ONZE

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       Yibo não está nas orações das Vésperas ou no jantar. Acho que deve estar na cela, mas não tenho certeza, porque, quando entro na minha, há silêncio do outro lado da parede. Vou até minha janela e fico olhando para a colina por um momento, depois para os claustros absorvendo a luz do entardecer, e volto para a colina, que está iluminada com o alaranjado quando o sol começa a se pôr.
Os sinos das Completas logo tocarão.
Pressiono minha mão no vidro, como se pudesse tocar a colina. Levanto meus olhos para as colinas. Cinco anos atrás, eu teria brigado com Yibo com unhas e dentes. Estaria batendo na porta dele agora, exigindo lutar ou foder, a ordem não era importante.
Cinco anos atrás, eu teria dito você está errado e teria admitido a derrota só depois de uma discussão cheia de adrenalina ou uma maldita sessão de maratona.
Mas agora, não sei se ele está errado.
Também não sei se ele está totalmente certo, e acho que se existe um dom que recebi ao ser monge, é que agora sei como lidar com esse sentimento, essa ambiguidade. Na minha antiga vida, as decisões tinham que vir rápido, em minutos ou segundos. Opiniões ainda mais rápido. Isso me servia, ativava meu pensamento naturalmente impulsivo e, na verdade, parecia que não havia outra maneira de viver. Todo mundo ao meu redor tomava mil decisões por dia, movendo-se rápido, pensando rápido, vivendo rápido. Ir devagar e dar um tempo - para ouvir ou remoer ou ser qualquer coisa diferente de absolutamente produtivo no sentido de produzir escolha após escolha - era pior do que ser inútil.
Era ser fraco.
E agora nessa fraqueza, encontrei força.

Decido não incomodar Yibo. Não tenho mais direito a isso, não tenho direito de bater em sua porta quando ele deixou claro que está chateado comigo. E, para ser honesto, ainda estou sentindo uma centena de coisas diferentes com suas palavras, e todos esses sentimentos estão apunhalando meu peito como cacos de vidro, e não confio em mim com esses cacos por dentro.

"Um desperdício de vida, disse ele.
Espero que Deus tenha valido a pena."

Os sinos para as Completas tocam e saio da minha cela, esperando que as canções e orações familiares limpem o vidro do meu peito e sangrem a raiva do meu sangue.
Yibo também não está nas Completas e me sinto tão cheio de todos os meus próprios sentimentos, nem um pouco vazio como gostaria de estar, e minhas mãos tremem um pouco enquanto viro as páginas do meu breviário.

Não escondas de mim a tua face, nós cantamos. E mais tarde: Ouve-me depressa, ó Senhor; o meu espírito desfalece.
Faze-me saber o caminho que devo seguir, porque a ti elevo a minha alma.

O sol está descendo pelo céu quando saio da igreja com meus irmãos, e o calor do dia finalmente começou a diminuir. Todos estão de bom humor e vários irmãos decidem tomar um copo antes do sono na área de piquenique, e vários outros vão dar uma caminhada até o celeiro para ver o novo galpão construído pelo irmão Amos.
Estão falando em comprar galinhas e cabras para adicionar às nossas três vacas leiteiras, e posso ouvir o irmão Titus e o irmão Thomas já argumentando porque precisaríamos de um cão na abadia (ou quatro) se tivermos mais animais de fazenda.
Eu não acompanho nenhum deles. Em vez disso, vou para o claustro sul, que está completamente vazio, e encontro meu banco favorito. Sento-me e espero.
A fonte goteja suavemente e uma brisa passa pelas passarelas cobertas balançando as flores. O céu muda lentamente acima, de um azul brilhante para um azul pálido com listras alaranjadas, rosa e lavanda. Vejo a primeira estrela agora, piscando no céu.
Em meu primeiro ano aqui, quando eu não era nada além de um cesto de roupas sujas de sentimentos, o irmão Connor me contou sobre um livro que ele leu por um monge Getsemâni, que escreveu sobre como a abadia acabou se tornando não apenas o recipiente para seus pensamentos, mas a forma deles também..

— Um dia você vai acordar e perceber que seus pensamentos têm a mesma forma de seu carvalho favorito, — explicou o irmão Connor.
— Ou das margens sinuosas do riacho. Eles vão ecoar ao toque do sino. Vão vibrar com o vento da pradaria.

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