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Sina.

Meu pequeno grupo traidor tinha se desfeito. As garotas sumiram de vista e ao meu lado, depois de soltar meus pés, estava Josh me puxando como se eu fosse um cachorro pelas cordas presas no meu pulso.

- Isso dói - reclamei, tentando me manter em pé, mesmo que meu corpo tremesse tanto que mal conseguia dar um passo.

- Dói tanto quanto noite passada? - ele me provocou e, inevitavelmente, a mágoa me calou.

Meus olhos foram direto para Noah, e minha mente nublou.

Por que é que ele fazia aquilo? Por que é que, depois de tudo, ele ainda vinha tirar mais e mais de mim?

Naquele segundo, não me importava aquele meio mundo de gente apontando o dedo para mim, pronto para ver algum espetáculo ao qual eu seria a atriz principal sem nem ter feito teste para o papel, pronto para rir da minha desgraça.

Só me importava que, se Noah não parasse o que tinha planejado naquele segundo enquanto eu era obrigada a me arrastar em sua direção, ele acabaria com a última fagulha que restava dentro de mim.

Quando eu fui obrigada a parar em frente a Noah, minha visão embaçou graças às lágrimas acumuladas. Eu nunca tinha chorado tanto quanto desde que ele havia voltado.

- Por que você está fazendo isso? - com toda a dor que conseguia traduzir na voz, perguntei, inquisidora.

O rosto dele era uma máscara. Seus olhos dois abismos, frios demais para qualquer compaixão, profundos demais para que eu conseguisse colocar os pés em algo que não fosse ódio e crueldade.

Noah não me respondeu. Na verdade, tudo o que ele fez foi desbloquear o celular em sua mão e me mostrar algo pelo qual eu nunca me recuperaria.

O vídeo era de Isaac. Eu reconheceria aquela bunda em qualquer lugar.

Meu ex-namorado estava entre as pernas de uma garota a qual, graças a Deus, não dava para ver o rosto.

- Nós não estamos mais juntos. - Engoli o orgulho. - Isaac pode dormir com quem quiser. - Com as mãos juntas, limpei o canto dos olhos.

- Olhe de novo - Noah mandou, e eu notei a data do vídeo no cantinho.

Aquilo era de mais de um ano atrás.

Meu peito tremeu. Tentei olhar para o lado e ignorar, mas Noah quis me humilhar ainda mais, colocando vários e vários vídeos em sequência.

- Eu... - engasguei. Não tinha desculpas.

Isaac havia me traído mais vezes do que eu poderia contar e, no fundo, eu sabia.

Eu realmente sabia.

Eu sempre soube.

Eu só não podia tomar uma decisão.

Eu só não podia ver.

- Por que está me mostrando isso? - Minha voz era menos que um sopro, que um ruído.

Tudo doía, principalmente minha garganta.

- Porque você escolheu um lado. - Noah parecia não ter emoção nenhuma naquele minuto, e quando ele puxou a corda que me segurava das mãos do amigo, me trouxe para mais perto. Ali eu podia sentir seu cheiro, o calor do seu corpo, a porra da magnitude de nós. Seu olhar baixou para minha boca por um segundo, e quando seu rosto se aproximou do meu, o gosto dele surgiu na minha língua sem nem mesmo tocá-lo. Mas Noah parou. Sua respiração bateu contra mim, e quando ele disse aquelas palavras, sua crueldade me fez cair como nunca: - Só estou te fazendo colher as consequências das suas escolhas, Sina.

Em um movimento rápido, ele me empurrou e eu caí de costas na cova cheia de terra.

- Aqui jaz uma mentirosa - ele gritou para a plateia, com os olhos nos meus, absorvendo todo o meu choque por não entender aonde aquilo chegaria. Ele me enterraria viva?

Noah apertou a tela do celular e jogou para mim.

- Veja o que seu eleito disse sobre você, depois de te convencer que eu a estuprei ontem.... - Quando o aparelho caiu na minha barriga e eu consegui olhar a tela, era Isaac gemendo, o som de corpos batendo, e lá estava Sabina.

