Dezessete - Capítulo 23

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"A infância não vai do nascimento até certa idade. A certa altura a criança está crescida deixando de lado as coisas de criança. A infância é o reino onde ninguém morre".

- Edna St. Vincent Millay

O primeiro beijo, a primeira festa, o primeiro porre, e para muitos, a primeira vez. Dezessete é uma idade de preenchimentos. Você pode achar uma pessoa ao qual desejará ficar junto pelo resto da vida. Há também a primeira desilusão, o primeiro fora, a primeira luta, quando suas ideias já estão sendo formadas por você mesmo, quando você percebe que sua vida não é a que seus pais sonharam para você, quando suas crenças mudam e continuam a mudar até que você tenha maturidade o suficiente para saber questionar e discernir. A primeira ressaca pode chegar aos dezessete, os primeiros sentimentos que começam a se confundir, quando você percebe que não é aquilo que achava ser. Aos sete você diz que ama seus pais, aos dezessete, você brada que os odeia.

Aos dezessete a sua vida é única, nos tornamos imortais... Até o ponto em que a vida fica mais difícil e você se questiona se não seria melhor deixar de viver, onde você chora e diz que você é um desperdício de espaço aproveitável, que você é um merda, que nunca vai chegar a lugar nenhum. Ei, se acalme, respire, chore. Você vai sim. Você é belo, sua vida é única, seus sonhos podem ser clichês ou aventureiros, eles são únicos.

Um risco profundo no pulso, uma corda no pescoço, um pote de comprimidos, uma bala na cabeça, um corte na jugular... No momento em que a faca risca a pele, não existe mais nada. Sem saída, sem esperança. Aquele se torna o jeito de você se virar contra o mundo quando o mundo se vira contra você. Você não para pra pensar que vale mais do que uma simples linha ininterrupta cavada funda em sua pele, que você vale mais do que aquelas pessoas estúpidas que se viraram contra você.

É uma sensação horrível a de se estar afundando com pernas e braços amarrados e ninguém pular para te salvar. É como se sentir sozinho em meio a uma multidão.

Mas essa não é a saída, você é forte para querer tirar a própria vida, mas também é forte para vivê-la belamente, não importa se você se torne um andarilho, que viva em um quarto de motel barato a cada cidade em que pare, ou se o carro se torne o seu lar, ou o seu lar seja uma barraca de camping. Você precisa viver rápido, de não desistir. Você precisa pular sem saber se existe água lá embaixo, se existe ao menos um chão firme.

Eu tento seguir isso todo dia, e cada dia é mais difícil que o outro. Então eu faço uma lista do que eu queria me tornar aos seis anos e comparo com o que quero ser hoje, se houver uma grande mudança na relativa, então parabéns, você pode ser o que quiser. Sem promessas vazias. E se tentarem te derrubar, finja que caiu. Só finja. A surpresa para eles virá depois.

A vida é relativa, aprendi isso após meus muitos fracassos.

Eu sentia meu corpo em um imenso, escuro e profundo vazio, estava frio ali. Era de congelar, percebi que morrer era um mergulho em um mar de infinitas esperanças e sonhos, eles passavam como ondas pelo meu corpo, morrer era se debater no fundo, nadar contra um tsunami. Era gelado.

Eu tive vontade de gemer, de choramingar, mas de quê isso adiantaria?

Eu já sabia qual era a sensação de ser beijado pelo cavaleiro negro de asas prateadas, a morte é tão temida. Tão bela. E de repente eu estava ali, já havia parado de me debater dentro daquele carro, já havia parado de gritar, mas ainda havia um resquício de ar. Mantive meu corpo sobre a água o máximo que pude, até que a última leva de ar fosse tragada violentamente pelas minhas narinas. Meus dedos retorceram-se enquanto arranhavam o forro macio do teto do carro.

Olhos AzuisOnde histórias criam vida. Descubra agora