Capítulo 2

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                                                                                            Serena

Após ficar nervosa com a espera, Serena dá seu primeiro nado em direção à Enseada de Cristal. Serena só teve uma missão em sua vida inteira: proteger Yara. De repente, parece que o propósito da sua existência não vale mais de nada. O que podia ela fazer contra as leis? Contra o crime que Yara havia cometido durante o pouco tempo que Serena se distraiu, deixando-a nadar mais à frente sozinha? Milhões de opções dançam em sua mente, opções que ela poderia ter seguido em vez de deixar Yara se afastar dela para ficar a sós com os seres marinhos do Mar de Prata. Agora, no entanto, é inútil listar as opções. O mal já tinha sido feito e a tragédia já está por vir.

Por muito tempo, ela conseguiu cumprir com eficácia seu papel de manter a sereia roxa longe de qualquer problema. Não tinha sido a tarefa mais fácil do mundo proteger Yara, mas ela deu o seu melhor. Protegeu-a das outras que ameaçavam atacá-la quando a sereia repetia em voz alta que não comia carne dos outros peixes. Protegeu-a quando a sereia de cauda verde Katie e sua dupla de amigas tentavam cercar Yara e lutar com ela porque sabiam que ela anda com um peixe estimação, o que achavam ridículo. Protegeu-a até mesmo dos olhares das outras sereias de cauda roxa, que a fitavam como se ela fosse uma esquisita com defeito de nascença. Mostrou para ela a localização da Enseada de Cristal e a manteve mais por lá, longe daquelas que a desprezavam. Mesmo assim, não foi o bastante.

Transformando-se rapidamente em um golfinho para nadar mais rápido, Serena pula sobre as ondas do mar para alcançar a enseada. Ela nada com agilidade e distração enquanto se recorda daquele dia em que ela estava à beira da morte, envenenada por um nokken, quase se matando por causa da dor. Tinha sido nesse dia que Yelena a havia encontrado. Atordoada, ela tentou matar Yelena no início, chegando até mesmo a lutar com ela. Ainda que diante da imagem do predador natural das sereias, Yelena não recuou. Ela enfrentou Serena, a salvou e cuidou dela com carinho, como se fossem parentes. Elas não são — Serena sabe bem que uma sereia não tem relação sanguínea com a outra. No máximo, têm um sentimento de proteção para com suas próprias irmãs de ninhada. Entretanto, Yelena cuidou dela como se tivessem alguma familiaridade. Resgatou-a. E ela

jurou que cuidaria daquilo que era mais precioso para Yelena desde então, mas tinha falhado.

— Serena? — A voz de Yara corta os ventos úmidos do Mar Prateado. Ao ouvi-la, ela se concentra e faz suas escamas vermelhas reaparecerem aos poucos. Sua estrutura óssea estala ao mudar bruscamente entre algo pequeno para algo maior e mais complexo. Aos poucos, seus tecidos se esticam e sua pele se torna pálida outra vez, seu rosto diminui e adquire nova forma, e seus cabelos crescem de novo. Devagar, seu corpo se transmuta, devolvendo-lhe a forma de uma sereia.

Avistando Yara em cima da cachoeira que jorra do alto da encosta da Enseada de Cristal, ela nada até a entrada coberta por água, passando por dentro da queda. Com um pouco de velocidade, sai da água e senta-se na pequena formação rochosa de frente à sereia roxa. Ali é como um esconderijo, onde elas se encontram para conversar. Ninguém sabe da localização desta enseada, nem mesmo Yvi.

— Como foi? — Serena já vai logo perguntando, quando percebe de imediato que o rosto de Yara demonstra tristeza fora do normal.

— Péssimo — Yara responde. — Ganhei o Exílio.

Nunca passou pela cabeça de Serena que Yelena fosse capaz de sentenciar a sereia roxa à morte pelo que fez. Ela não seria capaz, mesmo em seus deveres de rainha. Mas o Exílio lhe soa muito ruim também. Serena não gosta nada da ideia de ter que ir ao Exílio proteger Yara. Lá é sombrio, escuro e frio. Sem contar a presença de um certo alguém que lhe dá calafrios.

Canção das ProfundezasWhere stories live. Discover now