04 - Dias amargos

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Foram as duas semanas mais sem graça, longas e horríveis que dona Amélia já vivenciou em todos os anos de sua vida nessa terra.

Para onde olhava, tinha um vislumbre de Isabel caminhando, limpando ou implicando com ela, quanta saudade sentia de tudo isso. Quanta dor seu peito acumulara nesses 14 dias rastejantes e deploravelmente sem cor; o chá não lhe agradava, sua comida, seu café, nada parecia ser igual antes de Isabel aparecer por ali.

Isso já estava insuportável para a senhora que decidiu então ir mexer em seu jardim.

— Preciso ocupar a minha mente com algo ou vou ficar doente.

Pela cerca de madeira que circundava a casa era possível ver o quintal de alguns vizinhos à direita e à esquerda, por isso, raramente aparecia por ali e assim evitava contato, já que eles adoravam o local em seus quintais.

Estava arrancando algumas folhas de suas duas samambaias enormes que estavam secas devido à falta contínua de cuidado, quando uma voz ressoou atrás de si.

— Bom dia, Amélia!

Levou alguns segundos para acreditar que sua vizinha estava ali e a cumprimentando.

— Bom dia, senhora, Adelaide!

— Que prazer vê-la depois de tanto tempo. Eu acredito que já faz quase um ano que não a vejo, por que não vem aqui para tomar um chá comigo hoje pela tarde?

— Eu agradeço o convite, mas, tenho um compromisso. Quem sabe, numa próxima.

— Sério mesmo?

— Sério mesmo, tenha um bom dia.

— Igualmente. Adorei conversar com você. Eu nem me lembrava mais do som da sua voz. Foi bom ouvi-la de novo.

— Obrigada.

Se virou para suas plantas, entretanto, uma lembrança preencheu sua mente e então, voltou a procurar pela senhora que ainda sorria.

— Adelaide?

— Sim?

— Me... perdoe por todas as coisas rudes que lhe direcionei por inúmeras vezes, sinto muito. Espero que possa me perdoar um dia.

— Oh, dona Amélia, já está perdoada há anos. E para comprovar isso, venha tomar um chá comigo, assim, selamos nossa paz.

— Para ser sincera, não tenho compromisso.

Dona Adelaide riu com gosto e bateu palmas.

— Eu imaginei isso mesmo. Mas, então, aceita?

— Tudo bem. Estou devendo isso há anos, não?

— Realmente.

À tarde, Amélia passou pelo portãozinho depois de trancar a porta dos fundos, meio desconfortável, mas, foi assim mesmo levando biscoitinhos de nata. O quintal de sua vizinha é tão entulhado de tantas plantas e flores que ela ficou até um pouco zonza com tantas cores.

— Aqui está nosso chá, sente-se. — pediu depositando peças de porcelana em cima da mesa e depois voltando para o interior da casa em busca do bolo de fubá feito pela manhã. — Que bom ter sua presença aqui, Amélia! Acho que nenhum dos nossos vizinhos acreditarão quando contar isso.

— Então, que tal não contar?

Dona Adelaide esboçou sua risada novamente e Amélia se permitiu escorar-se na cadeira e inspirar profundamente ainda desacreditada e um pouco desconfortável por estar ali.

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