65 - Prazer Sem Conhecer

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- Charlie, o que você acha de ir para casa descansar um pouco? - Niall propõe assim que caio no sono pela quarta vez, enquanto continuo sentada na cadeira de plástico que fica encostada à parede.

Já amanheceu e nem o sol quis dar as caras por hoje. Houve até a fração de um brilho, porém ela foi ofuscada pelas cinzentas nuvens que traduzem o que estou sentindo neste momento.

- Não, quero ficar aqui. - Me aconchego na minha suposta cama improvisada, escondendo minha cabeça embaixo da toca do moletom que Louis me emprestou antes de ir para o apartamento descansar um pouco.

- Vamos Charlotte. O médico disse que ele só poderia receber visitas quando for transferido para outro quarto. - Insiste.

Fiquei somente cinco minutos dentro daquele quarto cheio de tubos e máquinas, pois o doutor disse que aquele era um lugar restrito à médicos e familiares. Tentei pedir para ficar mais um pouco, mas Gemma também queria entrar e ver o seu irmão e por isso, não tive como discutir.

Vê-lo daquela maneira partiu meu coração em pedacinhos. Nem as brigas mais feias que tivemos, tiveram uma reação tão negativa quanto ao que eu tive quando o vi daquela maneira. Não foi sua perna quebrada, ou os machucados espalhados pelo seu rosto e pelo seu braço, foi a maneira como ele estava. Assisti-lo dormir era uma de minhas coisas preferidas, mas agora, depois de vê-lo tão fragilizado, acho que nunca mais vou deixa-lo dormir em paz, sem que eu o acorde a cada cinco minutos para conferir se ele está bem ou não.

- Não me importo, vou ficar aqui até ele acordar. - Cruzo os braços e fecho os olhos, demonstrando que não adianta insistir nisso.

- Então pelo menos come alguma coisa. - Ele estende um saquinho com algumas bolachinhas de chocolate.

Abro um dos olhos e pego uma. 

Niall se senta na cadeira ao meu lado e eu apoio minha cabeça em seu ombro, mastigando lentamente a bolacha e sentindo um gosto um pouco amargo do chocolate. Tenho que fazer um pouco de esforço para engolir por conta da garganta seca, mas consigo fazê-lo e logo Niall me oferece outra.

- Isso é uma droga, sabia? - Comento, observando uma velhinha entrar, apoiada em um homem mais novo que parece ser seu filho. Ela tem a mão em seu peito e sua postura é curvada, revelando alguma dor ou desconforto que deve estar sentindo. Um médico e uma enfermeira aparecem com uma cadeira de rodas e a fazem sentar lá com toda a calma e cuidado possível. - Por que acidentes acontecem? Por que ficamos doentes? Deveríamos ser invencíveis, somos seres humanos, temos muitas coisas para viver, um acidente ou uma doença não deveriam tentar nos impedir disso.

Sei que nada mais grave vai acontecer com Harry, tenho certeza de que em alguns dias, ou talvez em algumas horas, ele vai acordar. Mas parando para pensar, muitas pessoas não tiveram a oportunidade de um futuro, pois foram impedidas de sequer pensarem nisso. Minha mãe, por exemplo, tiraram a vida dela sem que ela pudesse sequer saber o que é ser mãe ou esposa. Ela era incrível, mas ainda assim, muito jovem para que fosse levada embora.

- A vida é injusta, Charlie. - Niall diz. - Todos estão sujeitos a acidentes ou doenças, infelizmente, não podemos controlar quem fica ou quem vai, apenas devemos aprender que enquanto durar, será o suficiente para se dizer adeus. 

- Nós não deveríamos ter de dizer adeus. - Digo.

- Então pense que é um até logo. O futuro de vocês pode se cruzar, mas que em linhas opostas.

- É, mas continuo achando tudo uma grande droga.

Dizem que o tempo é relativo e que não importa quantos anos você viva, mas sim quais serão as experiências que se adquiriu enquanto viveu. Mas ainda não entendo porque algumas pessoas tem de sofrer tanto, se no final das contas, ela acabará se tornando talvez uma fumaça no meio do nada ou simplesmente uma estrela, assim como meu pai disse que minha mãe virou.

I Miss You       H.S.Onde histórias criam vida. Descubra agora