RECOMEÇAR

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JULIETTE POV

Por várias vezes ao longo da minha vida, eu me perguntava se um dia eu me sentiria mal ao ponto de não reagir. As vezes que entrava nesses questionamentos, era quando via minha mãe sofrendo por algo. A via gritar e chorar que não aguentava mais, mas não era capaz de entender o que se passava com ela.

Agora eu estava aqui, sentada na mesa de casa encarando um prato com uma comida muito duvidosa. Ao meu lado, os olhos verdes e atentos de Sarah, me esperando ter alguma reação. Meu corpo tremia um pouco e eu tentava me segurar para não preocupa-la, ela costumava ficar nervosa quando me via assim.

Eu queria poder dizer pra minha mãe "Agora eu te entendo", mas nem isso eu podia. A uma semana ela tinha ido embora de casa junto com minha irmã. Ela achava que meu relacionamento com Sarah não era bom. Achava que eu estava assim por causa dela. Eu não me dei ao trabalho de explicar, poderia passar horas dizendo que talvez eu só não tivesse desistido ainda porque tinha Sarah ao meu lado. Queria dizer que eu era o maior problema, mas o que isso mudaria? Ela ainda pensaria o que quisesse.

- Você precisa comer. - Ouvi a voz suave de Sarah e a encarei.

- Eu tenho que ir trabalhar.

- Hoje é sábado, amor. - Ela esticou o braço pra tocar minha coxa. Dava pra ver que ela se controlava pra não me olhar com pena. Eu a conhecia, e ela sabia que eu conhecia, então ficava a todo tempo tentando não me demostrar o que realmente estava sentindo. Mas eu sabia, o pior era isso.

É desesperador quando nos sentimos insuficientes. Quando sentimos que não somos capazes de amar mais ou de sermos amados. Quando a única coisa que queremos é um mar de alegrias e nos afogamos em um oceano de tristeza, lutando com os nossos pulmões em busca de um último sopro de felicidade. Eu tinha medo de ter cometidos erros irreversíveis com ela. Tinha medo de não ter um jeito de concertar todo aquele dano que ela fazia muito esforço pra esconder.

Ela suspirou forte e se levantou da cadeira indo até a cozinha sumindo da minha vista. Senti minha barriga mexer chamando minha atenção e eu levantei minha blusa de manga para olha-la. Eu estava com 4 meses de gestação e começava a ficar difícil ignorar o bebê crescendo dentro de mim.

Fiquei parada olhando minha barriga se remexer sutilmente. Minhas mãos suando grudadas nas minhas coxas. Tirei elas dali e apoiei em cima da mesa. Um lado meu queria interagir, eu podia sentir que ele ou ela queria algum tipo de atenção, o que era bem louco, eu não entendia porque eu sentia isso. Mesmo o ignorando completamente, eu o sentia ligado a mim.

Ouvi os passos de Sarah e abaixei a blusa com pressa tentando não ser notada. Ela se sentou de volta na mesa e trouxe um copo com suco.

- Consegue beber? - Perguntou calmamente. Eu sabia que ela não iria parar de insistir até me ver comendo alguma coisa, então me dei por vencida e pelo menos tentei me alimentar.

Eu me sentia enjoada a maior parte do tempo. Estava sempre nervosa e ansiosa com algo. A verdade era que eu não estava sabendo lidar com aquela gravidez. Os dias se passavam e eu só conseguia rejeitar mais a ideia de ser mãe. O fato do tempo estar passando e estar cada vez mais próximo de fazer um teste de DNA só me deixava cada dia mais doente mentalmente.

Eu tinha medo do resultado, tinha medo que ela não soubesse lidar, ou que fosse embora. Tinha medo de ter que aturar Lucas pro resto da vida. Medo de deixar Sarah saturada de tudo que me envolvia. Eu já podia ver sua paciência se esvaindo. Eu precisava reagir e entender minha realidade. Mas toda vez que eu pensava em perde-la, cada centímetro meu temia.

- Muito bem, gatinha. - Sarah sorriu de orelha a orelha quando viu meu prato vazio. Tentei sorrir pra ela, me concentrando pra não colocar toda comida pra fora.

STOLEN [ INTERSEXUAL ] SARIETTE Where stories live. Discover now