TRINTA E CINCO

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— Você dormiu muito, hein!

Eu queria ter dormido mais.

Tia Helena coloca um enorme prato de comida na minha frente e ordena que eu coma. Mas antes de fazer isso acabei notando os olhos vermelhos dela e as partes escuras embaixo. Quando me olhei no espelho há cinco minutos eu também notei essas mesmas coisas em mim. Parecia que meu corpo era apenas uma casca, não estou aqui de verdade, entende? Minha alma se apossou do efeito do sono e agora quer dormir para sempre.

Eu não tinha coragem de dizer isso a ninguém, porque parecia uma daquelas coisas que só servem para te fazer ter um palco, e eu não quero chamar a atenção de ninguém, estou bem assim.

Quando termino de comer minha tia avisa que meu celular tocou um bocado de vezes. Senti minha cabeça latejar e meu corpo curvar, cansado. Encontrei força de vontade o suficiente para ir até o quarto, deixar a porta aberta, pegar o celular e ligar para Dan.

Assim que ele atendeu eu senti a culpa me cobrir como um lençol de uma tonelada.

— Alô? After? — E de alguma forma o meu nome na boca dele pareceu uma maldição.

Não soube como começar. Não soube dizer o nome dele porque quando beijei Benja também esqueci o nome dele.

"Aconteceu alguma coisa?"

Começo a contar até dez e digo a primeira coisa que me vem à cabeça.

"Eu fiz uma coisa horrível"

Então começo a minha narrativa culposa. Dan não me interrompeu, não emitiu nem um ruído que indicasse o que sentia e isso acabou me preocupando ainda mais. Até que, por fim, terminei. Eu tive que dizer que terminei.

"After..."

"Eu sei que fiz uma coisa ruim. Eu traí você, Dan, mas eu... não. Não vou inventar uma desculpa. Só posso me desculpar"

"Joyce já me contou. Ela contou a todo mundo"

Agarrei o celular com força e quis jogá-lo longe. Certo, não vou disfarçar, quero jogá-lo na cabeça de Joyce.

"Ela disse que vocês estavam se agarrando perto da quadra. Esperaram todo mundo sair pra finalmente fazerem isso. Ela disse que...

"Não é verdade! A verdade está no que eu disse!"

"E como eu posso confiar nisso, Alison?" Disse ele, com raiva. Mas dava para ver que estava tentando se controlar. "Eu posso acreditar no que você diz? Posso?"

Mesmo não precisando, eu respondi.

"Nao".

E fiquei em silêncio para ouvir o que Dan tinha a dizer. Mas ele não disse absolutamente nada e acabamos ficando nessa brincadeira de quem fica mais tempo em silêncio. Sinto raiva de mim porque não consigo me manter calado por tanto tempo assim.

— É agora que eu digo que sou um péssimo namorado?

— Não. Mas é agora que terminamos, você sabe, não sabe?

Sim. Mas saber não ajudou a diminuir a dor que senti agora. Saber tem um lado ruim, de qualquer jeito, às vezes é melhor não saber de certas coisas se eu quiser preservar minha sanidade.

Era por esse momento que eu estava esperando, até mesmo sonhei — literalmente — com ele. Dan dizendo que tínhamos que terminar, que não havia outra opção; assim como saber, sonhar machucava.

— Sei. Sinto muito ter sido um namorado horrível.

— Alison?

— Sim? — Havia um tom infantil de esperança na minha voz. Ouvi-la ecoar do outro lado da linha me fez ficar horrorizado.

Agora ou Nunca (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora