05- O Convite

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- Cara, eu vou te matar, Cecília! - falei assim eu entrei em casa. - Ainda não acredito que tu fez isso!

- Bah Thali, liberte-se – disse, jogando-se no sofá.

- Eu não estou pronta para isso – eu disse baixinho.

- Thalita, senta aqui – chamou, tirando a mochila de cima do sofá e abrindo espaço para mim. - Eu sei que foi algo muito difícil, mas já faz dois anos. Tu precisa...

- Não! Não vem por favor – abaixei a cabeça. - Todo mundo fica dizendo que eu preciso superar, que eu preciso seguir em frente, mas não é assim que funciona! Não posso apagar tudo da minha memória ou fingir que está tudo bem, porque não está. Nunca esteve depois daquilo e nunca mais vai estar.

- Meu amor, presta atenção - minha prima falou devagar e pegou em minhas mãos. - Eu sei que não é nada fácil o que tu passou e és um processo muito doloroso, mas não podes deixar de viver tua vida.

- Eu estou vivendo... - mas ela me interrompeu.

- Está mesmo, Thalita? Porque tudo o que vi tu fazendo foi fugir.

- Como é que é? - perguntei, com as sobrancelhas franzidas.

- Sim. Desculpe-me te dizer, mas tu fugiu. Fugiu dos amigos que tinha aqui, fugiu da tua família, fugiu da tua vida no Brasil. Eu entendo que não conseguia suportar o que aconteceu, mas essa nunca foi a solução.

- Estás me julgando? - eu não precisava disso, não dela.

- Não! Só estou tentando te ajudar! - falou com a voz calma – Nunca conseguiu falar sobre esse assunto, sabe por quê? Pois ele ainda é uma ferida aberta no teu coração. Sempre evitou as ligações do Edu, da Mel e inclusive as minhas visto que isso te fazia lembrar da vida que tinhas deixado para trás, congelada em um momento que te causou um trauma tão grande que ainda hoje não consegues respirar direito quando pensas nele.

Senti minha garganta formar um nó. Ela estava certa. Eu nunca consegui falar pois esse assunto me doía demais. Eu não conseguia raciocinar direito toda vez que mencionavam o ocorrido. Tentaram nos primeiros meses, mas eu estava sempre tão mal ou desviava tanto das perguntas que resolveram deixar para lá, pensando que com o tempo tudo seria superado. Mas a realidade é que tinha aprendido a empurrar esse assunto tão fundo dentro da minha alma e a nunca me deixar ousar pensar nele que qualquer menção fazia meu mundo todo cair. Eu não conseguia porquê...

- Thali... - Cecília colocou a mão em meu ombro devagar - não foi tua culpa.

Finalmente desabei. Minha prima se aproximou mais e me abraçou, acariciando meus cabelos. Meu coração estava muito pequeno e doendo demais. Eu sentia um vazio enorme e minha garganta estava totalmente trancada.

O que ela tinha dito não era verdade. A culpa era minha sim. Nada daquilo teria acontecido se não fosse por mim. Por isso acabei fugindo. Não ia aguentar olhar para todos aqui e não lembrar do que aconteceu, do porquê todos estarem com os olhos menos brilhantes pois ele não estava mais aqui. Não conseguiria olhar para os meus amigos e tentar consolá-los sendo que nem eu conseguia me consolar. E não os queria tentando me animar também. Não dava. Por isso que os ignorei. Eu não era mais uma boa companhia para eles e não queria perdê-los por conta disso. Mas de uma outra forma, ainda assim, os perdi.

- O Edu e a Mel nunca mais vão falar comigo, não é? - sai do abraço e apoiei minhas mãos em minhas coxas, olhando para elas.

- Vão sim, só precisas dar um tempo – olhou para mim com calma. - Tu tem que lembrar que tua volta traz muitas lembranças.

- Eu não deveria ter voltado – falei, super baixo, mas ela ainda assim me escutou.

- Muito pelo contrário! - reagiu – Os três precisam enfrentar esse passado. Ele machuca tanto vocês que não tem como mensurar. Só tens que ir com calma. Assim como tu necessita desse tempo para processar tudo, eles também.

Apenas Um Acaso...?Where stories live. Discover now