Lembranças

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RAMIRO

Eu passei o resto do dia de ontem olhando pro horizonte, observei o pôr do sol e toda a beleza que a natureza poderia oferecer, mas algo me incomodava e me incomodava muito, eu não era muito homem de chorar, mas naquela noite, eu chorei e chorei até dormir e sonhar com o Kelvin fazendo cafunés em mim, pela primeira vez não acordei assustado com o fato de sonhar com o Kelvin, eu tenho medo de perder ele mas não admito isso. Pedi ao patrão pra deixar minha tarde livre e resolvi ir até o rio onde eu quase afoguei o Kelvin pra pensar, mas quando cheguei lá pra minha surpresa vi o Kelvin sentado na grama observando o rio.

- Kevin. - Falo com a voz falha.

O Kelvin se vira e olha pra mim, senti um certo olhar de desespero dele pra cima de mim.

- Ramiro. - Kelvin fala se levantando.

Eu me acostumei com ele falando "Rams" que me incomodei com aquele "Ramiro".

- Num sabia que 'ocê ia tá aqui. - Falo olhando pro rio.

- Vim pensar, como tá indo as coisas Ramiro? - Ele fala em um tom um pouco irônico mas sem ser irônico e aquilo me deixou confuso.

- Tá indo. Vim pensar também. - Dou uma pausa na fala. - Em quando a gente se conheceu. Sabe... eu gosto d'ocê e não me arrependo de ter te conhecido.

Eu falei aquilo e tentei não fazer contato visual, me sentei na grama e o Kelvin fez o mesmo.

- Ah... Eu também gosto de você e não me arrependo de ter te conhecido, Ramiro. - Kelvin fala tímido.


FLACKBACK ON (Kelvin):

Era aniversário da dona Cândida e eu estava animado já que resolveram fazer uma festinha de comemoração, eu havia chegado a poucos dias em Nova Primavera e ela me acolheu e me deu trabalho, sinto como se ela fosse uma mãe pra mim já que a minha de verdade nunca me acolheu daquela forma. Todo mundo estava se organizando, colocando luzes, fazendo cartazes o que de alguma forma era uma cafonisse mas uma cafonisse fofa e os comes e bebes. Dona Cândida estava vestida elegantemente com um vestido florido, eu estava com uma das minhas roupas mais tradicionais, uma blusinha preta e uma bermuda jeans um pouco acima dos joelhos, uma bota preta e um delineado de gatinho (o que já era parte de mim). Nunca vi tanta gente entrar e sair de um estabelecimento, Cândida realmente tinha muitos amigos. Um homem entra no estabelecimento com uma porte que qualquer outro não tinha e percebi que era o Doutor Antônio e veio acompanhado de um rapaz que me chamou a atenção, pelo porte e a forma que ele falava com o Antônio e o Antônio falava com ele, ele só poderia trabalhar para o Antônio.

Eu queria me aproximar dele mas ele parecia ser uma pessoa difícil, quando o Antônio entrou no quarto da Cândida para falar com ele e vi que ele não tinha companhia resolvi me aproximar.

- É... Oi... - Eu digo de forma tímida.

- Hm? Oi. - Ramiro fala sem olhar pra mim.

- Você trabalha pro doutor Antônio? - Eu pergunto.

- Sim, por quê? - Ele fala em tom grosso.

- Eu hein, só queria conversar. - Eu digo.

- Hm. - Ele continua a evitar contato visual.

- Qual é o seu nome? - Eu já tava quase perdendo a paciência.

- Meu nome? Ramiro. - Ele olha pra mim pela primeira vez.

- Ramiro? Hm, gostei. Vou pensar num apelido pra você. - Eu sorrio. - Meu nome é Kelvin, cheguei aqui esses dias, sabe? Você é casado, namora, tem filhos?

- Mato Grosso do céu, 'ocê fala, hein? Mas não, num sou casado, num namoro e nem tenho filho. - Ele fala passando a mão no cabelo.

- Hmmm, que bom. - Eu continuo a sorrir.

Resolvi não falar mais muita coisa mas gostei da companhia dele e não ia deixar ele se livrar de mim tão cedo, naquela noite não falamos mais porém passei o resto da noite olhando pra ele e senti ele olhar para mim também.

FLASHBACK OFF (Kelvin):


- Sempre foi meio difícil conversar com você. - Kelvin fala triste. - Mas eu amo sua companhia e não imagino um futuro onde você não esteja.

- Desculpa. Desculpa por eu ser assim, desse jeito. Desculpa por nunca ter te tratado da forma que 'ocê merece. - Eu abaixo a cabeça. - Eu sou um jumento mermo', como o patrão fala.

- Ramiro... - Kelvin olha pra mim com os olhinhos brilhando. - Eu não gosto quando você se desmerece, já falei que você é incrível, e se não for para os outros, é pra mim. Eu não vou dizer que tá tudo bem da forma que você me trata, sabe? Eu gosto da sua companhia, mas a forma que você me trata... eu sempre estive aqui com você e sempre te tratei da melhor forma possível só que você nunca me deu essa reciprocidade que eu tanto esperei.

Eu passei uns segundos pensando enquanto eu me entristecia por pensar que eu nunca tratei o Kelvin como ele merecia.

- Eu vou melhorar... - Meus olhos enchem d'água. - Eu só tô confuso, Kevin.

- Eu vou ter paciência, Ramiro, eu vou ter paciência. - Kelvin suspira.

Eu olhei no fundo dos olhos do Kelvin, enxerguei amor, tristeza e outros sentimentos, me aproximei do rosto dele devagar, encostei minha mão no queixo dele e passei a mão levemente até chegar na nuca dele.

- Desculpa, Kevin. - Sussurrei.

Senti meus pelos arrepiarem. Comecei a sentir a respiração quente dele e aquilo me arrepiava mais ainda, sentia vontade de beijar ele e olhava frequentemente para aqueles lábios rosados dele. Eu não sabia se prosseguia ou parava, se eu prosseguisse minha vida não seria mais a mesma de alguma forma, se eu parasse ficaria um clima estranho. Entretanto, com aqueles olhos sedentos para mim, para meus olhos, para meus lábios e para meu corpo, era difícil me conter. Aqueles segundos me atormentavam.

Simplesmente, 'ocê - KelmiroWhere stories live. Discover now