12h15

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Eu me sentia quente de tanto ser olhado, e sabia exatamente quem estava me encarando.

Ele, é claro. O primo mais estúpido e grosso do mundo. Ficar confinado por quase um mês na mesma casa que ele todos os anos era uma prova de resistência de um reality show que eu não queria participar, mas lá estava eu de novo. Quando o assunto é família, na maioria das vezes você fica ou sem escolha, ou sem jeito de recusar, e essa era a casa de praia onde meus parentes e eu sempre nos reuníamos durante as férias, desde quando eu era criança.

E desde quando ele era criança, também. Nunca o perdoei por arrancar a cabeça daquele Max Steel. Quem meu boneco Ken iria beijar?!

Hoje, eu estava lavando a louça do café da manhã enquanto minha mãe e minha tia conversavam atrás de mim, na mesa da cozinha. A porta dava para os fundos da casa, um gramado amplo com uma amendoeira gigante. Ela criava a sombra perfeita, e debaixo dela estavam meu pai, meu tio, e meu avô. Minha avó e meus dois outros primos, filhos do meu tio que agora bebia com meu pai debaixo da árvore, tinham ido ao mercado, e os pais do pior primo do mundo tinham ido caminhar pela orla até a hora do almoço.

Andrei estava bebendo com meu pai e meu tio, sentado desleixado em uma cadeira de praia, as pernas abertas enquanto o frio da cerveja suava a lata, e de vez em quando pingava em seu peito descamisado.

Notei tudo isso quando, disfarçadamente (eu esperava que tivesse disfarçado), virei o rosto da pia até ele para confirmar que me encarava. Quando nossos olhos se encontraram, mirei minhas mãos ensaboadas de detergente de novo. Sem condições de dar moral para ele.

Quando minha tia conheceu seu atual marido, anos e anos atrás, Andrei veio de brinde como seu enteado. Seria mais um primo para completar o trio já existente na família, se ele não tivesse sido uma criança encapetada que se tornou um adulto antissocial. Ok, antissocial ele não era. Conversava até demais com meus tios, tias e avós, e até com meus outros primos também. Sempre os fazia rir com suas piadas baixas, adorava uma sacanagem. O problema, pelo visto, era comigo. A definição de antissocial, nesse caso, talvez fosse melhor explicada pelo quanto eu era anti-socializar com ele a qualquer custo.

Principalmente depois do que aconteceu naquela noite do ano passado, nas últimas férias em que estivemos juntos na casa. Nem no meu celular eu tive paz.

Balancei a cabeça para afastar a lembrança embaraçosa e aleatória.

Estava secando as mãos quando percebi o movimento vindo do quintal. Ai, ótimo, pensei, quando notei Andrei andando até a cozinha.

O problema com odiar alguém é que você não consegue não prestar atenção a quase todos os movimentos da pessoa. Parece coisa de gente apaixonada, e aí isso te faz odiar ainda mais. Estava nesse ciclo com meu primo há sei lá quantos anos.

Desliguei a torneira. Ele havia parado antes de atravessar a porta. Minha mãe e uma de minhas tias continuavam conversando distraídas, descascando alguma coisa em conjunto. Quando olhei para ele, estava petiscando alguma sobra do café da manhã que esqueceram de tirar da longa mesa de madeira que ficava na área antes do gramado.

Parecia que todo ano ele aparecia com uma tatuagem nova. A mais recente era uma em seu peito, uma cabeça de veado meio geométrica, o focinho e os chifres formados por triângulos e quadrados em formas desencontradas, mas que no fim das contas seguiam um design. Seus braços eram marcados por desenhos aleatórios, alguns de personagens famosos, e outros eram trechos estilizados do que pareciam ser letras de música ou poemas. Bem, não era culpa minha saber desse monte de tatuagens. Ele passava basicamente as férias inteiras sem camisa.

Percebi que seus petiscos eram morangos, e para o meu horror absoluto, ele olhou diretamente para mim enquanto comia mais um.

Suas bochechas estavam fundas enquanto praticamente chupava a pequena fruta até que somente o talo verde sobrasse. Ele passou a língua pelos lábios, impedindo que o suco doce escapasse, e sorriu para mim. O cara de pau sorriu, e era o sorriso debochado que eu já esperava dele depois de anos. Como se nada tivesse acontecido, como se ele não tivesse acabado de chupar uma morango enquanto me encarava sem piscar, finalmente passou pela porta e seguiu seu caminho para dentro de casa. Quando passou por mim, era como se eu nem estivesse ali.

Provavelmente estava indo se enfurnar no quarto onde dormia, no segundo andar, como sempre fazia. Maravilha, que ficasse por lá mesmo.

Segurando na borda da pia, percebi que meu peito estava agitado. As batidas do meu coração ecoavam até o começo de minha garganta, e... Ah, não. Isso marcado no short do meu pijama era um pau meia bomba?!

Silenciosamente, inspirei e expirei uma, duas, três vezes. Detestava me sentir traído pelo meu próprio corpo, que identificava o que gostava até mesmo quando eu não queria que ele identificasse nada!

Enquanto esperava a agitação - e outra coisa - abaixar, lembrei a mim mesmo o quanto não suportava aquele garoto.

Uma Noite Secreta com Meu PrimoWhere stories live. Discover now