SETE. E Se Você Morrer?

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Medeia despertou. Dores por todo o corpo causadas pela queda. Suas mãos, seus joelhos e cotovelos estavam ralados e ardidos. Ela se virou para o lado. Isadora estava encolhida e deitada de costas para ela.

- Minha filha? – Mesmo após os ataques recebidos, foi o primeiro instinto de Medeia, instinto de mãe, saber se ela estava bem.

Isadora se virou rapidamente e já tinha um pedaço de rocha em sua mão que ela bateu contra o nariz de sua mãe.

Isadora tentou engatinhar na grama para longe, mas Medeia – agora com sangue escapando de seu nariz – a segurou pelas pernas. Isadora se debatia lutando por liberdade, mas Medeia conseguir deitar sobre a sua filha, imobilizou as suas mãos.

- O que aquele homem maldito fez com você? No que foi que ele te transformou? – Medeia perguntou.

- ELE É MEU!

- Isadora, você teve relação sexual com o Joel? Fale agora!

- VAI ACONTECER. Ele irá me beijar, irá me tornar mulher, eu serei inteiramente dele!

Foi quando Medeia entendeu. Joel falava a verdade. Nada havia acontecido entre eles.

Isadora não perdeu tempo. Aproveitou a ligeira distração de Medeia e projetou um chute entre as pernas dela. Medeia rolou para o lado, na grama e Isadora correu para dentro da casa pela porta dos fundos.

- Lembra quando eu cantava para você? Quando eu contava histórias para que você não tivesse mais medo dos monstros no escuro quando você dormia? – Medeia perguntava correndo atrás dela casa à dentro.

Quando Medeia chegou ao corredor, Isadora saltou de dentro da cozinha atacando com duas facas grandes dessa vez. Ela sacudia as facas afiadas como uma louca no ar, tentando enfiar as lâminas dentro do corpo de sua mãe a qualquer custo. De repente elas travavam aquela luta na sala e Isadora jogou a primeira faca, jogou a segunda faca e as duas voaram e se cravaram nas almofadas gordas sobre o sofá.

Em desespero, Isadora partiu para cima de sua mãe distribuindo tapas, chutes e socos. Mais uma vez Medeia conseguiu segurá-la e começou a beijar os cortes nos ombros e braços dela provocados pela queda pela janela do andar de cima. Tentava eliminar a dor, tentava acalmá-la.

- Já chega minha filha. Pare. Esse homem envenenou a sua alma.

- Eu vi vocês dois. Ele quer você, ele quer o seu corpo de galinhona velha, mas você nunca terá o Joel para você!

Isadora deu um grande tapa na bochecha direita de sua mãe, outro tapa forte na bochecha esquerda e então Medeia a segurou pelo cabelo. Medeia socou a testa de Isadora contra a mesinha no canto. Uma, duas vezes, depois arrastou a cara dela pela mesa, derrubando tudo por cima dela e jogou a sua filha longe.

Isadora levantou e naquele mesmo instante tinha uma tesoura pesada, pontiaguda, de ferro na mão, que ela meteu na barriga de sua mãe. O sangue fugiu do corte no mesmo segundo. Medeia pegou o grande prato de vidro sobre a outra mesinha e o quebrou batendo na cara de Isadora com ele. As duas encontraram o chão. Medeia não conseguia andar mais com todo aquele sangue escapando pelo corte profundo da tesoura enterrada em sua barriga e foi se arrastando até sair pela porta da frente. Isadora apareceu atrás dela quando Medeia alcançou o jardim da frente da casa, suas mãos cheias de sangue sujando a grama de vermelho enquanto ela se arrastava. Com cacos de vidro grandes enfiados em seu rosto, Isadora deu um forte chute na cabeça de sua mãe e Medeia apagou.

