Capítulo 1

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Nem vem, Rubem! Não quero mais nada por hoje!
- Você quem sabe! Dispensando trabalho tá bem de vida!
- Vai se foder pra lá, velhão! Hoje é sexta, era para eu estar de folga e tô aqui!
- Só falei, está me vendo te segurar? Você pode ir e eu remarco o trabalho ou eu mesmo faço.
- Então já fui!!!

Desde que comecei a conciliar meu trabalho na editora com o estúdio não conseguia parar num barzinho como gostava de fazer às sextas feiras, e tomar meu chopinho em paz. Rubem adora quando eu não recuso trabalho, pois detesta que eu vá tomar meu chopp. Não, ele não é meu pai! Como vocês puderam observar páginas antes, o meu pai já faleceu. Rubem é o mais próximo de um irmão mais velho amoroso e atencioso. Ele que me tirou da merda que  (sobre)vivia. Devo tudo a ele.
Sentei no bar onde todos me conheciam, pedi meu chopp e aguardei meus amigos chegarem, porque eu sabia que eles viriam! Não me deixariam sozinha, eles nunca deixam, mesmo que eu já tenha provado para eles inúmeras vezes que não faria tudo que fiz novamente.

- Com sua licença, moça bonita!
- Sim.

Uma senhora morena e muito bonita de longos cabelos negros com alguns fios prateados me abordou com um grande sorriso e um farfalhar de saias coloridas. Eu conhecia aquela mulher? Não, acho que não.  Era o que faltava em uma noite de sexta feira calorenta? Claro! De todas as pessoas no bar ela vem abordar quem? Euzinha!
Não acredito nisso! Ainda existe ciganas lendo o destino por aí nos dias de hoje, pessoas?? É...pelo visto!

- Senhora, me desculpe, mas não acredito em leitura de mãos e essas coisas...
- Pois eu também não! Podemos agora dar uma palavrinha?
- Não.
- Tudo bem, mas vou falar assim mesmo, minha menina! Você pode não querer ouvir, não acreditar, mas preciso falar. Poucas vezes isso acontece comigo.
- Ha Ha ha! Uma cigana com poderes aleatórios - debochei da senhora gargalhando.
- Você passou por muitas coisas feias nessa vida...mas a pessoa responsável por essa fase, também vai fazer você conhecer o amor...e casar aos 30 anos.
- É mesmo? Então me caso daqui há dois anos? - Continuei debochando.
- Não, minha menina, está perto.  No final da estação você já contará 30 primaveras.
- Muito obrigada por revelar minha vida, Óh! senhora cigana!
- Debaixo desses desenhos se esconde uma mulher sensível e que acredita no amor...confie, minha menina.

Ela se virou e saiu. Eu debochei, fui mal educada e irônica, mas a todo o momento ela foi delicada e seus olhos me mostraram paciência e bondade. Bobagem! Ela devia fazer isso o tempo todo. Mas uma coisa é certa: a cigana de poderes aleatórios acertou a data do meu aniversário de 30 anos, não demonstrei nada, mas confesso que fiquei meio ressabiada com isso.
Paulina e Rubem ainda trombaram com a velha senhora na entrada e ela muito educada, abaixou a cabeça e pediu desculpas. Rubem levou a mão ao bolso detrás da calça para conferir se a carteira estava no lugar e Paulina levou a mão ao coração. Meus amigos:  É drama total! Não sabem que essa história de que ciganos roubam é uma lenda urbana mentirosa?

- Você viu aquela mulher?! - Ela perguntou ainda de olhos arregalados.
- Não só vi como ouvi! Lógico que ela entrou aqui para falar comigo, né, Lina? Quem mais tem cara de quem acredita em destino e afins?
- Tá te zoando, amor!
- Não estou não, Rubem! Ela estava aqui falando comigo.

Contei aos meus amigos tudo que a cigana tinha dito e gargalhamos um bocado! De onde ela tirou aquelas ideias? Talvez já me conhecesse da época negra da minha vida...me lembrei vagamente de olhos negros que me fitavam e saias farfalhando. Afastei a quase lembrança e continuei bebendo meu chopp e rindo com Paulina e Rubem.
Quando entramos no táxi, uma lembrança me pegou

- Rubem, lembra quando cheguei no estúdio?
- Na primeira vez? Claro! Uma menina bonita com a bunda mais bêbada do que um gambá
- Fiz um café tão forte que você cuspiu me xingando e depois vomitou tudo - Paulina falou rindo mas me olhando com aqueles olhinhos de mãezona.
- Era meu aniversário de 20 anos...
- E você tirou o cabaço da pele!! - Ele gargalhou e o motorista arregalou os olhos pelo retrovisor
- Minha primeira tattoo, meu primeiro emprego, minha terceira vida...
- Agora é a hora que ela diz que nos ama muito, chora igual bebê e depois vomita na gente.
- No meu carro não, senhores! - o motorista deu uma freada brusca e se virou meio indignado.
- Calma, motor! É só uma brincadeira! - Rubem apaziguou
- Meu Deus! Cadê seu bom senso, seu motorista? Nem se pode mais lembrar em paz!
- É...quase 10 anos e vocês não mudaram nada!
- Enquanto você, benzinho! Quanta diferença! - Paulina riu mais um pouco.

Estão curiosos sobre o meu passado? Vou deixá-los mais um pouco, porque antes preciso contar como minha outra vida começou...Dizem por aí que gatos tem sete vidas e eu já conto quatro bem distintas, será que já posso me considerar metade felina??

Uma cigana leu o meu destinoWhere stories live. Discover now