Capítulo VI: Desafio

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Depois do jantar na casa do Filipe, eu estava decidido a tirá-lo daquela vida. Ele estava se afundando e levando sua mãe junto consigo. Naquela noite que voltei para a casa dele, dona Tânia estava chorando, sendo amparada pelos meus pais. Fiquei com ódio dele imediatamente, mas passou após alguns minutos de conversa com sua mãe, pois entendi que aquilo não era problema dele apenas. Ele estava querendo agradar o seu primo que, querendo ou não, ele via quase como uma figura paterna. VH era tão errado quanto o próprio pai do Filipe. Onde já se viu iniciar o garoto nessa vida de crime ao invés de incentivá-lo a fazer algo diferente? Como primo mais velho e figura provedora, ele devia incentivar Filipe a ganhar a vida de outras formas, não se tornar uma cópia dele. Ninguém tinha coragem de falar aquilo para o dono do morro, mas eu tinha. Nós jantamos, mas fomos embora muito tristes e eu decidido a conversar com Victor Hugo.

Na manhã seguinte eu tinha duas missões, a primeira era tentar reaver o ministério de louvor e a segunda era conversar com Victor Hugo sobre coisas seríssimas. A primeira é que após o baile teve uma briga generalizada e a loja do Manoel amanheceu com o vidro da porta quebrado. A foto circulava pelo grupo da comunidade e todo mundo estava horrorizado com os vídeos também. Além disso a comunidade amanheceu sem lixo no chão, porém com um cheiro insuportável de urina, pois as pessoas mijam em qualquer canto, então obviamente os estabelecimentos amanheceram fedendo a urina, o que gerou outra reclamação.

Cheguei na igreja assim que terminei de mandar mensagem no grupo dizendo que eu iria entrar em contato com o VH para resolver. Meu pai simplesmente jogou no meu colo a responsabilidade de ser o mensageiro que faz essa ponte entre a igreja e os moradores já que a maioria deles gostavam de mim, pois eu era diferente dos outros "crentes". Eu não os julgava ou condenava, eu acolhia e isso era o que o meu pai também fazia, mas alguns irmãos sentem certa dificuldade em acolher, e por falar nisso, acabei dando de cara com um que além de ser extremamente julgador ainda era chantagista. Gabriel estava na igreja dando ordem a um grupo de jovens como se fosse o dono do local. Me aproximei e eles saíram de cabeça baixa como se tivessem levado bronca ou algo do tipo. Gabriel tomou um leve susto ao me ver, mas logo após sorriu vindo me abraçar. Ele não estava muito diferente, só estava mais musculoso, com uma aparência mais jovial, cabelo cortado em fade, barba feita como sempre, roupa social... Ele conseguiu ficar ainda mais bonito que antes, porém ainda passava aquela vibe do jovem que tinha inveja de tudo e todos.

- Que prazer poder vê-lo novamente, irmão. - Ele era todo sorriso, mas eu não sabia até onde aquilo era real.

- O prazer é todo meu.

- Está voltando para nossa congregação? Sentimos saudades, tenho tantas novidades para te contar. - Chegou o momento em que ele tanto queria. O observei enquanto ele falava sobre o ministério dos jovens, o quanto os jovens o admiravam e como ele era elogiado por conduzir bem o ministério. Falou sobre o ministério de louvor, que ainda era líder e esse era o preferido dele, deixando bem claro que ele não abriria mão. Senti raiva nesse momento, mas me contive. - Fora que agora eu sou presbítero, tenho que manter tudo em ordem, sabe como é? A igreja cobra postura. - Todas aquelas indiretas... Ele não havia mudado nem um pouco.

- Bem, meu pai quer que eu volte para a igreja e assuma algum ministério, talvez para tirar essa sobrecarga em cima de você. - O olhar dele ficou mais aguçado e ele cruzou os braços. Por um momento achei que ele iria avançar sobre mim, mas ele continuou parado me olhando feito um touro.

- Ah, mas eu estou tranquilo, os compromissos com Deus nunca são sobrecarga. - Ele falou de forma lenta. - Eu me sinto bem aqui com todas essas responsabilidades, sinto que estou fazendo algo útil, sabe? Mas se você quiser voltar como membro, nosso coral precisa de mais vozes.

- É, mas no caso o meu pai já havia falado que eu iria assumir o ministério de louvor por conta da minha faculdade. Ele quer que eu ensine aos jovens. - O riso anasalado dele. Gabriel não conseguia sustentar o personagem nem por alguns minutos. Ele umedeceu os lábios e me olhou de cima a baixo.

Amor Marginal (Romance Gay)Where stories live. Discover now