Capítulo 2: O Bode

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Acordo no meio da noite, com uma luz vermelha estranha vindo das frestas da janela. Abro os olhos, e levanto, ainda um pouco sonolenta, tentando descobrir o que era. As meninas dormiam pesadamente em suas camas, e o silêncio da noite dominava o ambiente.

Percebo que a luz está vindo de fora do orfanato, por um momento desisto de investigar. Se a madame Pierce me vê saindo da cama essa hora da noite, não quero imaginar do que ela seria capaz para me castigar.

Quando decido voltar para a cama, já sem sono e me preocupando como voltaria a dormir, vejo uma silhueta bizarra na janela, e com um gesto grotesco, me vejo puxada em direção a janela. Fecho os olhos com medo e o vidro é estilhaçado com meu corpo sendo jogado contra ele.

Fico atordoada e sem conseguir respirar por ter caído do segundo andar da construção, minha visão está turva, e sinto meus batimentos aumentarem a cada segundo que passa. Percebo vários cortes por todo o meu corpo, e vidros fincados na minha pele. Tem sangue por todo lado, sinto uma dor aguda.

A luz agora está mais forte, me impedindo de abrir os olhos. Mas ouço um barulho. Um grunhido vindo das sombras.

Tento abrir os olhos, e vejo a terrível imagem de um bode, em pé, com chifres enormes e garras assustadoras. Ele sorri maléficamente para mim. Dou um grito abafado por uma força maligna. Tento me levantar mas sinto todo meu corpo doer devido a queda. O bode se aproxima de mim.

Grito mais uma vez, e agora me vejo na cama, com Chiara e Aurora do meu lado me perguntando o que tinha acontecido.

- Calma Grace, o que foi? Você teve um pesadelo? - Disse Aurora.

As meninas do quarto acordaram com o meu grito, mas vejo que já é de manhã.

- Acho que sim, preciso de um tempo para respirar. - Digo ofegante.

- Tudo bem, Grace. Mas seja rápida, daqui a pouco é o café da manhã, e você sabe que a madame Pierce não gosta de atrasos. - Disse Chiara

Minhas amigas me dão um abraço breve, mas reconfortante, e vão trocar de roupa.

Foi só um pesadelo Grace. Digo a mim mesma. Ótimo jeito de começar uma semana.

Consigo levantar da cama. Estico os lençóis e dobro os cobertores. Vou a minha cômoda pegar meu uniforme e parto para o banheiro a fim de tomar um banho e tentar esquecer do sonho horrível que tive. A água estava quente, o que me conforta. Tomo um banho breve e coloco minhas roupas. O clima hoje permanece o mesmo, gélido, e caindo lindos e branquinhos flocos de neve do céu. Decido então colocar mais roupas para enfrentar o clima.

Desço as escadas e vou ao refeitório. Todas as meninas estavam lá, e madame Pierce me olhava com raiva.

- Atrasada mais uma vez, senhorita Grace.

Abaixo a cabeça, sabendo que não importa o que eu diga, serei castigada.

- Sentem-se por favor, meninas. - Diz ela

Me surpreendo com sua fala, mas logo percebo o porquê. Philip entra pela porta do refeitório com um aberto sorriso, nos dando bom dia. Trazendo consigo uma enorme cesta de café da manhã, com diversos pães, croissant, doces e bebidas quentes.

- Decidi fazer uma surpresa a vocês hoje, meninas. - Disse Philip calorosamente.

- Isso tudo é pra gente? - Perguntou Sophia empolgada. Ela é a mais nova do orfanato. Tem 6 anos. Só anda com a Mia, por terem idades próximas.

- Claro que sim! Podem se deliciar, meninas.

Philip dispõe o café da manhã na mesa, todas nós nos sentamos e aproveitamos tudo o que tínhamos direito. Dava para ver que a madame Pierce não estava gostando nada daquilo, mas Philip era um bobo, sequer percebeu.

- Meninas, o orfanato passará por uma reforma, reparei que suas camas já estão velhas, as paredes descascando e o piso faz barulho ao passar por cima dele. Durante este período, vocês ficaram hospedadas na minha casa.

Ao ouvirmos essa boa notícia, todas comemoramos com pulos e gritos de alegria.

- Meu amor, será mesmo necessário? Eu tenho uma residência não muito longe daqui, é grande o suficiente para elas, assim não precisaremos doar nossa privacidade. - Disse madame Pierce com um sorriso no rosto.

- Bem, isso não estava nos meus planos. Irei verificar a casa. Se for comportar todas, então vocês ficaram lá.

Nos entre olhamos, mas não dissemos nada.

- Não se preocupem meus amores, a titia vai resolver tudo logo logo. Agora vocês podem ir para a escola. A Van já está esperando. - Disse a Madame Pierce.

Me da nojo ver ela falando desse jeito, é bem óbvio a falsidade dela, está estampada em seu rosto. Vou em direção a saída do orfanato junto das outras meninas.

Amélia passa bem na minha frente e coloca o pé entre meus passos, despenco com o rosto no chão. Ao levantar vejo sangue. Um ódio passa por dentro de mim, essa menina me aguarda.

- O que está acontecendo aqui?! - Diz madame Pierce irritada.

- Amélia colocou o pé para Grace tropeçar! - Disse Savannah, que viu toda a cena.

Philip já havia ido embora, então agora madame Pierce poderia voltar a ser ela mesma.

Coloco a mão sobre meu nariz e sinto uma dor forte. Sinto também um líquido saindo, era sangue.

- Amélia e Grace, vocês vem comigo. O restante quero direto para a escola.

As meninas se olham, com medo do que fazer.

- Agora! - Gritou a madame.

Todas saíram correndo do orfanato, sobrando apenas eu, Amélia e essa mulher. Ela me da um pano umedecido e pede para eu colocar no nariz. Tento estancar o sangue, mas sem sucesso.

Enquanto isso, vejo ela pegar no braço de Amélia com força e a levar para a sala da diretoria. Após um curto momento, ouço a menina gritar. São gritos de dor, e a todo momento ela implora para madame Pierce parar.

Ela volta com Amélia, e vejo uma queimadura feia em seu braço.

- Vamos ao hospital. As duas.

Por um momento senti um pouco de pena dela, seu rosto estava inchado de tanto chorar, e a queimadura parecia grave. Ela não merecia isso.

Enquanto caminhávamos até a saída do orfanato, sinto um calafrio percorrendo minha espinha, e com minha visão periférica vejo uma sombra. Era aquele bode.

O orfanato de Madame PierceOnde histórias criam vida. Descubra agora