Prólogo.

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Heloísa.

10 anos atrás...

Eu sempre fui uma garota boazinha. Sempre fui recatada, educada e tirei as melhores notas na escola. Papai nunca teve o que reclamar da sua bambina. Mas tudo mudou quando eu completei oito anos e descobri que estava predestinada a me casar com algum homem da máfia. É uma maldita tradição que meu pai não quis quebrar. Eu me casaria aos dezoito e então viveria para procriar.

Eu sei que viveria para procriar. Minha irmã mais velha casou-se há dois anos e já tem dois bambinos. Ela é uma ótima dona de casa, mas sei que não é feliz. Eu sempre vejo os hematomas em sua pele e várias vezes a peguei chorando sozinha.

Acredito que por conta disso minha mãe abandonou tudo e foi embora. Nos deixou sob os cuidados do sr. Pietro Bellini, o meu pai. Ele é uma pessoa muito séria e nunca demonstrou qualquer tipo de carinho conosco. Somos cinco ao total. Duas mulheres e três homens.

Fora da máfia italiana, meu pai é um grande empresário e alguém muito poderoso. Nós temos uma vida de classe alta e nunca nos faltou nada.

Apesar da família Bellini ser muito rica, não há amor, compaixão ou qualquer forma de carinho dentre os familiares. É horrível viver nessa casa e presenciar as negociações da máfia, as prostitutas que sempre estão na sala de estar e as reuniões com os homens de terno armados até os dentes.

Mesmo com oito anos, eu já entendia muito sobre a máfia e sabia que não podia fazer parte da organização criminosa. Eu apenas iria me casar com algum dos mafiosos e iria embora. Iria viver para ser um saco de pancadas e teria vários filhos. Esse é o meu destino final.

─ Heloísa? ─ escuto a voz do meu pai e no mesmo instante me endireito na cama. Eu cheguei da escola há pouco tempo e estava olhando o jardim pela janela. Está nevando e eu sempre adorei ver os flocos de neve caindo no parapeito da minha janela.

Ele entra em meu quarto acompanhado de uma mulher de cabelos vermelhos. Como sempre, ele está dentro do seu terno preto e carrega em seu semblante um olhar assustador. Papai sabe ser mal quando quer. Às vezes que ele me castigou foram tenebrosas, até hoje carrego comigo as marcas do chicote. Por isso sempre fiz de tudo para agradar o meu papai.

─ Essa é Kristen, sua nova cuidadora ─ ele apresenta a mulher que carrega um chicote em suas mãos. Ela não tem cara de ser boazinha e parece sentir ódio de mim. ─ Como sabe, seu marido foi escolhido ontem à noite. Ele é filho de Héctor Vacchiano. Você terá dez anos para aprender tudo o que uma esposa perfeita precisa saber. Não frequentará mais a escola convencional, terá uma professora particular em casa. Aprenderá a cozinhar, costurar e falar o máximo de idiomas possíveis. Não sairá mais de casa e a partir de hoje ficará trancada em seu quarto.

Ele diz tudo isso sem esboçar qualquer tipo de sentimento. Eu sinto as lágrimas deslizando por minha bochecha e não consigo segurar o choro entalado em minha garganta. Eu choro como um bebê.

─ Papai... eu não quero me casar ─ digo dentre soluços. ─ Por favor.

Eu não quero que ele decida a minha vida e que muito menos me deixe a mercê de um mafioso. Eu quero fazer coisas diferentes e não casar com alguém que eu não amo. Eu quero me apaixonar, quero estudar fora, quero arranjar um emprego e me casar com alguém que eu ame de verdade. Nada de casamento arranjado.

─ Essa não é uma escolha sua, querida ─ ele diz de forma ríspida. ─ Você deverá obedecer a senhorita Kristen ou então será castigada. Faça tudo conforme o planejado e não terá problemas.

Eu engulo o choro e concordo com a cabeça. Logo papai me deixa sozinho com a tal Kristen. A vejo trancar a porta atrás de si e me olhar com seus olhos verdes maldosos. Ela não gosta de mim e tenho certeza que irei sofrer nas mãos dela.

─ E então, bambina ─ ela segura firme o chicote nas mãos. ─ Pronta para começar a sua preparação? Temos dez longos anos pela frente. Juntinhas... só eu e você.

Ela dá um sorriso maldoso e se aproxima. Suas unhas são grandes e afiadas. Unhas de bruxa. Sinto suas unhas rasgando a pele do meu braço e deixo que várias lágrimas deslizem pelo o meu rosto.

Por que eu tinha que sofrer tanto?

Mas sei que é apenas uma preparação para o pior... que está por vir. Eu devo me acostumar com a dor e os castigos. Após o casamento, terei somente isso em minha vida. Dor, castigos e humilhações. Eu sei que jamais serei feliz ao lado do meu marido.

─ Primeira lição: não derrame suas lágrimas sem motivos ─ ela segura em meu queixo e me faz erguer a cabeça. ─ Você não pode chorar por qualquer besteira. Aprenda a ser forte e engula o choro sempre que necessário. Quando se casar, o seu marido viverá a repreendendo por tudo e você também será castigada... e suas bonitinhas lágrimas não irão fazê-lo parar.

Eu fungo e olho dentro dos olhos dela. Não consigo ver nenhum sentimento bom. Kristen é malvada e tenho certeza que ela irá me machucar muito ao longo desses dez anos.

Mas esse é o preço por fazer parte da máfia italiana... infelizmente, eu não tenho escolhas. Ou eu casava ou era morta. Para falar a verdade... eu prefiro ser morta.

E aos oito anos meu pesadelo teve início... apenas uma amostra grátis do quão malvado o mundo pode ser com alguém.

Eu estava predestinada a sofrer.

Inimigos de Sangue [DEGUSTAÇÃO]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora