2 - A espera de uma noticia

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|A espera de uma notícia

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|A espera de uma notícia

"Você deve pensar que sou estúpido
Você deve pensar que eu sou um tolo
Você deve pensar que sou novo nisso
Mas eu já vi isso tudo antes "

Too Good At Goodbyes – Sam Smith

Maya voltou para casa quase desmaiando, com o suor preso em seu pescoço, fazendo com que se sentisse cada vez mais agoniada.
As férias de verão haviam acabado a poucos dias, mas o calor intenso no Arizona parecia não ter fim.
O ano letivo nos Estados Unidos começava no meio do ano, logo após as férias de verão, entre julho e setembro, isso dependia do colégio ou estado.
Jogou a mochila em seu quarto e foi para a sala. Um cômodo com paredes que um dia foram brancas, sofá acinzentado, um balcão tradicional de mármore dividia a sala da cozinha, e atrás dele haviam quatro bancos altos e redondos onde costumava se sentar para o café.
Um segundo depois pôde ouvir o ranger alto da porta ao se abrir, mas nem se deu ao trabalho de ver quem acabara de entrar, seus olhos estavam fixos no telefone vermelho em cima da pequena mesa de cabeceira, o qual se mantinha silencioso.
Antes de decidir perguntar quem havia chegado, engoliu em seco ao sentir um aroma forte exalando pelo ambiente. Não foi necessário se virar para saber de onde vinha o odor alcoólico ardente e o fedor por falta de higiene básica.
Seu padrasto tentava se manter em pé, mas se jogou no sofá assim que chegou perto o suficiente.

— Você está fedendo, de novo. — Maya revirou os olhos, respirando profundamente, pelo cansaço físico e mental. — O telefone tocou quando estava aqui? — perguntou pacientemente.
Os olhos dele eram vazios, como uma TV desligada no século vinte, o estado do homem era deplorável devido ao vício contínuo em bebidas e noites acordado jogando em bares locais.

— Não interessa. — respondeu rispidamente.

— É a minha mãe! Como não interessa? — se exaltou, perdendo a esperança de receber uma resposta significativa. Procurava imaginar se em algum momento seu padrasto teria mesmo se importado com o estado da esposa.

— Olha lá como fala comigo, garota! — gritou, erguendo as costas com dificuldade.

— Te fiz uma pergunta simples, você que não soube responder. Eu só quero saber se ela está bem. — respirou fundo novamente, o peito se enchendo de ar e esvaziando com calma, tentando manter a sanidade entre os próprios pensamentos confusos e incógnitos.
Mas ele não a escutava mais, caiu no sono em cima do sofá, como se tudo que precisasse fosse um cochilo tardio.

— Oi, Maya. — Alan, seu irmão mais velho, havia acabado de chegar segurando uma pequena sacola de plástico em uma das mãos e o capacete que usava enquanto pilotava a moto na outra, colocando ambos no balcão.
Mesmo com aquele calor, ele continuava usando uma jaqueta e luvas de couro sintético para andar de moto.
Se bem que as luvas tinham mais utilidade, já que impediam de deixar suas digitais por onde fosse.

— Oi.

— Ligaram hoje? — questionou sem a olhar diretamente.

A mãe de Maya, Alyce Ross, tinha câncer cerebral, um tumor maligno considerado inoperável, e teve uma piora drástica por volta de seis meses atrás. Após a quimioterapia e radioterapia acreditavam que não havia muito mais o que fazer, porém um dos médicos que ajudava em seu tratamento afirmou estarem fazendo novas pesquisas e que uma delas poderia ajudar a tornar o caso dela operável. Desde então, ficou internada no hospital em observação. Mas não estava funcionando, e lhe deram no máximo alguns meses de vida, com a opção de ir para casa ou permanecer no hospital. De acordo com Alyce, decidiu não voltar para casa para que seus filhos não a vissem naquele estado todos os dias, não conseguia falar tanto como antes, nem comer sozinha, muito menos fazer esforços. Os dois concordaram, pois não queriam que a mãe se aborrecesse com Clark, o padrasto, reclamando diariamente.
Ela chegava todos os dias do colégio e tentava fazer todas as tarefas próxima ao telefone, na esperança de ligarem lhe dando uma boa notícia sobre sua mãe, já que o médico que tratava dela prometera fazer um telefonema caso qualquer coisa, por menor que fosse, acontecesse.
Já Alan chegava cada dia em um horário diferente, por motivos que nem de longe seriam taxados como bons, mas o garoto não teve opção.

— Não sei, cheguei agora a pouco. — abriu um sorriso, fofo e provocativo.

As pessoas que conheciam a família costumavam dizer que a marca dos Ross era o sorriso, isso porque ao mesmo tempo que os unia, também os separavam. Mãe e filha com lábios fofos e provocativos, enquanto pai e filho com covinhas rasas e simpáticas, ambos poderiam ser usados para manipulação, incrivelmente capazes de persuadir o mais implicante dos homens.
Ninguém imaginaria o que os donos de uma aparência tão inofensiva seriam capazes de fazer.

— Mas a sua aula acabou faz uma hora e meia, por que só chegou agora? — a mirou tranquilamente, adquirindo uma breve curiosidade em seu rosto.

— Eu fiquei fazendo lição até tarde. — desviou rápido de seu campo de visão, em uma tentativa falha de tentar enganá-lo.

— Ah e deixe-me adivinhar, também foi no grupo de estudos? Como minha irmã virou estudiosa de repente. — disse em um tom sarcástico.

— Sim, estou me dedicando.

— Acho particularmente engraçado o modo como acha que consegue mentir para mim. — se esquivou da bancada, encostando na parede, sem nem ao menos olhar para o padrasto no sofá. Cruzou os braços, marcando a jaqueta de couro sintético que vestia, erguendo uma sobrancelha de forma especulativa em direção a Maya, que tentava andar disfarçadamente até o corredor, onde ficava seu quarto. — Ei, volte aqui! Tudo bem, onde você realmente...

O som estridente do telefone o interrompeu.

O que os dois não sabiam, é que aquela ligação daria início para uma vida que nenhum deles seria capaz de imaginar.
Tudo viraria cinzas, e as únicas escolhas seriam deixar as chamas do inferno queimar o que conheciam, ou derrotar aquele nomeado como rei do submundo.

Runner's Soul - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora