DEZESSEIS

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     DO CADERNO DE WANG YIBO.

O silêncio incessante e a introspecção ininterrupta estão tendo um efeito indesejado em mim. Estou ficando muito consciente dos meus atos. Estou começando a perceber que não estou aqui apenas pela cerveja e pelo anticapitalismo.
Fico lembrando daquela chave no pescoço dele. Sobre o que pode estar ao redor de seu pau.
Não consigo parar. Não consigo parar.
Não quero parar…

Aqui está uma coisa que acho que ninguém sabe além de mim: tenho estado muito ciente da existência de Xiao Zhan desde que ele tinha dezoito anos. Acho que veio devagar com o tempo, pequenos momentos em que percebi que ele estava ficando alto, que precisava se barbear, que sua voz estava engrossando, mas essas coisas eram fragmentos de observações, nadando em um mar de lembranças do que ele era, o indelével irmão mais novo de Zhuocheng. Houve momentos - breves - em que o peguei olhando para mim, quando vinha atrás de nós, momentos que talvez o melhor amigo de qualquer outro irmão mais velho teria atribuído a uma paixão adolescente.
Mas não havia como manter Xiao Zhan longe das garotas – nem mesmo quando ele tinha idade suficiente para mostrar suas covinhas - e então achei que devia estar imaginando coisas. Senti-me aliviado na hora, agradecido por não haver nenhuma consequência estranha por, com gentileza, ter dado um fora naquele recém-não-mais-um-bebê.

Cinco anos. Cinco anos entre nós, e eu já estava na faculdade àquela altura, compensando o tempo católico perdido trepando o máximo que podia.
Mas aqui está a questão sobre cinco anos: os números permanecem os mesmos, mas a equação muda. E quando fui à casa dos Xiaos uma noite e vi Zhan perto da piscina, percebi que a equação tinha mudado de alguma forma, sem que eu soubesse. Porque no ano desde que o tinha visto, desde que me formei na faculdade e ele estava prestes a começar, ele mudou tanto que cinco anos pareciam quase nada.
Lembro que não conseguia parar de olhar para ele pela porta de vidro do pátio enquanto Zhuocheng pensava sobre que camisa vestir e continuava jogando mais gel em seu cabelo. Eu não conseguia parar de observar o corpo de Zhan, seu rosto, o movimento constante, pulando, mergulhando, nadando. Levantando-se para fora da água com os ombros recém-expandidos e as costas musculosas e esguias.
Ele estava nadando de samba-canção em vez de sunga, e ela se agarrara em todos os lugares - na curva de sua bunda, na protuberância de suas coxas, em seu pau - e o cós estava puxado para baixo me deixando ver onde a linha escura de pelos trilhavam sobre sua barriga até encontrar os pelos acima de seu pau.
A água escorria sobre os novos músculos de seus braços e pingava em seu queixo bem formado. Escorria pela extensão da garganta, grudava o cabelo escuro na testa e no pescoço. Juntava-se no umbigo plano antes de derramar.
E a maneira como ele se movia. Todo o corpo, toda a força, totalmente empenhado para o que quer que ele fizesse. Mergulhar, virar, não para se exibir, porque não havia ninguém para se exibir, pois ele não sabia que eu estava olhando. Fazia por si mesmo. Pela pura alegria e emoção.

Deixei a casa dos Xiaos naquela noite com um segredo. Um segredo com nome. Xiao Zhan.

Xiao Zhan em meus pensamentos,  rastejando em minhas fantasias e devaneios e ses. Uma atração pelo irmão mais novo hétero do melhor amigo. Era quase como uma piada, como uma cena de um pornô. Era uma má ideia, de qualquer lado que eu olhava.
Ele ainda é uma má ideia.
Ele ainda é uma má ideia.

Ele é uma má ideia e um monge e me fez sofrer e estou prestes a me casar, então por que estou aqui sentado em um mosteiro, minha mente percorrendo milhares de e ses?
E se a chave em seu pescoço for para o que acho que é? E se ele estivesse prestes a me beijar naquela noite no claustro? E se ele não estivesse?
Porque eu vi, não vi? Aqueles vagalumes no claustro? O jeito como ele olhou para eles?
Achei que era impossível conciliar aquele calouro esguio e rebelde - aquele milionário imprudente, aquele homem adorável e irritante que carregava granulados no bolso só para mim - com este homem gigante e quieto que observa com reverência e paciência vagalumes dançar.
Achei que era impossível, e agora estou me lembrando daquele jovem universitário Zhan se jogando na piscina de pura maldade, com nenhum outro propósito a não ser viver o momento, e eles estão mesmo tão distantes um do outro? Aquele calouro descuidado e este monge com os mais tênues vestígios de fios brancos nas têmporas?
Ou talvez não seja o quanto esses dois Zhans estejam próximos ou distantes. Talvez seja outra coisa.
Talvez sejam os vagalumes.
E se forem os vagalumes.
E se eu fosse e o encontrasse agora.

(....)

Santo DesejoWhere stories live. Discover now