12. Mês das Noivas

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OBS: Conteúdo sensível.

Priscila se olha diante do espelho vintage e redondo pendurado na parede de seu quarto. Delicadamente seus dedos longos e finos encaixam a coroa na cabeça. Seu olhar de vitória e esperança refletem a sua imagem. Um sorriso próspero brota de modo delicado e puro em lábios Seu vestido de noiva é tão pesado e frio, entretanto, combina bem com sua pele. Uma doce garota cheia de expectativas perante a vida de casada. Seu desejo antigo será realizado tão brevemente, que nem o sol apropriadamente aparente em dias alegres, conseguirá estar mais animado do que ela. De repente, num piscar de olhos, a força do vento abre a janela com violência tirando-lhe a concentração. Seu olhar se volta para a janela de madeira branca, e um sopro gélido preenche o quarto. O sol ainda refulge, e nada parece coerente. O óbvio do vento forte faz Priscila desconfiar. Aquilo, para Pri, é um presságio. Estimulada pela curiosidade, mesmo estando assustada, ela saí de onde está e um caminhar temeroso se inicia. Ao se aproximar do parapeito, a porta se abre sorrateiramente. Lentamente sua cabeça se inclina em direção à porta, e a sensação de pânico acelera uma reflexão sobre seu passado. Um rosto tão familiar a encara, mas ela não o reconhece. Como alguém tão íntimo dela pode encarnar uma sombra tão irreconhecível? Tudo fica mais frio e tortuoso. Um buraco negro adormece vagarosamente no quarto, deixando os ocupantes cegos. Priscila se olha diante do espelho e o susto passa. A moça encaixa a coroa na cabeça e seu olhar de vitória e esperança se refletem de modo vivido à sua frente. Seu vestido desconfortável abraça seu corpo rígido. Ela força sua visão perante ao seu reflexo e observa a riqueza de detalhes que antes ali não estavam: o musgo verde brota sem nenhuma dificuldade por todo o cetim branco. A nova coloração combina com seu tom de pele cinza. Uma laberíntica espiral de déjà vu atormenta gradativamente sua mente. A janela se abre, e Priscila novamente se assusta, como se fosse a primeira vez que o vento relutante se rebelasse contra a janela. Antes de alcançar a janela, a mesma para no caminho, e encara uma poça de água, bem abaixo de si. A escuridão percorre o quarto, antes mesmo do rosto tão familiar surgir por detrás dela. O gosto do fim ocupa sua boca. O cheiro do perfume atrás da porta invade suas narinas de um jeito agressivo. A sensação do que foi e ainda é, aprisiona um pânico generalizado em seus gestos. Ela está imóvel. Ela quer correr, gritar e ter um final diferente. As lágrimas querem ser livres ou talvez desnecessárias, entretanto, estão em estado de choque, assim como ela. Priscila novamente se recorda minuciosamente de como tudo irá proceder antes mesmo da sombra engolir o fio de esperança do seu "felizes para sempre". A moça já sabe: a janela não será fechada, o rosto nebuloso vai dizer que a ama, seu tapete azul, agora decorado, como um quadro abstrato em tom vermelho sangue. Um museu de um crime bem exposto diante de seus olhos antes que se fechem. Um leve suspiro rabisca seu último segundo de vida. Ela será envolvida eternamente nas fibras macias e delicadas de seu tapete. E, finalmente, ela estará acomodada na cadeira bem a frente do espelho pela milésima vez daquele um ano de sua morte.

Autora: Giovana Pinheiro

Surto Literário: Devaneios da LCWhere stories live. Discover now