Capítulo 26

857 137 81
                                    

"Há bondade no coração de todo homem machucado que chega até o ponto de perder tudo o que ele tem."
— Sleeping At Last,
Mars (Marte)


Narrado por Alyce

 Marte tem duas luas, uma delas se chama Fobos e é tão próxima dele que uma hora acabará explodindo. Owen era minha Fobos e o meu Marte, mas é como se eu fosse dependente da sua aproximação, da atração que há entre nós, mesmo sendo prejudicada por ela.

 Enquanto estou sentada num banco do campus da faculdade, parece que todos estão me olhando. Eu sei que isso pode não ser verdade, mas também sei que o diretor espalhou a notícia que irá receber a primeira aluna com traços autistas na sua universidade para se autopromover e para trazer boa reputação para o lugar onde dirige.

 O problema é que, como Alyson me explicou, além de estar sendo praticamente usada,  o meu nome apareceu em todos os jornais que correm pela faculdade, e sou uma das únicas pessoas novas por agora, porque a direção daqui nem quis que eu esperasse mais para começar a chamar atenção para a "caridade" deles.

 Duas garotas de cabelos loiros idênticos passam por mim com sorrisos falsos e com compaixão, e isso me faz perder o resto de paciência que eu guardei. Respiro fundo e ando para o lugar que eu suponho que não tenha ninguém.

 Entro num beco que fica entre dois prédios grandes e viro no fim, me escondendo atrás de um deles. Eu não devia sumir, Alyson está quase vindo me buscar, mas não quero ficar perto dos olhares que só veem um grande "Asperger" em mim. 

 Acho que a pior parte de ser como sou, é o fato de que muitas pessoas só veem autismo em mim e esquecem que, acima de tudo, sou uma garota (ou mulher) com sentimentos, mas elas também não podem me considerar completamente normal, porque eu me assusto até com o menor dos movimentos, assim como aconteceu com Owen.

  Owen.

 Eu queria me sentir normal de novo.

 Escorrego na parede até cair sentada no chão, fitando o cimento sujo na minha frente. Respiro fundo outra vez e me sinto mal, me sinto sozinha.

 Aos poucos, um perfume familiar se aproxima de mim e eu percebo que há alguém por perto, encostado na parede do outro prédio. Eu não ouso olhá-lo porque sei quem é, e ele obviamente sabe quem sou, mas temo que as batidas aceleradas do meu coração possam ser ouvidas por ele.

— A minha lua preferida é Fobos.

— O quê?

— A de Marte. É ela.

— Eu sei de qual planeta ela é. Achei que você só conhecesse a Lua.

—  Eu acabei pesquisando depois.

— Por quê?  

— Acredita em destino? —  ele não responde a minha pergunta. Eu demoro longos segundos para me pronunciar, e acho que ele pensa que não o responderei, mas algo dentro de mim se acende.

— Não, não o entendo.

— Você só acredita em coisas que entende?

— Praticamente. — ao mesmo tempo em que o meu coração parece bater de forma suave e gostosa, ele se encolhe cada vez mais.

 Estar tão perto de Owen faz com que as coisas piorem e melhorem ao mesmo tempo.

— Então você não acredita em destino? —  há certa frieza na sua voz que eu não me lembro de alguma vez ter ouvido. Nego com um aceno de cabeça —  Por que sempre nos encontramos, então?

Asp. - HiatusWhere stories live. Discover now