apresentou, garoto maravilhoso, gosto muito do meu cunhado.

Pablo vive vindo aqui em casa com minha amiga e sempre quando vem traz um agrado pra mim, da última vez ele trouxe um pote de açaí, nem preciso dizer que amei ele mais ainda, né? Mas também ele não faz mais que a obrigação dele, que? Já segurei foi muita vela pra esses dois na época que eles só ficavam e Sabrina vinha aqui pra casa ficar com ele, já que a mãe dela não aceitava de jeito nenhum no começo. Sabrina fez foi minha casa de motel com Pablo, então digo e repito, ele não faz mais que a obrigação dele de me mimar com comida, eu hein.

Eu sempre busco Cauanã na entrada, já que ela desce com uma amiguinha que mora na mesma rua que a gente e eu não preciso subir esse morrão todo, mas estranho quando chego na entrada e não vejo nenhum sinal dela. Espero por uns 15 minutos e nada da garota, já começo a ficar logo preocupada com o que possa ter acontecido com ela quando ouço uma barulheira de moto se aproximando, parecendo carriata mesmo. Olho na direção que vem as motos quando vejo 3 garotos montados, cada um em uma moto diferente e um fuzil atravessado nas costas vindo na minha direção.

Fudeu, vão me matar e eu nem fiz nada.

As motos param perto de mim e eu suspiro aliviada quando pelo menos reconheço um deles agora que tá mais perto. Encaro Neguinho a minha frente que abre um sorriso Colgate pra cima de mim antes de me puxar pra um abraço, não correspondo ao seu abraço e bato na cabeça do filho da puta pelo susto.

Anna: Seu filho da puta, quase me matou de susto seu porra, achei que tavam vindo pra me matar, já ia perguntar o que eu fiz se mal saio de casa!- Falo colocando as mãos na cintura fazendo careta e ele ri da minha cara, palhaço do caralho!

Neguinho: Sabia que tu ia ficar com medo, nunca vi cunhada mais medrosa porra, vai virar macho nunca?- Eu mando dedo pra ele revirando os olhos. Passo o olhar pelos meninos na moto e avisto um até que bonitinho menina, uma gracinha ele com aquela carinha de bandido e o cabelinho de reflexo, bem do jeito que eu gosto. Volto minha atenção pro preto safado a minha frente e me lembro do porquê estou aqui.

Anna: Tu viu Cauanã por aí não? Garota sumiu cara, tô preocupada com ela, ela não é de se atrasar.- Neguinho desvia o olhar coçando a nuca.- Cunhado do céu, que merda que aconteceu?

Destino Traçado- nova versãoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora