Parte II: Capítulo Um

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Nada no mundo justificava aquela loucura. - Quando Aro fez a oferta e eu a aceitei, não houve tempo para raciocínio, muito menos um pequeno intervalo para que a minha decisão fosse analisada e revista. Ele simplesmente se agigantou sobre mim, e em menos de meio segundo depois ele cravava os dentes em meus pulsos.

Nada era capaz de me preparar para a dor. - As chamas atravessavam as minhas veias, subindo pelos meus braços, envolvendo a minha garganta e lambendo o meu rosto. Eu gritei, tanto de medo quanto de agonia. Tentei usar as minhas unhas para abrir a minha pele e obrigar as chamas a saírem à força. Acima do sofrimento que me consumia, eu podia sentir o sangue escorrendo pelas feridas abertas, mas que logo eram seladas pelo veneno.

Não valia a pena. Eu preferia morrer do que continuar com aquilo. E eu gritei, desesperada para que ele me matasse, minha voz retorcida. Berrei com todas as minhas forças, o quanto os meus pulmões e a minha garganta em brasas permitiam. Quando o fogo chegou em meu coração, a dor se multiplicou por dez, e depois por cem, enquanto aquele órgão tolo bombeava o sangue maculado para o restante do corpo que ainda não tinha sido afetado. Eu me debati como louca no chão. Só percebi que Aro fazia algo quando outros gritos que não eram os meus passaram a me acompanhar. Em algum lugar da minha mente em desespero, registrei que aquele gritos deveriam ser de Natalie. Mas eu não conseguia pensar nela, apenas na minha tortura e no quão maluca eu tinha sido por ceder.

Não valia a pena! - Eu sentia as lágrimas caindo como uma torneira que vazava, a pele rasgando sob as minhas unhas; mas a dor auto infligida era nada. Era como as carícias de uma pluma deslizando sobre o meu rosto, meu pescoço, sobre os meus braços. Cada pancada do meu corpo descontrolado sobre o chão de pedra era nada. Era como ir de contra a um colchão macio e suave.

Refém de um corpo em chamas, a minha noção de tempo tinha se perdido. Tudo que eu entendia era a agonia e os gritos desesperados. - Como se o tempo tivesse parado e a única coisa que restava era a tortura impiedosa do fogo. O próprio inferno na terra. O preço de se estar morrendo.

Só notei que algo havia mudado de fato quando as luzes das velas se apagaram e a minha pele não se abria; estava cicatrizada e oferecendo resistência. Um vislumbre de consciência me atingiu e parte da dor (1 de 100) se tornou secundária. Ela ainda estava ali, plenamente viva e atuante, as chamas não tendo aumentado nem diminuído um único grau, porém, pude conter a minha voz, transformando os sons tortuosos em grunhidos. Tentei manter o corpo parado, mas não tinha controle o suficiente para isso. Olhei ao redor. Uma leve penumbra cobria tudo, dando-lhe silhuetas demasiadamente disformes para conseguir identificar algo.

À medida que a minha mente clareava, a passos lentos, mais minha visão e meus ouvidos se apuraram. Encontrei o som do meu coração novamente, descompassado, lutando para expulsar o veneno de dentro dele. Era tudo em vão, como nossas súplicas, implorando por um pingo de misericórdia de alguém - qualquer um!

Tentei contar as batidas rápidas. Tentei vencer o tormento. Sem sucesso. Olhei ao redor mais uma vez, lembrando de Natalie e que ela passava pela mesma tortura. Vi sua mão retorcida para fora do colchão. Seus pés haviam balançado tanto que tinham caído os sapatos. Ela estava branca, quase tão pálida quanto um fantasma. A pele parecia mais dura e lisa. Tinha abandonado o lindo tom bronzeado e macio. Eu não podia ver o seu rosto, apenas ouvir a sua voz. E uma leve batida tão desnorteada como a que saia de dentro de mim.

Mais batidas. O tempo passava. Ou estaria o universo paralisado em sua eternidade?

Algo se mexeu na entrada. Uma sombra encapuzada. Uma mulher? Deveria ser. Ela usava vestido negro e saltos scarpin de solas vermelhas. O conjunto lhe dava um ar sofisticado e formal. Um contrate estranho com os seus cabelos castanhos, quase negros, e cacheados, tão volumosos que parecia pertencer a uma selvagem. Uma selvagem muito sensual.

Depois do CrepúsculoWhere stories live. Discover now