Festa Aracnídea

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Minhas noites em casa têm sido ocupadas, na maior parte do tempo, por tentar não pensar no fato de que Miguel Sosa, inconsequente do jeito que é – é o Homem-Aranha, e também por tentar terminar o desenho de seu traje sentado por horas na minha escrivaninha.

Estou de pijamas azul claro, com "X-Men" escrito em amarelo na estampa da camisa (obra dos meus pais) e sinceramente nem lembro quando o coloquei pois só lembro de chegar em casa e começar a desenhar.

Na verdade, o desenho em si está pronto, mas não tenho certeza se essas cores que eu planejei vão servir, então perco a maior parte do tempo redesenhando os rascunhos e substituindo as cores de lugar.

Quero fazer algo marcante. Não é só porque Miguel é dissimulado que eu vou fazer o seu traje de qualquer jeito.

Não. Precisa ser perfeito.

Uma batida na janela tira completamente meu foco. 

Quando me viro para ela, lá está ele, Miguel. Agachado, vestindo seu traje inteiro e acenando enquanto esconde a outra mão.

Quando? Porquê? 

Como ele sabe onde eu moro?

Em questão de milésimos um cenário roda na minha cabeça: meus pais, abrindo a janela do seu quarto, que é ao lado do meu e dando de cara com o Homem-Aranha saudando nosso apartamento.

Minhas pernas tremem tentando sair rapidamente da cadeira e me fazem esbarrar em tudo no caminho durante a corrida até o parapeito da janela. Abro o vidro eufórico e sem nem pensar muito, puxo o Homem-Aranha para dentro do quarto nos fazendo cair desajeitados um em cima do outro.

Estamos nos encarando à alguns segundos na mesma posição até que minha mãe grita de outro cômodo.

— Aaron?! O que foi isso?! — passos podem ser ouvidos com seus berros.

— Não mãe! Não foi nada! Derrubei o notebook, não precisa vir aqui! — grito de volta, contendo o desespero no tom da voz.

Minha mãe não responde, mas consigo ouvir ela voltando de onde veio.

Miguel tira a máscara, ainda em cima de mim e diz, sussurrando:

— Surpresa! — ele sorri.

Seu corpo está encaixado demais em cima do meu. Digamos que não são só nossos rostos que quase se encostam por milímetros.

Um donut perdido rola ao nosso lado.

— O que é isso?! — pergunto, fechando a cara.

— Surpresa? — Miguel repete, mas derretendo seu sorriso.

Nos afastamos ao mesmo tempo, como aranhas assustadas.

Uma festa de donuts jogados no chão colorem o piso de madeira junto de uma caixa rosa escrito "Dommu Donuts".

Eu fiz isso?! Espera, ele trouxe isso e eu derrubei?

Minha revolta se transforma em constrangimento. Me sento no chão, de joelhos, mergulhado em vergonha e começo imediatamente a juntar as rosquinhas açucaradas. Miguel faz o mesmo.

— Me desculpa, eu não sabia que você tinha trazido isso. -— digo, escondendo o rosto ao abaixar a cabeça.

— Nah, que isso, eu que devo desculpas. Depois de te dar aquele susto no terraço no outro dia, acho que isso é o mínimo a se fazer. — não sei se ele está olhando pra mim, mas a forma como disse me faz pensar que sim.

Juntamos os últimos donuts e tentamos levantar juntos com a caixa.

— Haha! É claro. É pra você, pode ficar. — ele desiste do pacote nas minhas mãos enquanto coça a parte de trás da cabeça.

Entre Fios e TeiasWhere stories live. Discover now