Nelson estava tão concentrado que mal parecia se mover ou respirar. Ele era uma pedra no rio. Um olho estava fechado e o outro na mira de plástico, seu dedo estava pronto para puxar o gatilho da sniper de brinquedo. Uma gota de suor desceu por sua testa, mas ele não se moveu para limpá-la.
— Ignore tudo a sua volta. Não perca a concentração por nada. Até mesmo eu — sussurrou Cris no ouvido de Nelson.
Até sem ver, Nelson sabia que seu assistente sorria. Ele ignorou o melhor que pôde. Sabia que Cris só tentava fazer ele errar o alvo e vencer a aposta e tinha se preparado para tal. Mas não podia prever que Cris assopraria no seu ouvido.
— Pare com isso! — Nelson inclinou a cabeça e quase tirou as mãos do brinquedo para cobrir o ouvido. Ele conseguiu se controlar e não tirou os olhos da mira. — Sem trapacear!
— Não vou! Eu nunca faria algo tão baixo — mentiu Cris com sua voz inocente. — Só estou... me certificando de que você não vai perder sua chance, isso.
— A de vencer sua pontuação mais alta — murmurou Nelson alto o bastante para Cris ouvir.
— Ah? É isso? — Cris colocou um dedo no queixo e ergueu a cabeça. — Ah é, entendi agora. Hum, hum. Não percebi. É verdade que você pode vencer minha pontuação, mas isso só se NÃO ERRAR O TIRO!
Nelson flexionou as mãos por reflexo e seu dedo acabou apertando o gatilho. Ele assistiu, descrente, enquanto a bala errava o terrorista e atingia a filha do presidente, quem ele deveria salvar, bem perante seus olhos. A tela mostrou um GAME OVER em grandes letras brancas que foram cobertas por sangue. O nadador tirou os olhos da mira e levantou-se sem falar nada. Ele virou-se para Cris, quem falhava em esconder o sorriso.
— Tá feliz agora? Tá satisfeito? — Nelson acenou com a mão para a tela para um efeito dramático. — Está orgulhoso de uma vitória manchada por trapaças?
Cris não conseguia mais conter a risada. Nelson aguardou em silêncio com uma expressão vazia.
— Ah, qual é. Manchada por trapaças? Não seja um mau perdedor. Vitória é vitória. — Ele fez um V com os dedos, seu sorriso aumentando enquanto o nadador cerrava os olhos e balançava a cabeça. — Acredito que nossa aposta esteja empatada agora. Quer jogar o quê?
— Acha mesmo que vou deixar você mudar de assunto assim? — reclamou Nelson. Ele ainda estava bravo por perder, mas se divertia bastante, de todo jeito. Ele olhou em volta, procurando pelo próximo jogo para competirem. Seus olhos brilharam quando encontrou, o rosto se iluminando com um sorriso enquanto apontava. — Aquele!
Cris seguiu o dedo dele.
— Carrinho de bate-bate? Sério? Não dá pra saber quem vence nisso. Na verdade, nem é um jogo. Tenho a impressão de que você tá bravo e quer bater em mim — reclamou, mas ainda seguiu o nadador com um sorriso nos lábios.
— Faz anos desde que fui num desses — disse Nelson enquanto sentava no carro. Ele abriu e fechou as mãos no volante, seu sorriso aumentando enquanto as memórias voltavam. — Ah, vei. Acho que faz uma década.
Cris não conseguia tirar os olhos do sorriso de Nelson sem mostrar um sorriso gentil.
— É, eu também. Faz tanto tempo que só é uma lembrança agora — disse, pressionando os lábios. Levou um instante, mas quando o nadador se lembrou da fala, os dois riram.
— Você e suas referências — murmurou Nelson.
— Pois é, o capitão ficaria orgulhoso — disse Cris. — Então, como decidimos o vencedor?
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O nadador e o assistente
RandomO clube Prado Maranhão de desportos aquáticos, um lugar onde aqueles que miram o topo dos esportes aquáticos se juntam. Nelson, chamado no passado de garoto prodígio da natação brasileira, está perto de se recuperar de um acidente sério que quase ti...