Capítulo Cinco

152 16 0
                                    

Quando desci da picape, o sol já estava nascendo. Era uma visão linda, de fato, os raios de sol surgindo acima da copa das árvores, iluminando um céu azul com poucas nuvens. Era um dia perfeito para relaxar e estimular a vitamina D. - Na mochila em minhas costas, alguns dos meus exemplares preferidos da literatura romântica estavam amontoados para o meu divertimento.
Nossa, fazia tanto tempo que eu não os lia. Desde que Edward havia ido embora, foi o que me dei conta ao organizar minhas coisas na véspera. Não sei se era por causa do clima, mas voltar a ler o clássico não parecia me incomodar como antes.
Demorei mais alguns minutos admirando a grande muralha verde à minha frente. - Era um lugar bem conhecido: a trilha que levava à campina, nosso paraíso secreto. Algo fervilhar dentro de mim; um misto de ansiedade, satisfação e paz. Meu Deus! Como era bom sentir paz. Fazia o quê? Anos que eu não sabia o que era aquela sensação.
Respirando fundo a brisa fresca que soprava, avancei para a mata fechada, ignorando a trilha, como eu sei que Edward faria.
Foram horas de caminhada alegre. Os galhos caídos e as raízes expostas foram fáceis de evitar. Meus pés haviam se tornando rápidos e precisos. A vida da floresta ao meu redor florescia à medida que o sol iluminava. Vi um grupo de formigas escalando uma pedra, carregando consigo alimento para o ninho. Os esquilos e outros pequenos roedores se embrenharam em meio às plantas rasteiras, procurando alimentos. Pequenos pássaros saiam e entravam em seus ninhos. Um grupo inteiro de servos passou por mim. Quando me viram, se assustaram e dispararam para o mais longe possível.
Em algum momento perto do meio-dia, eu vi. Era um clarão exuberante, luminoso como manteiga derretida. Uma abelha passou zunindo por mim, indo em direção à luz. Ela parecia alegre em seu voo determinado, e eu pude entender o porquê: logo minhas narinas foram assaltadas pelo cheiro do pólen das flores. - Até o sutil aroma me animou, também, e passei a andar um pouco mais rápido. Notei que estava indo mais rapidamente do que meus pés estavam acostumados, mas não liguei pois parecia perfeitamente natural para mim.
Seguindo a luz dourada e o pequeno inseto, logo estava lá: a campina. Perfeitamente redonda e iluminada; uma obra prima da natureza no coração do estado Washington. Eu podia ouvir o riacho, podia ouvir o vento soprando entre a relva alta. As flores, as árvores, o céu. Tudo parecia igual, talvez mais nítido, mais vibrante. Não senti dor, nem desespero. A magia que eu tanto buscava naquele dia estava ali, naquele exato instante.
Fiquei alguns minutos parada, como fizera antes de entrar na floresta, admirando o que cada um dos meus sentidos podia detectar. Em algum momento, meus olhos foram atraídos para algo mais brilhante que os próprios raios solares. Algo que refletia eles em meio às flores. - Ele estava de costas para mim, sentado e olhando para o alto. Eu o reconheci de cara; seu cabelo ruivo como bronze ondulava conforme o vento, assim como a relva. Estava como uma camisa branca e de mangas compridas e calças caqui. Sua nuca estava exposta ao sol. Mas algo estava errado. Ela… não estava cintilando como antes. Na verdade, parecia corada, apesar da palidez, e muito macia.
— Edward… - murmurei, sem ousar levantar a voz. Estava confusa, talvez um pouco assustada.
O vento, que soprava do norte para o sul, de repente mudou de direção, passando por Edward e se chocando contra mim. Esperei pelo cheiro doce e viciante que eu sabia que ele tinha, porém, mais uma vez eu não esperava pelas alterações. - Em vez do aroma suave e sobrenatural de um vampiro, fui assaltada pelo cheiro mais doce do que os das próprias flores. Um aroma enlouquecedor (lilases banhadas pelo frescor do sol) que fazia minha garganta pegar fogo e a minha mente entrar em combustão.
Antes que eu pudesse raciocinar o que aquilo significava, senti meu corpo e todo o ambiente ao nosso redor se mover em um flash. Em uma fração de segundo, eu havia percorrido metros e estava quase sobre ele, pronta para tomar cada gota de vida em seu corpo macio e muito humano (céus, ele era humano!). Entretanto, assim que entrei na claridade plena, assustei-me com a visão da minha própria pele sob o sol.
Minhas mãos, que haviam se erguido para alcançá-lo mais rápido, se paralisaram a apenas alguns centímetros de seu cabelo. Logo o meu foco era aquele brilho. Milhares ou milhões de cristais refletiam os raios solares. Para os menos atentos, poderia parecer que eu estava em chamas. - Olhei para aquilo, para o que eu era, sem acreditar em momento algum.
