story of a stupid guy

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Donald Way - capítulo 23

Uma vez eu ouvi num programa de entrevistas que “a vida trancada é uma sequência de domingos”. De certa forma eu concordo com essa afirmação, pois viver em confinamento, lidando com as mesmas pessoas e a mesma rotina todos os dias, torna tudo pacato e eu me vejo apático à realidade que me cerca. Todos os dias são iguais e viver não é mais a mesma coisa. A coisa mais incomum da minha rotina é não trabalhar aos domingos para participar do sagrado almoço em família.

É óbvio que antes da pandemia eu não tinha uma vida agitada, mas pequenas coisas como sair de casa para trabalhar, ter contato com meus colegas e sair para almoçar num final de semana já tornavam a minha rotina mais dinâmica.

Agora, os dias apenas se repetem.

É… talvez essa vida seja mesmo uma sequência de domingos.

Entretanto essa semana foi diferente. Esse domingo foi diferente. Muito diferente.

Hoje é sexta-feira, mas eu já posso afirmar que a minha semana foi totalmente atípica.

Veja bem, eu não costumo iniciar a minha semana recebendo broncas da minha mãe. Muito menos passar o restante da semana remoendo o que ela me disse, revivendo o passado, avaliando o presente e me questionando sobre o futuro.

Eu sei que provavelmente tomei muitas decisões erradas e minhas atitudes são bem questionáveis.

Minha mãe não iria falar todas aquelas coisas se eu não estivesse falhando terrivelmente como o filho que ela esperava que eu fosse e, eu não vou negar, isso me assusta e abala o meu ego.

E talvez eu devesse admitir que o pedido de Gerard para que eu finja que ele está morto e que a minha mãe renunciou a maternidade dela comigo, as duas coisas no mesmo dia, me machucou. Talvez muito mais do que eu quero acreditar.

Eu não sou de ferro e assistir desmoronar a relação que eu tenho com a minha família é algo que me deixa mal. Isto é inevitável, ainda mais considerando que provavelmente é tudo culpa minha.

Eu quero apoiar o Gerard, eu sei que ele está doente e que o quadro dele é sério. Eu realmente queria muito deixar todas as nossas divergências de lado para poder apoiá-lo. Isso teria poupado todo o estresse com Elena e o fato de que, aparentemente, Donna e Michael não querem olhar na minha cara.

Pois é, aqui em casa nós adotamos a política do "você não enche o meu saco e eu não encho o seu". Isso não é nada saudável, eu sei disso, mas ninguém parece estar disposto a comprar essa briga e iniciar uma discussão. Estamos com muitos problemas para nos preocupar com o que quer que esteja acontecendo com a nossa relação familiar.

É duro, mas é a realidade.

Aliás, eu nem consigo trabalhar direito ultimamente, pois é extremamente difícil me concentrar e esquecer dos meus problemas, como sempre fiz. De uma forma ou outra, a minha mente me sabota e eu me pego pensando sobre meus problemas e fantasmas.

Como é o caso de agora, considerando que eu deveria estar administrando os gastos da minha residência, quando na verdade, estou questionando minha conduta como pai.

É irrevogável constatar meus equívocos paternos, eles são muitos e eu tenho consciência disso.

E eu sei que para amenizar meus erros, é imprescindível que eu esteja ao lado de Gerard, o apoiando neste momento complexo, tanto que esse era o meu objetivo quando eu tentei participar daquela reunião no domingo. Naquele momento eu realmente estava disposto a demonstrar toda a minha preocupação com Gerard e esquecer as nossas discordâncias por um tempo, mas é muito difícil para mim lidar com o relacionamento dele com Frank. Muito difícil mesmo e quando eu ouvi que foi aquela criatura que infectou o meu filho, algo dentro de mim borbulhou em ódio e revolta. Eu perdi o controle.

Quarantine Limits  ✱  ғʀᴇʀᴀʀᴅOnde histórias criam vida. Descubra agora