Quanto tempo passou? Ela nunca saberia. Medeia foi abrindo os olhos muito devagar. Nunca faria ideia da quantidade inacreditável de sangue que havia perdido. Atirada sobre a grama do jardim ela olhou para trás. A porta da garagem estava escancarada e o carro do seu marido não estava mais lá. Também havia uma meia dele jogada por ali. Um carro vermelho chegou, estacionou. Era Noemi. Ela saiu de seu carro gritando e levando as mãos até a cabeça, correndo em direção a Medeia para prestar socorro, mas Medeia perdeu os sentidos outra vez.

A noite.

- Eu não quero hospital nenhum. Cala essa boca. Eu não quero hospital! – Medeia brigava com Noemi enquanto tinha o corte profundo em sua barriga sendo limpo e costurado por ela. – Você é uma enfermeira.

- E você é uma doida. Está com febre, está fraca. E se tiver uma infecção? E se você morrer?

- Eu sou durona. Preciso lembrá-la de como eu consegui dar a luz à Isadora sozinha porque não tive tempo de chegar à clínica?

- Antes não tivesse conseguido. Antes aquela micro puta nem tivesse nascido. A tua filha tentou matar você! – Noemi esbravejou.

- Você confirma? Confirma que o armário dela está vazio? As coisas do Neto também sumiram? A minha filha e o meu marido foram embora sem deixar rastro?

- Que seja. Você é durona. Não foi o que acabou de dizer? Pois então recomece.

- Eu te avisei sobre o que eu pressentia. Você lembra? Eu pressentia uma tempestade horrenda chegando. E veja o que a tempestade fez. Levou tudo o que eu tinha. O que restou da vida que antes eu conhecia? Eu perdi tudo. Eu sonhei com os altos prazeres sexuais que aquele jardineiro me proporcionava antes mesmo de conhecê-lo e... Pra quê? Foi um presságio? Uma premonição maldita de que ele entraria na minha vida para me atirar no meio do inferno? – E Medeia não teve mais forças para falar. Abraçou Noemi e chorou por muito tempo em seus braços.

Três semanas se passaram. Medeia mantinha as cicatrizes físicas e emocionais, mas botou um vestido justo e curto de veludo cor vinho, capa preta de pele de coiote, luvas brancas longas, óculos escuros, chapéu fedora e se meteu em seu carro preparada para o início de sua jornada.

- Você cuida da minha casa? Tem certeza de que pode passar um tempo aqui no campo e fazer essa favor pra mim enquanto abandona a sua vida lá na cidade? – Medeia perguntou para Noemi enquanto se despedia dela pela janela do carro.

- Eu faço isso por você, minha amiga, mas o que você planeja fazer é loucura. Eu continuarei dizendo para sempre. É uma grande loucura.

- É o que eu preciso fazer – E Medeia beijou Noemi nos lábios rapidamente. Partiu.

O cais. A lama, a umidade, o fedor de peixe, a escuridão. Nada havia mudado. Os sapatos de salto alto que Medeia usava não combinavam com aquele galpão escuro e fedido por onde ela agora entrava, andava. Joel virou-se, agora olhava para ela. Assim como o cais, Joel também não havia mudado nada naquelas três semanas. O corpo suado, definido, a expressão de macho cruel e insaciável.

- Eu odeio você – Medeia disse e deu uma bofetada nele.

Joel teve a sua própria e única maneira de responder o ato de fúria dela. Ele a beijou. Ele fez a sua língua invadir a boca dela de forma selvagem, mordeu o seu lábio, agarrou a sua bunda.

Medeia deu a segunda bofetada nele e continuou séria, concentrada.

- Ouça o que vou dizer e ouça bem. Você vai partir agora comigo. A nossa jornada começa. Você vai me ajudar a encontrar a minha filha. A culpa de tudo isso é sua e é a sua obrigação corrigir. Eu fui clara o suficiente?    

 Eu fui clara o suficiente?    

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O Jardineiro AmadoOnde histórias criam vida. Descubra agora