VINTE

68 6 0
                                    

Eu não poderia ir à casa de praia mesmo se quisesse. São nove da noite.

Mas isso não me impediu de ir até à praia mais próxima.

De repente eu entendi o poema que meu pai deixou no banheiro antes.

"A graciosidade das ondas está em como se separam,

mesmo estando juntas, quebram-se, montam.

me moldo tipo onda, ruindo e me soldando,

acabo por ter graciosidade tipo onda, separando e montando"

Separando e montando. Tipo onda.

Os postes davam luzes suficientes no calçadão mas isso não me deixava menos nervoso. Continuei andando, alternando em olhar para trás e para os lados. Contei somente três pessoas na rua; duas mulheres que conversavam e usavam leggings e um homem que estava fumando mas que acabou indo embora depois de jogar o cigarro no chão. Larguei a bicicleta e me aproximei do mar e tirei os chinelos, meu corpo inteiro se arrepiou e a sensação de a água gelada me tocando foi magnifica. Fiquei lá por mais tempo que achei que ficaria. Mas B ainda não havia chegado e eu estava ficando com frio.

Marcamos, é verdade. Foi imprudente, foi uma loucura sem pé nem cabeça, mas acho que eu precisava fazer algo assim para me distrair do que estava sentindo. Não falei com mais ninguém, mas deixei um bilhete na minha cama... eu deveria ter sido mais especifico em algumas partes, só não sabia como contar que, por conta própria, resolvi me encontrar com um garoto que não conheço, que nunca vi na vida.

B concordou depois de um tempo, ficou hesitante no começo então eu disse que poderíamos fazer dar certo. —eu não precisava saber quem ele era, só queria que ele estivesse aqui. Comigo. Durante minha vinda pedalando, me perguntei porque não escolhi a opção mais obvia. Meu namorado. Nem mesmo quis encontrar resposta para essa pergunta.

Eu queria que uma solução brilhasse nas estrelas para mim. Uma solução para ajudar aos meus pais e a mim. Eu queria que as soluções se aparecessem com tanta facilidade quanto os problemas.

Nove e meia. Espero que meu pai não decida passar no meu quarto hoje.

Dez horas e já estou cansado de esperar. Meu peito aperta e me sinto idiota completo. Limpo-me da areia e caminho para a água mais uma vez, uma última vez.

É então que firmo meus pés na areia molhadas, que abre espaço para que meus dedos afundem pouco a pouco. E é então que ouço a voz dele atrás de mim; rouca, distante e mesmo assim bem ali atrás de mim.

— Estou aqui.

Minhas pernas ficam bambas.

Lembro-me da única que criamos: não vermos um ao outro.

Estou de costas, ele vê minha nuca e eu, o mar que se perde na escuridão que parece infinita. Respiro fundo duas vezes e penso no que falar.

— Achei que não viria. Benja?

— After. — O modo como falou meu apelido, se demorando no "ter" me fez prender um sorriso.

Não achei que alguém poderia dizer meu apelido de uma forma tão fofa.

É difícil conseguir me concentrar. O vento ruge nos meus ouvidos.

— B... Não sei o que fazer.

— O que quer dizer?

— Eu acho que as coisas estão ruindo. Estou com ódio. Você é religioso?

— Sinceramente... Não.

— Estou com ódio de Deus. Não sei a quem mais culpar. Talvez ao presidente do Brasil, talvez a mim mesmo. Como vão as coisas com seu pai?

Agora ou Nunca (Romance Gay)Where stories live. Discover now