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Não sei ao certo quanto tempo passei ali, encolhida contra a porta de vidro da sacada, catando os meus pedaços. Aquilo era tão pateticamente contraditório que seria cômico, se não fosse trágico. Passei a mão pelo rosto, e o senti ainda molhado. As lágrimas ainda escorriam, agora sem que eu as percebesse. Nada, nada estava sendo como eu havia idealizado. Apesar de saber que eu havia vencido, ou ao menos cumprido aquilo à que havia me proposto fazer, eu não me sentia feliz. Muito pelo contrário. Toda a angústia que eu jurava não existir mais, me envolvia de uma forma tão vertiginosamente dolorosa que a vitória realmente tinha perdido seu gostinho doce. Aquilo doía. De verdade.

Quando o telefone tocou lá dentro, eu não fiz menção de antender. Entretanto, o som insistente teve o poder de atiçar ainda mais os meus nervos já em frangalhos. Deslizando contra a porta, me ergui e segui até ele.

Dulce: te acordei?

Anahí: não.

Dulce: liguei pra te chamar pra almoçar. Topa?

Anahí: não tô com fome.

Dulce: tá tudo bem?

Anahí: tá. Quer dizer - suspirei, me deixando cair sobre o sofá -, não sei.

Dulce: o que foi que aconteceu? - perguntou, preocupada. - Está doente?

Anahí: mais ou menos isso.

E não era mentira. Eu realmente não me sentia a pessoa mais saudável do mundo naquele momento.

Dulce: se isso é uma desculpa para fugir da viagem, devo avisá-la...

Anahí: ele descobriu - interrompi, cuspindo a informação perdida em meio ao assunto.

Dulce: como?

Anahí: Alfonso. Ele descobriu quem eu sou.

Silêncio.

Dulce: tô indo praí.

E eu precisava que ela viesse.

                                                     • » Chicago, Illinois

                                                        Dez anos atrás

Todo meu corpo doía quando recobrei a consciência na manhã seguinte. Mas aquilo, ao invés de me perturbar, fez com que um sorriso deliciado se estendesse por meus lábios, antes mesmo que meus olhos se abrissem. Tinha acontecido. Eu não era mais virgem. E por mais piegas que pudesse soar, eu era de Alfonso. Agora em todos os sentidos. Incluindo o melhor deles. Suspirei e evitei, ainda por alguns segundos, abrir os olhos e encarar a claridade que podia sentir transpassar minhas pálpebras fechadas. Estendendo o braço para o lado da cama em que ele dormira, me mantendo aninhada por toda a noite, toquei o vazio. Abri os olhos. E minha consciência gritou, mandando todo aquele lenga, lenga romântico que nublava meus pensamentos para o ralo. Era dia claro, talvez já passasse das dez da manhã. E eu estava na casa de Poncho, no quarto de Poncho, com os pais de Poncho no quarto ao lado (ou não mais) e, percebam, completamente sozinha. E perdida. O desespero começou a embaralhar minhas ideias sempre tão práticas e inteligentes. Quem, diabos, teria a capacidade de se manter lógica e centrada quando se corria o risco de ser pega em flagrante depois de ter cometido atos altamente pecaminosos na casa alheia? Não eu, obviamente.

O Pecado Mora Ao LadoWhere stories live. Discover now