Pela minha visão periférica, vi Edward se virar para mim. Como eu imaginava, tanto as olheiras quanto os olhos dourados, às vezes negros, a pele pálida como mármore branco e os traços inumanamente perfeitos haviam desaparecido. O Edward à minha frente era completamente comum, mas não menos bonito. Seus olhos eram como esmeraldas puras. A pele era de um marfim rosado e quente. Ondas de calor emanava dele no compasso de seus próprios batimentos cardíacos. - Estavam fortes e plenamente audíveis até para a audição humana mais atenta. Seu olhar era de assombro, admiração e desejo.
Ouvi sua risada em um sopro e um sorriso hesitante.
— Linda… - murmurou suavemente, em um tom tão humano que me senti zonza. Em vez de perder o equilíbrio, meu corpo de pedra paralisou, incapaz de ter uma reação plausível.
Estiquei minhas mãos, mais uma vez por impulso para tocá-lo. À medida que meus dedos se aproximavam, o calor se tornava mais expressivo e caminhava das pontas até o pulso. Era como mergulhar minhas mãos em água morna: agradável e correto.
Mas eu sabia o que era e por mais que as coisas estivessem confusas agora, eu teria que tomar cuidado para não machucá-lo. Ao mesmo tempo que estava com medo, tinha certeza que poderia fazer aquilo. Eu tinha que fazer aquilo! Em um mundo muito distante, algo me dizia que as coisas não eram assim. Precisava ter certeza de que era real, se meu Edward humano era real. Não poderia ter medo e precisava impedir que as emoções que preenchiam o meu peito silencioso tomassem conta do meu discernimento.
Quando meus dedos tocaram o seu rosto quente, uma corrente elétrica, mais poderosa do que aquela que percorreu o meu corpo dentro daquela sala de aula, tantos anos atrás, fez cada terminação nervosa se acender, como luzes de Natal em meio a uma noite de nevasca. Era a mais frágil e macia seda. Fina e delicada como papel de arroz.
Vi sua pele corar sob a minha e um sorriso radiante brilhar em seus lábios cor de pêssego.
— Linda… - repetiu ele, agora seu hálito floral soprando em meu rosto.
Minha garganta queimou e minha respiração se acelerou. Concentrei-me novamente para não atacá-lo como antes, ao mesmo tempo em que me contive para não puxá-lo para um beijo. Ambas ideias eram suicidas (para ele).
— Por quê? - sussurrei sem mover os lábios. - Por que está aqui?
— Eu sempre estive aqui. - respondeu ele. - Você apenas se recusou a vir. Acho que foi culpa minha. Nunca fui bom nisso: ser o humano que precisava.
— Mas agora você é, certo? - Continuava incrédula. - Você parece ser bem humano para mim agora.
— Por enquanto. - suspirou, um peso de tristeza. - Enquanto ainda é seguro.
— Por que diz isso? - Precisei manter a voz firme. Eu podia sentir o nó na garganta, a laceração no peito. A cicatriz não estava mais fechada. - Vai me deixar?
— Isso só vai depender de você, meu amor. É sua escolha agora, me matar ou não. Você tem força para isso. - Ele parecia aceitar bem a condição em que se encontrava.
— Eu não vou matar você. - Afastei meus dedos de sua pele e dei um passo para trás. Um soluço subiu pela minha garganta. - Não tenho esse direito.
— Claro que tem. - Edward sorriu, estendendo as mãos para mim. Era um convite para que eu permanecesse ali. Ele notou o meu desespero. Sabia que eu queria fugir. - Eu conheço a queimação, a sede. A natureza de ser imortal. - disse ele, como se pudesse ler a sede em meus pensamentos. - E você tem essa plena escolha desde que eu deixei você naquela floresta, sozinha e desesperada. Você sabe que eu ouvi você gritar por mim. Posso nunca ter conseguido ler seus pensamentos, mas sua voz é a mais clara para mim. Sempre foi.
Eu não tinha mais coragem de tocá-lo. Minha garganta ardia como a fogueira mais impiedosa do inferno. Minha visão ficou avermelhada, ofuscando todo o brilho do sol.
— Sabe que não precisa fugir… - sussurrou ele. Agora parecia que era Edward quem iria se debulhar em lágrimas. - Você pode ficar aqui, comigo. Não me importo de morrer por você, ou por causa de você. Fique…
— Sinto muito…
Sem pensar duas vezes, virei as costas para ele e sai em disparada para fora da campina.
À medida que adentrava a mata fechada, mais o brilho do sol desaparecia. Chegou em um momento em que tudo era um breu total.
Continuei correndo, determinada a não voltar àquele lugar.

Depois do CrepúsculoWhere stories live. Discover now