Só porque o mar está calmo na superfície...

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Só porque o mar está calmo na superfície, não significa que algo não esteja acontecendo nas profundezas.

Nunca entendi muito bem porque Cerci era tão pessimista, porque tinha dificuldade em acreditar ou confiar nas pessoas, para mim era tão estranho que minha irmã tivesse tanta amargura, sempre dizia para ela mudar, para deixar de ser uma pessoa ruim, porque ninguém gostava de pessoas assim, no entanto, desejava fervorosamente agora que ela nunca tenha me dado ouvidos, porque percebi que aquilo não era um obstáculo, era um escudo!

Uma coisa dessas jamais aconteceria com minha irmã porque sua dificuldade em acreditar nas pessoas não a deixaria ir nem ao jardim do castelo para ter qualquer conversa com alguém como Thomas, quanto mais aceitar fugir com ele. Ai minha querida irmã, quisera eu ter tido sua inteligência quanto a incoerência da personalidade do homem, jamais estaria deitada em uma cama num navio pirata, sem poder falar, e ouvindo uma música horrível vindo lá de cima desde cedo. Essa gente era sem noção, mas jamais diria isso a eles.

A senhora, que agora eu sabia o nome — Delphine —, disse-me que logo estarei boa, depois que Stu saiu do quarto como um furacão ela entrou para saber como eu estava, passou um remédio em meus pontos que, segundo ela, curava melhor do que qualquer outra coisa que eu conhecesse, e soube que ela estava passando ele há uma semana e estava vendo melhoras.

— É uma planta medicinal que faz milagres — foi o que ela me disse. — Amanhã você acordará melhor, talvez já até possa conseguir falar.

Esperava que sim.

A música alta, enjoativa e, muito estranha, junto das risadas, de alguma forma me acalmou, por causa da barulheira não pude me perder nos pensamentos e depois de um tempo acabei relaxando, mas não completamente, porque sabia bem onde eu estava. Eles ainda eram os piratas que possivelmente mataram minha mãe.

De repente percebi que as roupas que eu estava usando, na verdade, não eram nenhuma das minhas roupas, eu sequer reconhecia elas. O que houve com minhas roupas?

Mal tive tempo para chegar a uma resposta quando a garota, Montana, entrou no quarto segurando um prato na mão.

— Parece que você precisa comer — disse, andou um pouco e depois sentou-se na beira da cama — O gosto vai parecer ruim no início, e talvez a comida faça todo o caminho de volta, mas você ainda assim precisa comer.

Balancei a cabeça negando, não estava com fome.

— Sabe, posso imaginar pelo que passou, sei que está assustada, com medo, e sei principalmente que não confia em nós. Mas a salvamos, você queira ou não, e estamos nos esforçando para parecermos legais quando você nem ao menos tentou.

Eu poderia os odiar, mas não podia negar aquela verdade, ela tinha razão.

— Desculpe!

Montana arregalou os olhos, no início pensei que era porque havia me rendido, mas então ela disse quase em um grito:

— Você falou! Ai meu deus! Você finalmente conseguiu dizer algo! — disse ela com empolgação, logo percebi o tanto que, não só eu, mas todos eles estavam esperando por isso. — MÃE — gritou ela — A GAROTA FALOU!

Em questão de segundos o quarto foi invadido por todo tipo de espécie de pirata, até os que eu ainda não tinha visto, todos com um sorriso enorme.

— A recuperação dela está sendo mais rápida do que eu esperava. — disse Delphine.

— E isso é bom, não é? — perguntou Stu por trás de um homem grandalhão com o braço enfaixado.

— Eu ainda não sei — respondeu a anciã. — Você consegue falar de novo, menina?

LUA NEGRA Where stories live. Discover now