Conto 6

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Almas Gêmeas

Todos os dias as duas amigas se encontravam no metrô. Margarida levava um sonho para Julia e um pão na chapa para ela mesma. Julia era responsável pelo chá da amiga e café para ela.

Estudavam em escolas diferentes, mas como o caminho de ambas era o mesmo, iam juntas todo dia para o colégio. Julia sempre se sentava à janela e Margarida na ponta. Aquele horário da manhã a condução estava sempre cheia e barulhenta, mas elas não se importavam e transformavam aquele agitação em algo que não as incomodava . Diversidade de assunto nunca foi um problema e a cada estação observavam os mesmos passageiros de todas as manhãs e alguns outros que nunca haviam visto entrando e saindo em um frenesi que elas amavam. As duas amigas viviam imaginando histórias para cada uma das almas apressadas que depois eram escritas por Julia e publicadas em seu blog.

Naquela manhã, em especial, tudo ocorreu de maneira bem diferente. Ao invés de pão e sonho, Margarida levou biscoitos caseiros. Julia, em uma espécie de sintonia com a amiga, levou sucos naturais. Naquela manhã, em especial, as meninas cederam seus acentos para um casal de idosos que nunca tinham visto antes . Naquela manhã, em especial, elas decidiram matar aula. Foram ao cinema, depois a uma livraria, passaram a tarde sentadas no Parque do Ibirapuera, cada uma com seu respectivo livro, Julia com "It - A Coisa" do Stephen King e Margarida com "O lado bom da vida" do Mathew Quick . Naquele dia, em especial, elas decidiram fazer tudo diferente. Não sabiam o por quê, sabiam apenas que aquele dia tinha que ser diferente .

Pobres meninas. Se elas soubessem o que a vida lhes reservava. Uma separação brusca, sem o menor aviso.

As garotas estavam voltando para casa no mesmo metrô que pegaram naquela manhã, quando dois homens encapuzados entraram anunciando um assalto. Foram os segundos mais lentos de toda a vida delas, e os mais caros. Um dos homens mandou que lhe entregassem todos seus pertences de valor. Julia estava com muito medo e acabou deixando tudo cair no chão. O bandido, que fedia a bebida, se irritou com a falta de jeito da jovem e sem pensar duas vezes puxou o gatilho.

Em uma fração de segundos toda a vida de Julia rodou como um filme trágico em sua mente. Porém, ela percebeu que não estava ferida, mas que sua amiga se sacrificara por ela.

- Não, Mag, o que foi que você fez? - disse em meio a muitas lagrimas

- Isso não foi nada perto do que você já fez por mim - disse Mag com um sorriso - Você é mais que uma amiga, você é a minha irmã de alma. Obrigada, Ju, por tornar tudo tão divertido com seu humor irônico. Obrigada por tornar meus dias mais leves. Desde que minha mãe morrera nada tinha cor nem vida. Até que você chegou e coloriu tudo outro vez.

A esta altura Julia já se debulhava em lágrimas. Margarida começou a fechar os olhos, mas antes que partisse sussurrou com suas ultimas forças:  

- Faça por outras pessoas, o que você fez por mim.

Naquela noite não existia mais as garotas do vagão, apenas as lembranças do que um dia foram. 

Publicado por VitriaEmanuelleLomeu

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