Derradeira consequência

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Sempre, ou quase sempre, quando uma professora saía da sala deixando em cada mesa uma folha limpa e branca, esvoaçando até ao centro de cada uma, a cada movimento impaciente da docente, todos os alunos entreolhavam-se decidindo o que fazer.

No caso, em concreto, tratava-se da professora de Química que tinha a fama de ser não famosa entre os alunos. Gostar dela era o sinónimo de gostar daquelas folhas de papel que se assemelhavam a gatafunhos de uma criança de cinco anos, a pequenos pontinhos tal era o tamanho miudinho da letra escolhida.

Ali apenas três alunos usavam óculos, mas isso não eliminava a possibilidade de um dos que não usava óculos, confundisse um "n" com um "r" ou um "o" com um "a" e por aí adiante. 

Com as mãos abertas sobre a mesa, inclinavam-se mais perto da folha no intuito de decifrar aquilo a que um deles apelidara de hieroglifos, daquelas letras usadas pelos egípcios.

É de considerar, de destacar o enorme esforço que Markov, o robô de Max teve ao tentar, sem sucesso, identificar cada letra do papel. Ou as tentativas de Max e Sabrina em tentar responder a perguntas que provavelmente não eram aquelas que eram pretendidas.

Desistindo daquela missão impossível, foi de concordância geral consultar a internet para pelo menos tentar entender o que era efetivamente perguntado. 

 - É impossível responder a isto - murmurou, um aluno, mordiscando a ponta do lápis.

Acontece que todos tinham de ter positiva naquilo. O teste anterior fora complicado mas legível e a professora estava na sala, portanto ninguém teve a coragem de copiar as respostas da internet. Mas naquele caso, as coisas eram diferentes e, depressa todos concordaram com a estratégia proposta por Alix, acabando o mais depressa possível, deixando os enunciados empilhados na secretária da professora. Marinette, como representante da turma, achou melhor deixar uma nota em cima destes antes de se retirarem num solavanco da sala, arrastando as cadeiras com algum ruído: viram-se obrigados a correr até a um lugar seguro.

Os garotos lembraram-se que tinham combinado com o professor de Educação Física de se encontrarem no ginásio para fazerem alguns testes físicos e tiveram de se separar da turma.

 Pararam, todas num átrio enorme: a cantina. Estando vazia por se encontrarem em horário letivo, acomodaram-se todos no centro do cómodo, sentados no chão.

Sabrina, como a exemplar que era, ainda tentou alertar para as consequências daquela fuga, mas foi impedida por Chloé que tomou a sua carteira batendo na cabeça da garota.

Uma delas sugeriu algo mais interessante do que o concurso não declarado de quem ficaria mais tempo calado.

 - Algo como... falar.

 - Mas falar de quê? - inquiriu com a arrogância habitual Chloé.

 - Sei lá... falar....

E falaram. Falaram até alguém farto daquelas fofocas banais e exageradas, sugerir, para alívio do tédio e de todos, jogarem ao Verdade ou Consequência.

Acordado entre todos, Alix tomou rédea daquilo. Lançava sempre que tinha a oportunidade consequências que envergonhavam as vítimas e o agredido não tinha opção de escapar ao inevitável. Depois, achando que ela não era a única que tinha o direito de aterrorizar os mortais dali, Chloé decidiu pressionar psicologicamente, quase fisicamente as suas vítimas, levando a que estas revelassem os seus segredos da maneira mais vergonhosa possível: deliberadamente. Juntando-se a estas duas, Alya também entrou na estratégia por elas adotada: fazia um pouco dos dois.

Ao lado da garota, Marinette começava a pressentir algo de terrível. Arrepiava-se cada vez que o tom esganiçado de Chloé se fazia ouvir, ao ver o rosto trocista de Alix que se parecia deleitar com o embaraço dos outros e do gesticular exagerado de Alya. Sabia bem das capacidades persuasivas da amiga, que conseguiu decifrar sinais quase impercetíveis do seu abismal crush por Adrien. E, Chloé como a boa inimiga que era, não perdeu a chance para a ridicularizar, achincalhar e insultar, ao passo que, felizmente, as amigas demonstraram uma certa dolorosa compaixão por ela.

Kiss and Dash (RESCREVENDO A SÉRIO!)Onde histórias criam vida. Descubra agora