Capítulo 2

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Impacientemente, Peter Pan esperou que Carolina tomasse banho. Enquanto isso, ficou bisbilhotando as coisas que compunham o quarto da menina. Sem ter a mínima noção do que estava fazendo, apertou várias teclas do computador, e levou um susto quando o aparelho respondeu seus cliques com um som alto.

Quando Carolina voltou para o quarto, Peter Pan estava em posição de luta, encarando o computador com espanto.

—O que você fez? —Ela cruzou os braços. Usava uma blusa verde por baixo de sua jardineira preferida.

—Nada. —Ele percebeu a pose ridícula em que estava e se corrigiu.

Com um sorriso vitorioso, ela desligou o computador, dando adeus às fotos do apartamento.

—Sininho, traz o pó! —Ele berrou, perto da janela.

—Garoto! Não se grita uma coisa dessas aqui! —Ela deu um tapa no ombro de Pan.

Mesmo a contragosto, Sininho assoprou pozinho mágico na menina, que rapidamente conseguiu tirar os pés do chão. Eles flutuaram para fora do quarto e Carolina fechou a janela.

Nem com a melhor oratória do mundo ela seria capaz de descrever a sensação de voar. Talvez aquela não era uma coisa para se explicar com termos acadêmicos e rebuscados, mas sim para aproveitar como uma criança faria.

—Não sei aonde estamos. —Peter colocou a mão no queixo e olhou em volta.

—Aqui é o Brasil.

—Nome engraçado. Fica nos arredores de Londres?

—Fica do outro lado do oceano, Peter.

Sininho disse no ouvido de Pan que sabia o caminho de volta, aproveitando para tagarelar alguns insultos sobre Carolina.

—A Sininho vai nos levar até lá.

A menina não confiava completamente na fada, mas a seguiu mesmo assim. O brilho que Sininho emitia passou a guiá-los através do céu noturno, rumo à Terra do Nunca.

—Eu achei que já estava na hora de dormir. Por que cheguei tão cedo? —Ele disse, ao avistar crianças brincando na rua.

—Por causa do fuso horário. Londres está quatro horas à frente do horário de Brasília.

—Você só fala besteira. —Ele fez uma careta. —Mas vem cá, você também não tem mãe?

—Tenho. Ela e meu pai viajaram a trabalho e chegam amanhã à noite.

—Trago você de volta antes disso.

—Meu aniversário é depois de amanhã. 

—Quantos anos você vai fazer? —Ele perguntou, com um pouco de desgosto na voz.

Peter não gostava nadinha da palavra aniversário. Ainda estava triste por ter ficado sem os Meninos Perdidos, e mais ainda por não ter sido convidado para nenhum dos aniversários deles.

—Dezoito.

—Então, em menos de dois dias você não vai mais ser criança? Que horror!

—Também acho péssimo, Peter.

—É incrível ser a única criança que nunca cresceu. —Ele deu um sorriso travesso e a menina revirou os olhos.

Eles continuaram a voar em alta velocidade. Aos poucos, Carolina foi pegando o jeito da coisa e parou de se mover como um pássaro desgovernado.

Ela tomou um susto ao avistar o Cristo Redentor, bem à sua frente. De carro, aquele trajeto teria demorado muito mais. Era realmente possível terem viajado tão rápido ou ela não havia percebido o tempo passar?

—Uau, esse homem deve ter feito uma coisa muito grandiosa para ter uma estátua dele desse tamanho. —Peter observou, voando em círculos ao redor do monumento.

—Você nem imagina o que Ele fez por mim. —Ela disse baixinho, sorrindo.

Após admirarem tão imponente figura, retomaram o caminho.

Quando perceberam, estavam sobrevoando a praia. Peter Pan voou pertíssimo do chão, pegou um punhado de areia e jogou em Carolina.

—Ei! Isso não se faz!

—Boboca! —Ele estava com a mão na barriga, enquanto gargalhava.

Amar o Peter personagem era fácil demais. Difícil era conviver por mais de cinco minutos com o Peter real. Se não se segurasse, voltaria a considerar a ideia de quebrar uma vassoura na cabeça dele.

Ainda se adaptando à habilidade de voar, ela se aproximou do mar e tentou jogar água no garoto, mas ele desviou com a maior facilidade do mundo.

—Péssima pontaria! —A cada gargalhada que dava, ele conseguia ficar mais irritante.

Ela virou o rosto e fez uma careta para Peter Pan. Antes que voltasse a olhar para frente, sentiu algo se chocando contra seu corpo.

Era um pássaro. A gravidade o levou por alguns metros, mas ele logo voltou a bater as asas, ainda desnorteado.

—Não olha por onde voa? —Ao invés de rir, ele se irritou. Peter Pan amava os pássaros.

—Idiota.

—Por que começou a chorar naquela hora? Foi a Sininho puxando seu cabelo? Ela é mal-educada mesmo, não liga não.

—Um menino, dizendo ser o Peter Pan, aparece no meu quarto dois dias antes de eu "crescer". —Fez aspas com os dedos. —Pensei que estivesse perdendo o juízo antes mesmo de começar a faculdade.

Peter não comentou nada. Não sabia o que era uma faculdade, muito menos entendia o nervosismo da menina. Ele nunca experimentaria a sensação de estar beirando a maioridade.

—Qual o seu nome?

—Carolina, mas pode me chamar de Carol.

—Não, não gostei. Prefiro Lina.

—Tanto faz.

Foi nesse momento que eles viraram na segunda estrela à direita. Agora só precisavam seguir em frente até o amanhecer. E isso parecia muito cansativo. De vez em quando, Peter acenava para algumas constelações e a menina podia jurar que elas piscavam de forma sincronizada em resposta.

—Você foi até Wendy e seus irmãos porque gostava de ouvir as histórias que ela contava. Mas e eu? Por que veio logo na minha janela?

—Você parecia meio borocoxô.

Carolina franziu a testa.

—É. Eu fui parar naquele lugar esquisito e fiquei voando, procurando a Wendy. Quando vi uma contadora de histórias triste, tive que entrar.

—Como sabe que gosto de contar histórias? Não faço isso há algum tempo.

—Ah, eu sempre reconheço uma boa contadora de histórias.

A menina sorriu e revirou os olhos.

Olhe Para o Pé de BatatasWhere stories live. Discover now