A minha insegurança em forma de gente.

Mais velha, mais experiente, mais bonita.

Mais rica, mais legal, mais descolada e que tinha acesso ilimitado a Noah Urrea.

- Não está com saudade da loira? - ela perguntava.

- Sina é uma vadia... - Me livrei das cordas que prendiam meus pulsos e consegui desligar o celular.

As lágrimas no meu rosto eram tantas.

O ódio, a raiva, o constrangimento, a dor.

Tudo me dominava. Tudo acabava comigo.

E em um último sopro sobre a brasa que restava de coragem no meu ser, enquanto terra vinha sobre mim e o riso das pessoas lá fora acompanhava alguma piada sexista e baixa feita para me ferir mais, eu gritei tão alto e tão agudo, que tudo parou.

Todos olharam para mim enquanto, ainda gritando, eu me colocava de pé.

Até Josh parou de jogar terra na minha cova para assistir enquanto eu saía dela e ia para Noah.

- VOCÊ É INSANO! INSANO, NOAH! - Não havia mais nada contido dentro do meu peito. - Não há nada mais para você quebrar aqui, porque, de fato, eu sou mesmo uma filha da puta. Eu sou mesmo a merda de uma mentirosa, de uma traidora, de uma idiota. Sou burra! Mas não pense que eu sou qualquer uma dessas coisas porque vivi sob o teto do seu pai, ou porque namorei seu irmão enquanto ele me botava todos os chifres possíveis. - Avancei para cima dele, o rosto tão próximo que podia ver cada mísero detalhe das íris escuras sob a luz das tochas, e quando ele deu um meio passo para trás, eu avancei, não dando brecha alguma entre nós. - Eu fui tudo isso porque eu esperei por você, porque eu lutei por você, porque pintei você e escrevi para você um bilhão de cartas que você, covarde, nunca teve coragem de responder. Eu realmente esperei você. EU LUTEI POR VOCÊ, NOAH. - Bati contra seu peito com o dedo indicador, seus olhos eram ilegíveis, suas sobrancelhas franzidas não me diziam muita coisa, mas nada importava naquele segundo. - E eu não deixei de amar você por nenhum segundo, mesmo quando você partiu meu coração naquela merda de roda-gigante, ou quando incendiou minha casa e assassinou minha irmã! - O choque foi geral. A plateia segurou a respiração. Noah engoliu em seco, mas eu não me calei. Não aguentava mais. - É por isso que eu não comprei, nem de longe, essa ideia de estupro. Eu nem mesmo sabia dela. Fiz porque quis, porque de algum jeito maldito, você ainda está em mim, porque, mesmo depois de todos esses anos, eu guardei tudo o que era nosso, todos os seus segredos, todas as boas memórias. Fiz porque acreditei no seu amor com uma fé inabalável, mas isso tudo era ilusão. Você não pode ter me amado um dia, Noah, porque quando se ama, não se quebra, não se destrói, não se machuca o outro como você fez comigo.

Ofegante, parei encarando-o, tão brutal quanto ele.

- Eu... - Não deixei que ele terminasse de falar.

Ergui a mão e dei com tudo o que tinha e o que não sabia ter.

O tapa estalado em seu rosto deixou a marca dos meus cinco dedos contra a pele branca.

- Vou dar uma referência clara, que você vai entender. Aqui, nessa história, na nossa história, você não é o amável e injustiçado Darcy, você é o merda do Wickhan! O único traidor aqui, o único covarde, é você. E eu cansei! Estou te expulsando de vez da minha vida, Noah Urrea. Estou agora acabando com você tudo e qualquer coisa que um dia achei que pudesse ter, porque você é podre. Você não tem coração. Você é realmente o pior dos Urrea. - E eu corri, porque por mais que minha boca dissesse aquilo, por mais que eu quisesse que a magia daquelas palavras fizesse algo de imediato, elas não faziam.

Era eu e meu coração partido, morto, acabado.

E eu não tinha mais razão nenhuma para continuar tentando.

Bad Urrea | NoartOnde histórias criam vida. Descubra agora