Capítulo 12

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Eles não tinham morrido nem com uma avalanche! O que faríamos para derrota-los agora? Derrubaríamos o palácio?!

No tempo que levei para assimilar a presença de Shan Yu e sacar minha espada, os hunos escondidos no interior do dragão rasgaram sua fantasia e me derrubaram. Eram maiores, em maior número, mais fortes e quando dei por mim já tinham levado o imperador e trancado as pesadas e gigantescas portas do palácio.

Reagrupei meus homens em meio à confusão para que tentássemos arromba-las já que abri-las sozinho se mostrou impossível.

— Peguem as estátuas! — ordenei apontando para as grandes colunas ornamentadas que enfeitavam o palácio. Levamos mais tempo do que pretendíamos para tombá-las, mas logo as estávamos usando como aríete. Seu peso, no entanto, nos exauria e tirava velocidade. Quando conseguíamos reunir força suficiente, perdíamos impulso e a porta assim nunca se rompia. Nunca chegaríamos ao alto do palácio nesse ritmo. Nenhuma ideia me vinha à cabeça, nenhuma solução mágica e maluca tipo causar uma avalanche...

Um assovio cortou nossa concentração e como que invocada lá estava ela.

— Homens! — ela anunciou toda serelepe como se não estivéssemos sendo atacados de novo pelos hunos. — Tive uma ideia!

Assisti impassível a meus homens se entreolharem e imediatamente soltarem o aríete para seguir Mulan, deixando-me para trás, abandonando meu plano.

Bem, pelo menos agora vimos quem realmente manda... É até possível entender porque, apesar de ser o general, meu pai sempre obedeceu minha mãe.

Eu soltei a estátua e não me orgulho em admitir que fiquei longos e indispensáveis minutos andando de um lado para o outro, dividido entre o orgulho e a vontade. Quando finalmente desisti de tentar resistir, sequer sabia onde Mulan havia ido com meus homens e gastei mais tempo até encontra-la nos fundos do palácio, junto às colunas principais.

Minha primeira pergunta era: Onde ela tinha encontrado vestidos?

Mas era uma pergunta irrelevante.

Agora, como ela tinha conseguido fazer com que meus soldados se enfiassem nesses vestidos era outra história. Mais tarde eu teria que questionar. No momento eu apenas tomei coragem e toquei seu ombro, me colocando a sua disposição.

Vestidos e maquiagem a parte, Mulan e seu exército estavam se preparando para escalar as colunas até o alto do palácio, lembrando-me do exercício que eu mesmo criara quando, durante o treinamento, os mandara buscar a flecha no alto do poste.

Dispensei o vestido, mas usei minha capa para me dar apoio e subir com eles.

— Este é o plano — ela anunciou quando tínhamos entrado pela varanda e observávamos a porta que levava aos aposentos particulares do imperador sendo guardada por um grupo de hunos. — vocês irão seduzi-los. Atuem como se fossem mulheres. Vamos, me mostrem o que sabem fazer.

— Coloquem o leque na frente do rosto. E deem risadinhas. — sugeri, recostado na parede assistindo-os. Os homens me olharam como se uma segunda cabeça tivesse brotado em meu ombro.

Mulan sorriu.

— Eu tenho uma irmã. — me senti impelido a explicar. — Ela está na idade de casar. Fica agindo assim o tempo todo. Principalmente quando vai a casamenteira.

Mulan rolou os olhos.

— Não me lembre dessa experiência. Foi um desastre.

— Ora, não diga. Não conseguiu achar alguém com quem casar? — na minha mente eu estava cantarolando a infame música que eles tinham criado, mas aparentemente só estava conseguindo perder o respeito de meus soldados. Mulan suspirou.

— Eu coloquei fogo na casamenteira.

— Não me surpreende.

— Sou um desastre enquanto filha.

— Mas é um ótimo soldado. — respondi antes que conseguisse me controlar, orgulhoso dela. Nós nos encaramos de verdade pela primeira vez desde o encontro na neve, desta vez sem disfarces. Ela ruborizou e desviou o olhar e eu me senti ligeiramente mais no controle da situação, embora ainda não exatamente sendo o capitão que eu era normalmente. Mulan pigarreou — Voltando ao plano, no momento certo os imobilizamos e Shang sobe para salvar o imperador. Quando tivermos tudo sob controle aqui, subimos para ajudar. Shang, tudo bem por você? — assenti e ela se inclinou para espiar pelo corredor mais uma vez, sem perceber nesse meio tempo o olhar inquiridor que os demais homens me lançaram quando ela decidiu abandonar o uso dos termos "comandante", "capitão", "senhor" e qualquer outra nomenclatura ou título junto de meu nome.

Alguém ainda tinha duvidas de que eu não estava mais comandando ela? Ou praticamente qualquer coisa desde a avalanche?

— Muito bem, — ela se voltou para nós — alguma pergunta?

— Este vestido me engorda? — perguntou Yao, testando sua voz de flerte. Mulan deu um tapa no traseiro dele e Yao resmungou como uma cortesã. Esperei que meu olhar refletisse o que exatamente eu pensava daquilo.

... E pensar que este mesmo grupo no primeiro dia queria bater em Ping.

O grupo saiu de trás da parede rindo baixinho, balançando leques e tentando rebolar. Não sei se estavam seduzindo alguém, mas no mínimo estavam deixando os hunos curiosos. Não que eles fossem muito bonitos e pudessem fazer exigências, mas se Mulan quisesse ela era a que tinha real chance de seduzi-los... Porém, ela não tinha claramente vocação alguma para ser mulher, pensei rindo. Ela era um soldado de vestido, mais do que meus próprios homens disfarçados. Ela só agia mais naturalmente, mas não sabia ser uma cortesã. Eu sequer conseguia vê-la flertando!

O que ela diria?

Eu seguro e você bate?

Oh céus.

Ela estava flertando comigo aquele dia!

Ping estava flertando comigo. Eu tinha achado estranho, mas Ping era estranho mesmo, então tinha registrado aquele momento como um ato de camaradagem.

Eu te acho um ótimo comandante.

A forma como Ping sempre estava pairando ao meu redor, mesmo quando eu era duro com ele. Sempre observando, consolando. Cuidando. Tantas coisas óbvias, se eu tivesse prestando atenção... Mas, mais uma vez, será que no fundo eu já não sabia?

Enquanto eu me martirizava com isso, Lin deixou a maçã que usava como busto cair e rolar a seus pés. Escondi o rosto entre as mãos. A farsa não tinha durado nem cinco minutos.

Mas Mulan era mais rápida.

Imperceptivelmente ela assentiu para o grupo e um instante depois os hunos estavam sendo atacados por um grupo de cortesãs malucas com frutas dentro da roupa. 

Li ShangOnde histórias criam vida. Descubra agora