19. A Noite em que o Fogo Contou Histórias

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O tempo, Mendes percebera, era um mestre cruel

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O tempo, Mendes percebera, era um mestre cruel. Não era medido por relógios ou pelo passar das estações, mas pelas cicatrizes da alma. Ele havia visto vidas surgirem, desaparecerem e se transformarem em um piscar de olhos, amores vieram como cometas brilhantes apenas para desaparecerem nas profundezas da escuridão. Em tempos de guerra e sofrimento, as horas pareciam se arrastar, e ainda assim, a vida parecia fugir como areia entre os dedos.

Sentado na cabana de palha, o tempo parecia ter parado. Isadora inclinou-se, colocando sua testa contra a de Aritana, como se tentasse sentir seus últimos pensamentos, sua última essência. "Que Amana guie seu espírito através dos ventos e da terra, e o leve ao descanso merecido até seu recomeço", murmurou ela.

Levantando-se, seus olhos buscaram por algo próximo: um arco, esculpido com detalhes primorosos, repousando silenciosamente na escuridão da estrutura. Ela caminhou até ele, pegou-o com cuidado e firmou-o em suas mãos.

— Já parou para pensar, por que o destino junta almas, só para depois separá-las?

Mendes, ao ouvir a pergunta, suspirou abaixando a cabeça, os olhos perdidos nas sombras da construção, como se buscasse ali uma resposta que fizesse sentido.

— Eu queria ter uma resposta para isso. Mas a verdade é que... eu não sei.

Isadora se aproximou lentamente dele, em um sussurro disse: — Talvez seja a crueldade do universo.

Então Mendes levantou a cabeça, olhando diretamente para aqueles olhos tristes, e algo lhe veio à mente.

— Mas talvez haja algo que permaneça... mesmo quando o destino decide ser cruel com a gente.

— E o que seria?

— As histórias. Cada vez que falamos de alguém, que contamos seus feitos ou seus sonhos, eles renascem.

— Palavras não trazem ninguém de volta. — disse ela abrindo um cesto que Mendes não pode identificar o conteúdo.

— Teve um dia em que eu estava pescando com o meu avô e ele me contou sobre um nevoeiro que cobriu o seu barco, deixando ele e todo resto da equipe as cegas no mar.

— E o que você quer dizer com isso? Que o nevoeiro engole tudo? — ela tirou de dentro do cesto uma aljava com flechas que passou envolta de seu corpo.

— Não, Helena. O que eu quero dizer é que, desde pequeno, eu sempre fui obcecado pelas histórias do meu avô. Ele me contava sobre todas essas aventuras e lendas, e as vezes, eu até mentia, dizendo que eu havia vivido tudo aquilo.

Isadora, intrigada, o observou, esperando que ele continuasse.

— O que eu não sabia, naquela época, era que aquela história do nevoeiro seria a última que ele me contaria. Por mais que ele não esteja mais aqui, eu guardo essa história, e todas as outras comigo. Talvez contar algo de Aritana também ajude.

O relógio de areiaOnde histórias criam vida. Descubra agora